O advogado Luiz Edson Fachin tomou posse nesta terça-feira no Supremo Tribunal Federal. O novo ministro ocupará a cadeira que pertenceu a Joaquim Barbosa e estava vazia há mais de dez meses. Entre os presentes na cerimônia estavam os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Ambos são investigados no Supremo por suposto envolvimento nas irregularidades da Petrobras desvendadas pela Operação Lava-Jato. Fachin participará do julgamento dos dois, no plenário do STF, ainda sem data prevista para acontecer. Outros investigados na Lava-Jato também foram prestigiar Fachin: os senadores Fernando Bezerra (PSB-PE), Valdir Raupp (PMDB-RO) e Gleisi Hoffmann (PT-PR). O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, também foi à cerimônia. Ele é alvo de um inquérito no Superior Tribunal de Justiça no âmbito da Lava-Jato. Entre os cumprimentos dos convidados, Fachin fez pausa para falar do novo desafio. Para ele, a missão mais importante do STF é julgar causas constitucionais de forma previsível – ou seja, respeitando decisões anteriores sobre o mesmo assunto: "Eu diria que as questões mais complexas hoje (no STF) são as que ressaltam a missão do supremo como corte constitucional. É fundamental, no meu modo de ver, prosseguir nessa caminhada que o Supremo já tem se postado de se afirmar cada vez mais como corte constitucional, valorizando os juízos de primeiro grau, valorizando os tribunais estaduais e dando à jurisprudência brasileira segurança jurídica e estabilidade que ela precisa. É nessa direção que o julgamento, ainda que complexo, tem que ser previsível, dando confiança aos jurisdicionados". O novato herda o gabinete com menos processos na corte: 1.434. Ele pertenceu a Ricardo Lewandowski – que, ao assumir a presidência do tribunal, precisou abdicar dos processos de sua relatoria. No meio do acervo está um inquérito sigiloso que trata do Mensalão do PT. Depois de julgado o processo principal do escândalo de desvios de dinheiro no governo Lula, outra frente de investigação permaneceu no tribunal. Também estão no gabinete de Fachin pedido de habeas corpus do ex-médico Roger Abdelmassih, um inquérito contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e dois inquéritos contra o senador Alfredo Nascimento, ex-ministro dos Transportes do governo Dilma. "Eu estou recebendo um acervo de cerca de 1.500 processos. Comecei a tomar contato com alguns desses processos hoje. Com o passar dos dias, nós teremos a oportunidade de falar um a um", disse. A cerimônia foi curta, como manda a tradição da corte. Pouco mais de mil pessoas compareceram. O presidente do tribunal, ministro Ricardo Lewandowski, quebrou o protocolo e fez pequeno discurso de boas-vindas ao novo colega. Morando em Curitiba, Fachin acordava todos os dias cedo, no frio típico da capital paranaense, para fazer ginástica. Gostava da sensação provocada pelo choque térmico de quem sai da cama quente e respira o ar gélido. De mudança para Brasília, ele já se prepara para viver no clima quente e seco da capital federal. A mobília e os objetos pessoais ainda não chegaram ao apartamento funcional que ocupará na Asa Sul, onde mora boa parte de seus novos colegas de trabalho. Mas Fachin já demonstra animação com o novo ofício. Embora empolgado, Fachin está confuso com tanta mudança. Na segunda-feira, no avião que o transportava de Curitiba para Brasília, lembrava que já tinha entregue à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) o registro profissional na semana anterior. Não era mais advogado, portanto. E ainda não era oficialmente ministro. O endereço também estava indefinido. À funcionária de uma agência bancária localizada no STF que perguntou seu endereço, ficou na dúvida. Acabou citando o de Curitiba. A confusão do novato se limita a esses aspectos. A interlocutores, tem afirmado que está preparado para encarar qualquer assunto no STF. Costuma dizer que o juiz não pode ter medo de decidir. Ele pondera que é necessário pensar nas consequências das decisões e, também, estar atento quanto à possibIlidade de se colocar as sentenças em prática. A coragem para decidir será bem-vinda: no STF, o mais novo integrante é, por regra, sempre o primeiro a votar nos julgamentos de plenário, depois do relator. Fachin nasceu em Rondinha, no Rio Grande do Sul, há 57 anos. Era sócio de um escritório em Curitiba especializado em arbitragem e mediação no direito empresarial. Foi diretor do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) – entidade que tem se destacado na defesa de causas polêmicas, como o reconhecimento da união estável homoafetiva e a alteração do nome de transexuais. O novo ministro é defensor dos direitos das minorias. Para ele, o Judiciário deve atuar para defender as garantias desses grupos, mesmo quando o Legislativo ainda não tiver se pronunciado. Além de concordar com a decisão tomada pelo STF em 2011 de legitimar as uniões entre pessoas do mesmo sexo, ele também defende, por exemplo, que amantes com relacionamento duradouro tenham direito à pensão no caso de morte do cônjuge. “A união estável entre pessoas do mesmo sexo, por exemplo, demonstra a necessária mudança da perspectiva hermenêutica, em prol do reconhecimento de um direito. Muito embora alguns setores possam considerar tal decisão demasiado ativista por parte do STF, fato é que não houve atentado à segurança jurídica nem mesmo quebra de previsibilidade, haja vista que a garantia de direitos fundamentais a todos, incluindo as minorias e grupos vulneráveis, é a tendência dos tribunais e representa mandamento constitucional. O reconhecimento da união estável homoafetiva apenas seguiu tal lógica”, escreveu em um artigo publicado pelo site “Consultor Jurídico”, em 5 de abril. Fachin pode ficar impedido de participar de julgamentos importantes no STF. Ele ainda não decidiu, por exemplo, se vai votar nos processos em que poupadores pedem para receber dividendos referentes à correção monetária na instituição de planos econômicos das décadas de 1980 e 1990. Isso porque, como advogado, ele atuou em um recurso ao Superior Tribunal de Justiça sobre o prazo de prescrição para esse tipo de processo. Ele também poderá ficar impedido de julgar os processos mais interessantes sobre direito de família que tramitam na corte. Isso porque o novato foi diretor do IBDFAM – entidade que tem se destacado na defesa de processos desse tipo e que patrocina três grandes causas no STF. Pelo Código de Processo Civil, um juiz não pode julgar um processo se integrar “órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica parte na causa”. Um dos processos discute o direito de transexuais que não tenham sido submetidos a cirurgia de mudança de sexo poderem usar oficialmente o nome civil pelo qual são reconhecidos. O outro debate a divisão da pensão por morte deixada por um homem entre a esposa e a amante. O terceiro caso é uma ação contra regra da Lei do Planejamento Familiar segundo a qual cirurgias de esterilização só podem ser realizadas com a autorização dos dois cônjuges. O IBDFAM não é autor das ações, mas atua como amicus curiae – uma espécie de assistente da causa, com direito a fazer sustentação oral no plenário do STF no dia do julgamento.
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