Juíza federal Janaína Cassol Machado e a delegada federal Erika Marena |
A juíza federal Janaína Cassol Machado, da 1ª Vara Criminal Federal de Santa Catarina, será a responsável por analisar a denúncia feita pelo Ministério Público Federal contra o reitor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Ubaldo Cesar Balthazar, e o chefe de gabinete da reitoria, Aureo Mafra de Moraes, acusados de "ofender a honra funcional" da delegada Erika Mialik Marena. Essa juíza faz parte da mesma vara onde atua a sua colega juíza federal Simone Barbisan Fortes, a qual foi a responsável pelo processo da Operação Rodin, em Santa Maria. Simone Barbisan Fortes foi destacada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, para atuar exclusivamente no processo da Operação Rodin, mas ela pediu para sair dessa responsabilidade, antes de dar sentença no processo, pedindo transferência para Florianópolis. Na mesma vara também tramita outro processo rumoroso, envolvendo 27 professores médicos do Hospital Universitário de Florianópolis, pertencente à Universidade Federal de Santa Maria, todos acusados de estelionato. Esse processo, misteriosamente, trata de esconder os nomes dos réus com todo cuidado. Ministério Público Federal e Justiça Federal em Florianópolis não revelam sequer o número do processo.
A juíza federal Janaína Cassol Machado foi escolhida para o caso em sorteio realizado entre os quatro juízes com competência criminal na Justiça Federal catarinense. Janaína Cassol é também a responsável pelo processo da Operação Ouvidos Moucos, uma investigação feita pela Polícia Federal que prometia desvendar um esquema milionário de desvio de verbas da educação na Universidade Federal de Santa Maria. Janaína Cassol determinou, em setembro do ano passado, a prisão do ex-reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo e de seis professores da UFSC. Atendeu, na ocasião, a um pedido da delegada federal Erika Marena. Cancellier, que alegava inocência, jogou-se do sétimo andar da área interna do Shopping Beira Mar, em Florianópolis, 18 dias após sua prisão, que durou 24 horas. No bolso da calça havia um bilhete onde ele culpava a operação pelo suicídio.
Ubaldo Balthazar e Aureo de Moraes foram incriminados porque policiais federais viram indícios de calúnia e difamação em uma reportagem da TV UFSC, produzida por alunos, no evento de aniversário de 57 anos da universidade, em dezembro. Em entrevista gravada pelos alunos, os dois lamentaram a morte de Cancellier, mas não fizeram menção à delegada ou à investigação. Ainda assim, os policiais consideraram que eles atentaram contra a honra da delegada federal Erika Marena porque, no vídeo, é possível ver atrás dos entrevistados uma faixa com protesto contra abuso de poder das autoridades da Operação Ouvidos Moucos. O cartaz estampava as fotos de Erika Marena, do procurador André Bertuol e da juíza federal Janaína Cassol Machado. Questionada sobre o fato de ela ser responsável por analisar uma denúncia sobre uma suposta ofensa que foi dirigida também contra a própria magistrada, Janaína Cassol Machado respondeu, via assessoria de imprensa da Justiça Federal catarinense, que só vai se manifestar nos autos. Ela está de férias e só volta ao trabalho em meados de setembro.
Simone Barbisan Fortes |
No dia 18 de dezembro, no aniversário da UFSC, Cancellier foi homenageado com a inauguração de um retrato na sala dos reitores. O vídeo com a homenagem e as entrevistas foi publicado no site da universidade. Aureo, que foi chefe de gabinete de Cancellier, aparece na gravação em dois momentos. O primeiro depoimento, de seis segundos de duração, resume-se a uma frase incompleta por causa da edição. "A reação da sociedade a tudo aquilo que nos abalou neste ano", diz ele, em uma referência à morte do reitor. O cartaz esticado por manifestantes fazia a seguinte crítica: "Agentes públicos que praticaram abuso de poder contra a UFSC e que levou ao suicídio do reitor". Também no vídeo aparecem uma faixa ("Não ao abuso de poder") e pequenos cartazes onde se lê "Universidade rima com verdade e liberdade. Quem matou o reitor?".
