domingo, 2 de dezembro de 2007

Revista Veja denuncia que polícia do Senado espionou senador do PSDB, na presidência de Renan Calheiros

Era o que faltava. Agora a edição da revista Veja que está nas bancas traz matéria mostrando que a polícia do Senado Federal, em plena presidência do senador Renan Calheiros, promoveu espionagem de um senador opositor. Leia a matéria: “O senador Marconi Perillo, do PSDB de Goiás, foi alertado sobre a trama há um mês. Sua vida estava sendo devassada por um grupo de detetives particulares. Ex-governador do estado, o senador tomou duas providências. Primeiro, ele pediu à polícia de Goiás que investigasse. Depois comunicou o caso ao corregedor do Senado, Romeu Tuma. Discreto, Perillo atribuiu a história a razões provincianas. Estava enganado. Os policiais goianos descobriram um autor bem mais notório e razões bem diferentes para o triste episódio. Dois escritórios de detetives – um em Brasília e outro em Goiânia – haviam sido contratados para bisbilhotar a vida do senador. Estavam orientados a identificar desde supostos negócios fraudulentos realizados entre o parlamentar e empresários até a existência de contas bancárias dele no exterior. Seguindo o rastro dos arapongas, os investigadores goianos descobriram algo ainda mais escandaloso: a espionagem foi contratada pelo próprio Senado Federal. Segundo relato dos agentes, a Polícia do Senado acionou um conhecido escritório de espionagem política de Brasília – a Central Única Federal dos Detetives do Brasil – para levantar as informações financeiras de Marconi Perillo. Os telefones do senador foram grampeados e violaram seu sigilo bancário e fiscal. A invasão de privacidade está sendo investigada, em sigilo, pela Polícia Federal. ‘É o fim do mundo alguém usar a estrutura do Senado para investigar ilegalmente os senadores’, disse o senador Perillo. É o segundo caso envolvendo o senador tucano com espionagem nos últimos dois meses. No primeiro, também revelado por VEJA há oito semanas, o então assessor da presidência do Senado, Francisco Escórcio, foi pilhado planejando instalar câmeras de vídeo no hangar do Aeroporto de Goiânia. Ele pretendia filmar os senadores Demóstenes Torres e Marconi Perillo embarcando em jatos supostamente cedidos por empresários para depois usar as imagens como arma de chantagem. Os senadores são defensores da cassação do mandato do presidente licenciado do Congresso, Renan Calheiros. Escórcio era auxiliar direto de Renan. Foi demitido para salvar as aparências. O caso de agora começou exatamente no mesmo período, e os policiais suspeitam que ambos façam parte da mesma operação. Em outubro passado, Marconi Perillo recebeu um telefonema do governador de Goiás, Alcides Rodrigues. O governador disse que tinha informações concretas de que o senador era alvo de uma investigação ilegal. Um policial aposentado contou ter sido contatado por um escritório de detetives profissionais. Eles lhe ofereceram dinheiro para ajudar na apuração e na montagem de um dossiê contra Perillo. O senador Perillo procurou o secretário de Segurança do Estado, Ernesto Roller, e o diretor da Polícia Civil, delegado Marcos Martins. Pediu a ambos que investigassem o caso com discrição. A polícia desvendou parte da trama. Seguindo a cadeia de contatos dos arapongas, descobriu que o policial aposentado foi procurado pela detetive Luzia Aparecida Tanganelli. Sem saber que estava sendo investigada, ela, por sua vez, revelou que estava prestando serviços a uma agência de Brasília. Os policiais descobriram em Brasília que o contratante final era a Polícia do Senado. O resultado da investigação, realizada pelo serviço reservado da polícia de Goiás, foi repassado ao senador Marconi Perillo na semana passada. VEJA teve acesso às principais conclusões da polícia goiana: • Foi um agente da Polícia do Senado, não identificado, quem procurou o escritório de detetives de Brasília. Os arapongas usariam os serviços de ex-policiais federais. • Os detetives brasilienses contrataram o escritório Agatha & Holmes, em Goiânia, que tem como representante Luzia Tanganelli, conhecida pelo apelido de "Cleópatra" e por usar informações colhidas ilegalmente para chantagear. • A missão dos arapongas goianos era descobrir se Marconi Perillo tinha participação societária oculta nas empresas Perdigão e Schincariol, ambas instaladas em Goiás durante seu governo. • Quebraram o sigilo fiscal e bancário do senador para tentar investigar a existência de uma suposta conta milionária em um banco dos Estados Unidos. • O plano também previa a interceptação dos telefones