A Secretaria da Receita Federal informou nesta quinta-feira, 26, que foi deflagrada a 10ª fase da Operação Zelotes da Polícia Federal, que apura desvios perante o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (Carf). A ação mira irregularidades em julgamento de processo fiscal de interesse de siderúrgica Paranapanema, com sede na cidade de Santo André (SP). Desta vez, segundo nota da Receita, os prejuízos ao poder público superam R$ 400 milhões. São alvos de buscas o empresário e economista Roberto Giannetti da Fonseca e o ex-secretário de comércio exterior, Daniel Godinho. Giannetti, ligado ao PSDB, é ex-diretor da área internacional da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e é um dos colaboradores da campanha política do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência. Ele também era coordenador do programa de governo do ex-prefeito paulistano João Doria (PSDB) ao governo de São Paulo, mas deixou a função nesta quinta-feira. Já Godinho liderou a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) durante o governo de Dilma Rousseff.
Estão sendo cumpridos nove mandados de busca e apreensão em quatro Estados e no Distrito Federal, alcançando endereços de sete pessoas físicas e duas empresas. Esta etapa da operação foi solicitada pelo Ministério Público Federal ao Poder Judiciário e está sendo realizada em conjunto pelas equipes da Polícia Federal, da Corregedoria-Geral do Ministério da Fazenda e da Coordenação-Geral de Pesquisa e Investigação da Receita Federal do Brasil.
Segundo o Ministério Público Federal, a siderúrgica Paranapanema teria repassado R$ 8 milhões para a Kaduna Consultoria, empresa do economista Roberto Gianetti da Fonseca. Desse montante, cerca R$ 2,3 milhões teriam ficado com Gianetti da Fonseca e o restante teria sido encaminhado para dois escritórios de advocacia. Esses escritórios, ainda de acordo com o Ministério Público Federal, foram responsáveis por remeter parte dos valores para conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). "O caso sob investigação, que resultou na exoneração total de crédito tributário apurado em processo administrativo fiscal, foi operacionalizado mediante uma estrutura ilegal integrada por agentes públicos e privados que se organizaram, basicamente, em três núcleos de atuação: a) o núcleo econômico, composto pelos representantes da siderúrgica com processo no Carf, que teria financiado os custos do esquema; b) o núcleo operacional, integrado pelos responsáveis pela interlocução com os representantes da empresa, o aliciamento dos conselheiros e a distribuição do proveito financeiro do empreendimento espúrio; e, finalmente, c) o núcleo administrativo, centrado nos conselheiros que ocupavam a função de julgadores, vinculados às diretrizes de favorecimento às empresas nos julgamentos administrativos", explica a Receita em nota.
"Com base nos indícios da existência de esquema ilícito concebido para interferir em julgamento proferido pelo Carf, com prejuízo à Administração Pública estimado em valores superiores a 400 milhões de reais, conforme destacado em relatório elaborado pelos investigadores, o Ministério Público Federal solicitou, além da realização de busca e apreensão, o afastamento do sigilo dos registros dos dados telefônicos, do sigilo telemático e dos sigilos bancário e fiscal dos envolvidos. A Justiça Federal autorizou todas as diligências propostas, visando a instruir a investigação em torno do favorecimento ilícito da empresa fiscalizada mediante o direcionamento de decisões proferidas pelo tribunal administrativo fazendário", acrescenta.
A Operação Zelotes, que foi deflagrada em 26 de março de 2015, tem revelado as mais variadas práticas de ilícitos envolvendo julgamentos de processos no Carf. Até o momento, as apurações totalizam vinte ações penais, dezoito processos administrativos disciplinares, quatro processos de responsabilização de pessoas jurídicas e sete arguições de nulidade de decisão já admitidas e em tramitação junto ao Conselho.
O economista Roberto Giannetti da Fonseca é um dos colaboradores da campanha política do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência. Ele é o idealizador de uma proposta chamada de “Manifesto Compromisso da Força Centro Democrático” elaborada com o objetivo de mostrar que o tucano propõe um novo modelo de governança. O documento, escrito por Giannetti, critica a condução da política econômica e a governança dos últimos governos. “Porém, a má gestão da politica econômica, e uma sucessão de práticas irresponsáveis e desonestas pelos governantes, levaram novamente grande parte dos brasileiros nos últimos anos a perder a esperança no futuro de nossa Nação”. Segundo interlocutores do tucano, o documento foi elaborado e discutido por algumas pessoas do PSDB, mas não foi debatido oficialmente. O manifesto que o PSDB apoiou foi o assinado e divulgado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
A Operação Zelotes, da Polícia Federal, foi deflagrada em março de 2015 para apurar suspeitas da existência de um esquema de compra de decisões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), última instância administrativa para o julgamento de autuações da Receita Federal a empresas e pessoas físicas. O objetivo seria influenciar o órgão, formado por representantes do Ministério da Fazenda e dos contribuintes, a reverter multas fiscais. Até março de 2015, o Carf era ocupado por 216 conselheiros, metade indicada pela Receita e outra parte por confederações empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), e uma parte menor pelas centrais sindicais. Até então, os conselheiros indicados pelo setor privado podiam desempenhar suas funções no Carf e, ao mesmo tempo, advogar em casos tributários. Em abril de 2015, após a operação, o governo fixou novas regras para funcionamento do órgão, com remuneração para seus integrantes e restrições ao exercício das atividades profissionais.
De acordo com os investigadores, o esquema de corrupção no Carf era "legalizado" por contratos de serviços prestados por escritórios de advocacia e consultorias que faziam lobby para influenciar nas decisões do órgão. Após abordagem das empresas alvos de multas da Receita, esses consultores elaboravam contratos para forjar a legalidade do serviço prestado. A partir daí, segundo a investigação, as empresas pagavam propina por meio de depósitos em diversas contas bancárias para evitar o rastreamento. Os investigadores dizem que vários conselheiros do Carf se recusaram a participar do esquema e repudiaram a abordagem, mas outros aceitaram negociar decisões. Tramitam no órgão mais de 115 mil processos tributários que englobam cerca de R$ 500 bilhões em discussão.
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