domingo, 10 de junho de 2018

Auditoria ambiental comprovou estocagem a céu aberto de transformadores da CEEE e vazamentos do cancerígeno óleo ascarel

Em 2011, a Promotoria Regional de Defesa do Meio Ambiente das Bacias dos rios do Sinos e Gravataí, do Ministério Público do Rio Grande do Sul, abriu uma investigação sobre a poluição e contaminação dos cursos de água pelo tremendamente cancerígno óleo ascarel, que carregava os transformadores de energia elétrica da CEEE - Companhia Estadual de Energia Elétrica e outros grandes usuários industriais. O óleo ascarel foi banido mundialmente e também no Brasil, por resoluções do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Foi nomeada uma auditoria ambiental que vistoriou a CEEE e encontrou tremendas irregularidades e irresponsabilidades. O óleo ascarel vazando dos transformadores estocados a céu aberto, apodrecendo, e com o óleo escorrendo pelo solo em direção às caixas de recolhimento do esgoto pluvial. Dali, para o riacho Ipiranga, e deste para o rio Guaíba. O relatório técnico detalhado foi entregue ao Ministério Público. Mas, passados sete anos, não se tem qualquer satisfação do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul para a população gaúcha. Enquanto isso, Porto Alegre e sua região metropolitana exibem o dobro de casos de cânceres da média nacional. Nada é por acaso. Leia a seguir a íntegra desse relatório escabroso que continua escondido dentro de um processo burocrático. Quem quiser consultar a íntegra do relatório de auditoria ambiental, ou copiar o documento, clique no link a seguir https://goo.gl/kKDz9e

Ministério Público do Rio Grande do Sul 

PROMOTORIA REGIONAL DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE DAS BACIAS DOS RIOS DO SINOS E GRAVATAÍ DIVISÃO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO - DAT 

Rua Irmão Geraldo, 181 - Gravataí/RS - CEP 94000-970 - Fone: (51) 3488-1977 1/20 

ASSUNTO: RELATÓRIO DE VISTORIA 

SOLICITANTE: PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE DE PORTO ALEGRE 

IC.0833.00066/2011 

COMPANHIA ESTADUAL DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE Av. Ipiranga, 8450 – Porto Alegre 

1-CONSIDERAÇÕES INICIAIS: Trata o presente Relatório da vistoria técnica realizada nas dependências da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE, situada na Av. Ipiranga, 8450, Bairro Jardim Carvalho, município de Porto Alegre, realizada no dia 04/08/11, a partir das 14:30 horas afim de averiguar denúncia recebida pela Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre. Participaram da vistoria a Promotora de Justiça Annelise Steigleder, servidores da Divisão de Assessoramento Técnico do Ministério Público Estadual e soldados do Batalhão de Polícia Ambiental da Brigada Militar. A vistoria foi acompanhada por servidores da CEEE nas dependências da área de depósito dos transformadores, oficina e laboratório analítico da instituição. Na vistoria foi constatado o armazenamento de diversos transformadores a céu aberto e quantidade estimada em 120.000 litros de Bifenilas Policloradas – PCB´s (nome comercial Ascarel) a céu aberto, em local desprovido de bacia de contenção, sem licença ambiental. Vários transformadores apresentavam vazamentos do conteúdo oleoso diretamente para o piso e com visível transporte para as caixas pluviais. A área não se encontrava isolada e identificada. Bifenilas Policloradas é o nome genérico dado à classe de compostos organoclorados utilizados como fluído dielétrico em transformadores. A área apresenta vários indicativos de contaminação por PCB´s. 


