Por Reinaldo Azevedo - Estou de olho em Luiz Edson Fachin. Estava antes mesmo de ele ser candidato ao Supremo. Sua proximidade com o MST o tornava, a meus olhos, suspeito. Coube a ele a relatoria das ações movidas pelo PCdoB contra o rito do impeachment: uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), à qual se agregou incidentalmente pedido de liminar contra a votação secreta para a escolha da comissão do impeachment — liminar que ele concedeu. No dia 16, as questões vão a plenário, e os 11 ministros poderão se manifestar. Na ADPF, o PCdoB aponta o que considera incompatibilidades entre o rito do impeachment estabelecido na Lei 1.079 e a Constituição de 1988. Há, sim, uma que é flagrante: o texto menor prevê que o presidente se afaste tão logo a Câmara admita, por maioria de dois terços, a denúncia — foi o que aconteceu com Fernando Collor, já na vigência desta Constituição, que prevê o afastamento só depois que o Senado dá início ao processo. A diferença é pequena, de dias. As demais reclamações do PCdoB não passam de conversa procrastinatória. Cito um caso: o partido alega que o direito à ampla defesa obrigaria o presidente da Câmara a ouvir o da República antes de dar início à tramitação. É papo pra boi dormir. Desde a aceitação, o Regimento Interno da Casa estabelece até 10 sessões para que a defesa se manifeste. A Lei 1.079 garante amplo direito de defesa ao acusado no Senado, que é quem processa e julga o supremo mandatário da nação, sob o comando do presidente do STF. Pois é… Fachin suspendeu o rito do impeachment porque entendeu que o voto secreto para eleger a comissão pode não estar de acordo, vamos dizer, com o espírito da Constituição — ainda que nenhum dispositivo preveja o voto aberto. Mas, já escrevi aqui, rende um bom debate. Será que o princípio da publicidade, conforme estabelece o Artigo 37, impõe o voto aberto quando a própria Carta é omissa a respeito, uma vez que ela é explícita quando quer voto fechado? O conjunto dos ministros vai dizer. O que me incomoda na fala de Fachin é outra coisa. Consta que ele vai propor um rito novo para o impeachment, do começo ao fim — isto é, desde o início da tramitação da denúncia, na Câmara, ao julgamento propriamente, no Senado. É mesmo, é? Tenho boa memória. Fachin fez a defesa solene da independência dos Três Poderes na sabatina de que participou na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Um de seus compromissos foi respeitar a autonomia do Poder Legislativo, deixando claro que não cabe ao Supremo fazer leis. Respondendo a uma questão do senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), disse que as respostas que dava na sabatina tinham um valor vinculante — vale dizer: ele poderia, depois, ser cobrado por elas caso não as cumprisse. Transcrevo literalmente o que disse: “O que estou a dizer aqui tem um sentido vinculante do que penso e do que será a minha conduta. Sei que isso constitui objeto não só do registro da minha e da vossa consciência, mas isso constitui também objeto dos registros que esta Comissão terá caso eu venha, eventualmente, a ser aprovado para colocar em prática os compromissos que estou assumindo, que não são compromissos meramente retóricos”. Não sei que “rito” doutor Fachin pretende sugerir — e este só vai prosperar com a concordância da maioria dos ministros, mas me vejo obrigado a lembrar que não cabe ao Supremo legislar. Mais: parece-me que não honra a boa tradição jurídica — não é mesmo, ministro? — criar regras novas depois de começado o jogo, mormente quando outro presidente da República já foi deposto com esse arcabouço legal que aí está. Tecnicamente, Collor primeiro renunciou e só depois foi impichado pelo Senado, quando já não tinha mandato… Julgar uma ADPF, entre outras ações, é tarefa do Supremo. Fazer leis, bem…, aí não é. Uma coisa é definir que determinada lei, há muito em vigência, entrou em desacordo com uma Constituição que lhe é posterior; outra, muito distinta, é legislar abertamente sob o pretexto da harmonização dos textos constitucional e legal. Pode até ser que precisemos de uma nova lei para definir os crimes de responsabilidade. Caberá ao Congresso redigi-la. A Fachin e aos demais ministros cumpre apenas zelar para a que a aplicação das leis que temos se faça de acordo com os princípios da Constituição que também temos. Se Fachin quer fazer leis, ele tem de estar abrigado sob uma daquelas duas conchas da Praça dos Três Poderes. Espero que o ministro não proponha um rito que, como vou dizer?, leve à conclusão de que a deposição de Collor, em 1992, foi inconstitucional. Afinal, as leis eram as mesmas. A Constituição é a mesma. Ou é privilégio de um presidente de esquerda ser maior do que as leis e a Constituição?
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