Ao falar de Cancellier, Aureo diz que o quadro em sua homenagem "é um tributo a uma pessoa que nos deixou de forma tão trágica, tão abrupta, e que tinha um compromisso gigantesco com esta instituição, colocando no lugar de honra que todos os reitores desta instituição têm guardado, que é a galeria dos reitores". O reitor, Ubaldo Balthazar, fala sobre o significado do ato em memória de Cancellier. "Na verdade o descerramento da placa é um presente para a universidade de um reitor que marcou profundamente a história da universidade. A UFSC é uma antes de Cancellier e outra depois de Cancellier", diz Balthazar. "Eu não esperava jamais ter sido o responsável por inaugurar a foto do professor Cancellier em virtude de tudo que aconteceu, a forma como isso se deu. Então eu penso que é um presente que nós estamos dando, não é uma coincidência, a placa foi descerrada no dia do aniversário como um presente para a universidade para que jamais esqueçamos o que aconteceu em 2017".
O responsável pela denúncia contra os dois acadêmicos é o procurador federal Marco Aurélio Dutra Aydos, que considerou que a faixa exibida no evento "inequivocamente ofende a honra funcional subjetiva da representante (Erika Marena), dando causa injustamente a diminuição do sentimento pessoal de autoestima, eis que publicamente caracterizada pela qualidade negativa de 'agente público que pratica abuso de poder' e necessita de 'punição' para 'reparação dos seus malfeitos'". O chefe de gabinete foi denunciado porque, segundo a acusação, "consentiu em deixar-se fotografar/filmar em frente à faixa injuriosa, como cenário de sua manifestação naquele evento, conferindo, consciente e dolosamente, caráter oficial à injúria ali perpetrada". Já o reitor porque "competia ao acusado, na condição de autoridade de primeira hierarquia da administração universitária presente na solenidade, exercitar regularmente o poder de polícia administrativo que coibisse o malferimento à honra funcional dos servidores públicos retratados na faixa". Reitor e chefe de gabinete foram denunciados por injúria contra funcionário público, com pena que varia de 40 dias a oito meses de detenção. O procurador também requereu o pagamento de uma multa de R$ 15 mil como reparação por danos civis.
Em abril, a Operação Ouvidos Moucos indiciou 23 pessoas. O delegado Nelson Napp, substituto de Erika Marena, transferida para Sergipe, apontou que Cancellier era chefe de uma quadrilha que desviava dinheiro de bolsas de estudos. Cancellier foi acusado de ter nomeado ou mantido em cargos de destaque um grupo de professores que abastecia uma suposta política de desvios de verbas de bolsas de estudo na UFSC e diz que o reitor só não foi indiciado por conta de sua morte. O delegado, no entanto, não conseguiu provas de que o ex-reitor tivesse se beneficiado de um suposto esquema criminoso. Os desvios, segundo a Ouvidos Moucos, aconteceram de 2008 a 2016. Cancellier, porém, foi o único ex-reitor incriminado pelo delegado Nelson Napp, apesar de ter assumido o cargo em maio de 2016. Os reitores que comandaram a UFSC nos oito anos em que a suposta quadrilha teria atuado, Alvaro Toubes Prata (2008 a 2012) e Roselane Nekel (2012 a 2016), não foram alvo do relatório da Polícia Federal. O procurador André Bertuol, responsável pelo caso no Ministério Público Federal, ainda não decidiu se denuncia os investigados ou arquiva o caso.
A Polícia Federal disse, em nota, que os inquéritos foram instaurados "após representação encaminhada por servidores públicos federais que se sentiram vítimas de possíveis crimes contra a honra diante da exposição de faixas com dizeres tidos como ofensivos nas dependências da UFSC". "Como já ressaltado, são apurados fatos, visando determinar a materialidade e a autoria de possível crime contra a honra, tratando-se as investigações de uma obrigação legal dentro das atribuições da Polícia Federal", afirma a instituição.
Em 14/9/17, a pedido da delegada Erika Marena, Operação Ouvidos Moucos prendeu seis professores e o reitor, Luiz Carlos Cancellier, por obstrução da Justiça No dia seguinte, a juíza determinou a soltura, mas manteve a decisão que os proibia de frequentar a UFSC. Em 2 de outubro, 19 dias após a prisão, Cancellier se jogou do 7º andar do Shopping Beira Mar de Florianópolis Em novembro foi aberta uma investigação interna na Polícia Federal para apurar a conduta dos policiais no caso. A sindicância concluiu que não houve irregularidades. Em abril, a Polícia Federal enviou relatório final da operação à Justiça, indiciando 23 pessoas.
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