As Fig. 01 e 02 ilustram a localização da área. Fig. 01 – Localização da empresa investigada em Porto Alegre (GoogleMap, 2011). Ministério Público do Rio Grande do Sul PROMOTORIA REGIONAL DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE DAS BACIAS DOS RIOS DO SINOS E GRAVATAÍ DIVISÃO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO - DAT Rua Irmão Geraldo, 181 - Gravataí/RS - CEP 94000-970 - Fone: (51) 3488-1977 2/20 As Bifenilas são conhecidas como resíduos perigosos conforme a NRB 10.004:04 – Anexo A (F100) e Anexo C – substâncias que conferem periculosidade aos resíduos. A presença dessas substâncias foi confirmada através da apresentação de Laudo Analítico realizado pela CEEE em amostras de óleo armazenados no pátio da empresa. Foi realizada a coleta de amostras de águas e material sedimentar acumulados em caixa de passagem no pátio onde se encontravam os transformadores. As amostras de água e material sedimentar foram acondicionadas em frascos adequados, mantidos em ambiente conservado e entregues para a empresa custear as análises em laboratório credenciado junto ao órgão ambiental estadual – FEPAM. Foi requerida a empresa a adoção de medidas emergenciais de controle dos resíduos perigosos armazenados a céu aberto, bem como identificação da área para evitar o trânsito de pessoal. A CEEE informou que está em andamento certame licitatório para recolhimento e tratamento dos resíduos armazenados irregularmente na área bem como da existência de projeto para construção do pavilhão da seção de manutenção de transformadores (estaleiro dos transformadores). 2-LOCALIZAÇÃO DA ÁREA INVESTIGADA: A área investigada situa-se no município de Porto Alegre, conforme ilustra a Fig. 01 a 03. A equipe do MP/Brigada Militar percorreu a área onde são armazenados os transformadores, a céu aberto constatando a presença de diversos equipamentos com vazamento do conteúdo dielétrico para o piso existente na área, conforme ilustram as fotos 05 a 08. Fig. 02 – Situação das áreas investigadas de armazenamento dos transformadores e do laboratório analítico junto a área da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE no bairro Jardim Carvalho em Porto Alegre/RS (Google Earth, 2011 – imagem de 07/01/09). 


Detalhe da área investigada e do ponto de coleta de amostra de água e material sedimentar (amarelo). A linha vermelha identifica a provável área de contaminação que deverá ser investigada. Em azul as áreas de armazenamento dos transformadores a céu aberto. Na área azul hachurada há confirmação da presença de bifenilas policloradas – PCB´s nos tanques de armazenamento. 3-SITUAÇÃO CONSTATADA: A vistoria na área foi realizada com a presença dos responsáveis pela área ambiental da Companhia Srs. Eduardo Rosa Marimon, Paulo Pertile e Leandro Soares, entre outros. Foto 01 e 02 – Vista geral da área de armazenamento de transformadores Ministério Público do Rio Grande do Sul PROMOTORIA REGIONAL DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE DAS BACIAS DOS RIOS DO SINOS E GRAVATAÍ DIVISÃO DE ASSESSORAMENTO TÉCNICO - DAT Rua Irmão Geraldo, 181 - Gravataí/RS - CEP 94000-970 - Fone: (51) 3488-1977 4/20 Foto 03 – Vista geral da área de armazenamento dos transformadores e dos tanques que acumulam cerca de 120.000 litros de PCB´s (Ascarel). Foto 04 – Tanques e transformadores que acumulam PCB´s. Os locais são desprovidos de bacias de contenção e isolamento de eventuais vazamentos, descumprindo as normas vigentes. 

3.1-Manuseio, acondicionamento, armazenamento e operação inadequados de resíduos perigosos Situação de gravidade foi constatada quanto a presença de PCB´s armazenados em transformadores e tanques a céu aberto, desprovidas de bacia de acumulação, descumprindo as exigências estabelecidas na NBR 12.235:92 e NBR 8371:05 As áreas estão sujeitas ao regime das chuvas, transportando material dos transformadores e tanques para as drenagens pluviais. O conteúdo oleoso dielétrico escapa dos equipamentos e escorre pelo piso atingindo as caixas de passagens e drenagens pluviais, conforme ilustra a foto 05, 06, 07 e 08. Foto 05 – Detalhe de vazamento do conteúdo de um dos tantos transformadores existente da área. O conteúdo dielétrico dos transformadores não possui quaisquer identificação. Uma vez em contato com o piso dos óleos são transportados para o sistema pluvial da área. Foto 06 e 07 – Vista geral dos equipamentos e da situação das caixas de drenagem pluvial e piso (rachado), possibilitando o escapamento dos resíduos perigosos para o ambiente, causando poluição. 


De maneira geral as estruturas de armazenamento dos equipamentos e resíduos perigosos (Ascarel) constatados na vistoria são completamente inadequadas diante das propriedades químicas e físicas desses produtos e de seus efeitos na saúde humana e meio ambiente. Conforme a NBR 8371:05 (Ascarel para transformadores e capacitores - Características e riscos) as seguintes medidas deveriam estar sendo adotadas pela CEEE frente ao manuseio, acondicionamento, armazenamento e operação dos mesmos: 3.1.1-Manuseio (itens 4.4.1 a 4.4.14 NBR 8371:05): No manuseio dos PCB e seus continentes devem ser tomadas precauções de forma a evitar riscos de contaminações do meio ambiente e a possibilidade de contatos prolongados com pessoas. O PCB apresenta odor característico similar ao dos inseticidas organoclorados. As condições de exposição ao PCB, em ambientes de trabalho, devem atender à legislação trabalhista em vigor. Os locais em que os PCB são manipulados devem ser sinalizados, e possuir ventilação adequada, a fim de evitar a exposição aos seus vapores. 