do senador. Os policiais listaram os nomes, os endereços e os telefones dos principais personagens envolvidos na trama. Resta um mistério não esclarecido pelos investigadores goianos. Afinal, qual seria o interesse da Polícia do Senado na vida pessoal de Marconi Perillo? O senador tem uma suspeita: ‘Eu tive uma atuação destacada no caso Renan Calheiros, no Conselho de Ética, na Comissão de Constituição e Justiça e no plenário. Não tenho provas concretas, mas não descarto que essa coisa abominável possa ter sido causada pela minha atuação em defesa da cassação de Renan Calheiros’. O senador Marconi Perillo, de fato, teve uma participação capital no Conselho de Ética. Foi sua a manobra que implodiu um plano dos aliados de Renan Calheiros para arquivar no nascedouro o processo que investigou as relações do senador com um lobista de empreiteira. Também foi Perillo o autor do requerimento que estabeleceu o voto aberto no Conselho de Ética, decisão que irritou Renan Calheiros e seus aliados. Na quinta-feira passada, VEJA esteve nos dois escritórios apontados pela polícia goiana como responsáveis pela espionagem. Em Brasília, o detetive Edilmar Lima, o dono da Central Única dos Detetives, teve uma reação curiosa ao ser perguntado se havia sido contratado pelo Senado para bisbilhotar a vida de Marconi Perillo: ‘Como essa história vazou? Esse caso é sigiloso, é perigoso’. Isso é uma confirmação? ‘Se fiz ou não esse serviço, não posso falar. Todo contrato que eu assino tem uma cláusula de sigilo muito rigorosa. Se assumir que isso é verdade ou mentira, vou estar queimando meu nome e posso ser processado pelo cliente’, respondeu o araponga. Em mais de uma hora de entrevista em seu escritório, o detetive explicou como trabalha, relatou casos de seus treze anos de carreira, mas, indagado várias vezes, em nenhum momento negou o envolvimento com a espionagem contra o senador tucano. Muito pelo contrário. ‘Se trabalhei nesse caso, não fiz nada ilegal. É lícito investigar, a lei está ao meu lado, posso investigar até o presidente da República. O que é crime é o uso indevido do resultado da investigação’, explicou. Edilmar afirma também que conhece muita gente no Congresso e que executou, e ainda executa, trabalhos para deputados e senadores. Foi assim no caso Perillo? ‘Onde há fumaça há fogo. Você é esperto, entendeu muito bem o que eu falei’, disse ele. Edilmar disse que cobra entre 100.000 e 120.000 reais para fazer levantamentos sobre políticos importantes. O detetive não revela se conhece ou foi procurado por alguém ligado à Polícia do Senado. Ele, porém, confirma que conhece Luzia Tanganelli. Tem, inclusive, o telefone da detetive na agenda de seu celular. ‘Ela é uma dos mais de 300 colaboradores que temos em todo o Brasil’, diz. Luzia vive num prédio de classe média em Goiânia, onde também funciona seu escritório. Ela negou qualquer participação no episódio e, o mais curioso, disse que nem sequer conhece o detetive Edilmar Lima. ‘Não conheço e nunca ouvi falar dessa pessoa’, garante. Num primeiro momento, ela diz que sobrevive da pensão alimentícia repassada pelo ex-marido. Depois, admite que faz alguns trabalhos esporádicos para localizar pessoas e endereços na condição de representante de uma firma de São José do Rio Preto, no interior paulista. VEJA apurou que foi o ex-marido de Luzia, Abdul Sebba, um ex-delegado, ex-deputado estadual e aliado político de Perillo, quem fez chegar ao governador de Goiás as primeiras informações sobre a espionagem. Procurado, Sebba disse que não tinha nada a declarar. O diretor da Polícia do Senado, Pedro Ricardo Araújo, negou qualquer envolvimento do órgão. Segundo ele, a polícia legislativa nunca contratou empresas para realizar qualquer tipo de investigação. Já o corregedor do Senado, Romeu Tuma, confirmou que pediu à Polícia Federal para abrir inquérito, logo que tomou conhecimento do caso. O corregedor só soube do envolvimento da polícia legislativa na semana passada e disse que vai convidar o senador Marconi Perillo a prestar depoimento já nesta terça-feira – dia em que o plenário do Senado vai julgar Renan Calheiros por quebra do decoro parlamentar. O senador é acusado de usar laranjas e dinheiro ilícito para comprar duas emissoras de rádio e um jornal em Alagoas, conforme VEJA revelou há quatro meses. Entalado em uma fossa de irregularidades, ainda assim ele está confiante na absolvição. Conta hoje com a simpatia e a cumplicidade de boa parte dos colegas – apesar de mais um escândalo a rondar sua biografia.

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