Desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4) aprovaram súmulas que autorizam abrir investigação com base em denúncia anônima, “quando amparada por outro indício”, e a renovação sucessiva de interceptação telefônica, “caso persista a necessidade de apuração”. Na prática, as decisões dificultam duas das principais contestações à arregimentação de provas em investigações, entre elas a Operação Lava Jato. As súmulas, aprovadas por unanimidade pela 4ª Seção do tribunal, representam a interpretação majoritária do colegiado e devem ser seguidas pelos demais magistrados vinculados àquela corte. A jurisdição do TRF4 abrange o Paraná, sede da Lava Jato na primeira instância. Advogados de investigados na operação criticaram o entendimento dos desembargadores. Segundo o criminalista Antônio Claudio Mariz de Oliveira, as decisões representam “desprezo às garantias individuais” de investigados. “A renovação sucessiva de interceptações deixa o cidadão que tem a sua comunicação interceptada à mercê de uma decisão amparada apenas em informações subjetivas”, disse Mariz, defensor de um ex-executivo da Camargo Corrêa investigado na Lava Jato. O advogado fez referência à súmula 129, que afirma ser “lícita a sucessiva renovação da interceptação telefônica, enquanto persistir sua necessidade para a investigação”. A questão é controversa e suscita discussões no meio jurídico. A lei determina que a escuta “não poderá exceder o prazo de 15 dias, renovável por igual tempo, uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova”. Uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e decisões de tribunais Brasil afora, no entanto, admitem o emprego desse instrumento de investigação por mais tempo, desde que essencial para desvendar os crimes em apuração. A escuta telefônica considerada a origem da Operação Lava Jato é um exemplo. O alvo da interceptação, que durou mais de 30 dias, era o doleiro Carlos Habib Chater, dono do Posto da Torre, em Brasília. Foi a partir dele que a força-tarefa chegou ao doleiro Alberto Youssef, um dos primeiros delatores. O entendimento jurídico sobre escutas telefônicas também está em debate no Supremo Tribunal Federal, que analisa o cancelamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, em 2008, da Operação Sundown. O caso, que envolvia crimes financeiros, teve dois anos de interceptações telefônicas. O juiz que conduziu o processo foi Sérgio Moro, hoje responsável pela Lava Jato em Curitiba. O STF vai debater se o limite para escutas é de 30 dias ou se cabe, se necessário, ampliá-lo. Em 2008, quando o STJ anulou a Operação Sundown, os procuradores Deltan Dallagnol e Orlando Martello, que eram responsáveis pela acusação e hoje atuam na Lava Jato, divulgaram nota em que afirmaram que “a validade da renovação consecutiva do monitoramento sempre foi admitida e é absolutamente necessária para apurar qualquer crime com razoável complexidade probatória”. Em outra súmula, o tribunal entendeu ser “válida a instauração de procedimento investigatório com base em denúncia anônima, quando amparada por outro indício”. Trata-se de assunto igualmente polêmico. Em 2011, por exemplo, uma das principais operações de corrupção no Brasil, que envolvia políticos e executivos de empreiteira, foi anulada pelo STJ sob o argumento de que juízes não podem permitir a quebra de sigilos de qualquer espécie com base exclusiva em “denúncias anônimas”. Na época, a Polícia Federal foi autorizada a acessar bancos de dados de empresas telefônicas, o que forneceu provas anexadas na investigação. O desembargador Fausto Martin de Sanctis, do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF3), que na época autorizou a Castelo de Areia na primeira instância, defendeu a súmula do TRF4 e disse que “a denúncia anônima é estimulada pelas Convenções da ONU de combate ao crime organizado e à corrupção”. “Ela é útil desde que complementada com informações relevantes que confirmam seus elementos”, disse ele. “A súmula nada mais expressou do que a importância deste meio limiar de prova como, aliás, já referendou o próprio Supremo em vários casos".
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