As pessoas acometidas ou sujeitas à inflamação de garganta e dos brônquios, doenças crônicas de órgãos internos, doenças infecciosas, eczemas, dermatites e dermatites alérgicas não devem exercer atividades ligadas ao PCB, bem como pessoas que apresentem reações alérgicas específicas. As pessoas que exercem atividades envolvendo o manuseio contínuo de ascarel devem ser submetidas a acompanhamento médico sistemático. No contato direto com ascarel, deve-se usar óculos de segurança ou protetor facial, luvas de preferência à base de material impermeável (por exemplo polietileno), botas ou sapatos com solado sintético, roupas protetoras (avental não absorvente descartável) e máscara de proteção respiratória com filtro código B, para gases inorgânicos (conforme ABNT NBR 13696), acompanhado de pré–filtro para partículas. Não devem ser usados equipamentos de proteção individual (EPI) à base de borracha de neoprene. Os EPI devem ser preservados para o manuseio exclusivo de PCB. As roupas contaminadas devem ser descartadas. Deve ser evitado o manuseio de equipamentos e/ou continentes que contenham PCB a temperaturas acima de 60°C. Em caso de necessidade de manuseio acima de 60°C, deve ser usada, além dos EPI, como máscara respiratória autônoma. Exposição direta ao sol dos equipamentos em dias de calor pode gerar temperaturas superiores a 60°C. Não se deve comer, beber, fumar ou usar artigos de higiene pessoal nos locais onde se trabalha com PCB. Após o manuseio de PCB, antes de qualquer refeição e uso de instalações sanitárias, rosto, mãos e braços devem ser lavados com água morna e sabão neutro. É desaconselhável o uso de solventes, detergentes ou abrasivos (areia, sabões especiais etc.). Não há quaisquer controle relacionado a essas medidas na área. Os equipamentos contendo PCB devem ser manuseados e movimentados com cuidado, a fim de se evitarem choques mecânicos que possam causar vazamentos. Os capacitores devem ser manuseados através das abas laterais e nunca pelas buchas. 

Os transformadores devem ser rnanuseados de acordo com as recomendações do fabricante. Os equipamentos ou continentes de PCB, não devem ser tombados, para evitar derramamentos. Os continentes ou equipamentos devem ser movimentados sempre na posição vertical e amarrados, para evitar tombamentos. Os equipamentos ou continentes devem ser movimentados preferencialmente através de empilhadeiras, guinchos, talhas ou caixas apropriadas, e conduzidos por profissionais especializados em movimentação de carga. Quando os equipamentos forem movimentados por guinchos ou talhas, devem ser utilizados estropos adequados, evitando-se o contato do cabo de aço ou corrente com as buchas. Quando movimentados por empilhadeira, os equipamentos ou continentes devem ser dispostos sobre estrados e amarrados. 

3.1.2- Acondicionamento (itens 4.5.1 a 4.5.3 da NBR 8371:05): O acondicionamento de PCB, dos equipamentos contendo PCB e dos materiais contaminados por PCB, em caso de acidentes ou de manuseio do produto, deve ser feito em continentes que apresentem boas condições de uso e que atendam aos requisitos desta Norma. Os continentes para acondicionamento devem preferencialmente ter 200 L de capacidade e ser construídos em chapa fina a frio, com espessura nominal (e) de 1,21 mm (1,12 mm < e ≤ 1,32 mm), conforme a ABNT NBR 11888, e com as bordas especialmente seladas. Devem ser revestidos internamente por tinta epóxi, polietileno ou galvanização e devem ser facilmente identificados, através da rotulagem. A utilização de continentes diferentes do previsto na norma, desde que construídos segundo as Normas Brasileiras correspondentes, ficam condicionados à aprovação prévia do órgão estadual de controle do meio ambiente. 

3.1.3- Armazenamento (itens 4.6.1 a 4.6.11 da NBR 8371:05): Os equipamentos que apresentem corrosão ou vazamentos ao serem armazenados devem ter o líquido PCB drenado e acondicionado em continentes. O armazenamento de equipamentos danificados ou de continentes contendo PCB deve atender à Portaria Ministerial nº 124, à Instrução Normativa nº 001 e à ABNT NBR 12235, e deve ser feito em local aprovado pelo órgão estadual do meio ambiente. Em relação à construção para o armazenamento, além do atendimento dos documentos mencionados na norma deve ser verificada, junto aos órgãos estaduais do meio ambiente, a necessidade de adoção das seguintes medidas: a) impermeabilização inferior da área; b) colocação de cobertura para proteção contra chuva e construção de paredes laterais, de forma que se tenha uma única entrada de acesso e que se garanta uma adequada ventilação; c) instalação de sistema de drenagem e coleta de líquidos percolados, em caso de vazamentos ou acidentes; d) Instalação de sistema de proteção contra incêndios que não utilize água como meio de extinção de chama. NOTA: Os projetos de áreas de armazenamento de PCB devem ser analisados e aprovados pelo órgão estadual de controle do meio ambiente, antes da sua implantação. 

Quanto às condições de segurança, a área deve possuir: a) sistema de isolamento de acesso e de sinalização, para alerta quanto aos perigos do local; b) iluminação e força, para as ações em situações de emergência; c) sistema de comunicação com possibilidade de uso em situações de emergência; d) acessos internos e externos mantidos em boas condições; e) instruções do anexo A, afixadas em local visível; f) depósitos de alimentos, água potável, remédios, combustíveis e óleo mineral isolante, distantes da área de armazenamento de PCB; g) pisos, paredes e demais componentes da estrutura, que possam ser atingidos por vazamentos, construídos em material impermeável ou revestidos por pintura impermeável, com tinta à base de epóxi, para permitir a descontaminação em caso de vazamento; h) sinalização com placa de "Entrada Proibida a Pessoas não Autorizadas". Os equipamentos e/ou continentes contendo PCB devem ser armazenados verticalmente e amarrados para evitar tombamentos. Todos os equipamentos e/ou continentes contendo PCB devem ser vistoriados semestralmente quanto a vazamentos. Em caso de incêndio deve-se evitar entrar no ambiente. Caso isto seja inevitável, fazê-lo usando os EPI e máscara de proteção respiratória autônoma. É proibido comercializar tambores ou outros continentes contaminados, bem como utilizá-los para acondicionar outros produtos, conforme Portaria Interministerial nº 19. Todos os continentes e equipamentos contendo PCB devem apresentar o rótulo de identificação conforme o anexo A da referida norma. Os equipamentos de pequeno porte devem ser colocados em sacos plásticos e estes em continentes. Estes últimos devem ter o rótulo de identificação conforme o anexo A da norma. Adicionalmente, pode-se colocar material absorvente. O responsável pelo local de armazenamento deve manter um registro dos equipamentos e continentes armazenados no local. As seguintes informações devem constar no registro descrito na norma: a) data de entrada do equipamento ou continente; b) se for equipamento: ― Tpo (transformador, capacitor); ― quanTdade de líquido; c) se for continente: ― conteúdo (óleo, material contaminado, equipamentos danificados); ― quanTdade; d) ocorrência de acidentes, vazamentos, irregularidades, danificação de recipientes e outros; e) registro das inspeções semestrais. 3.1.4-Operação (item 4.7.1 a 4.7.6 da NBR 8371:05): Os equipamentos elétricos, originalmente preenchidos com PCB, podem conforme Portaria Interministerial nº 19, continuar em operação até que seja necessário o seu esvaziamento. Portanto, eles devem atender aos requisitos da Norma durante a sua operação. Os equipamentos elétricos contendo líquido isolante podem ser classificados, quanto ao seu nível de PCB descritos na norma. 

A coleta de amostra do líquido isolante, para fins de classificação quanto ao nível de PCB, deve ser executada conforme a ABNT NBR 8840, porém, utilizando-se sistemas de amostragem específicos e independentes para cada equipamento elétrico sob avaliação. Os equipamentos elétricos definidos devem atender além das restrições contidas na Portaria Interministerial nº 19. O local de instalação de equipamentos com PCB deve ser: a) sinalizado de forma a restringir o acesso de pessoas; b) dotado de dispositivos que evitem choques e conseqüentes danos que possam causar vazamentos, caso seja próximo a áreas de circulação de veículos ou equipamentos móveis; c) dotado de ventilação que impeça o acúmulo de vapores; d) isolado de materiais combustíveis ou equipamentos que possam inflamar-se, tais como transformadores isolados a líquido, com ponto de fulgor inferior a 300°C; e) dotado de sistema de contenção, capaz de conter no mínimo 10% do volume total do líquido. Quando da sua desativação, os equipamentos devem ser considerados como resíduos perigosos e seu descarte devem obedecer ao especificado na norma. Foto 09 – Fluxograma simplificado dos procedimentos de manejo dos equipamentos contaminados ou com suspeita de contaminação na oficina da Companhia. Verifica-se, portanto diversas situações precárias e de gravidade evidenciadas na vistoria realizada no dia 04/08/11 nas dependências da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE relacionadas ao controle dos equipamentos e resíduos de PCB´s. 

3.2-Operação de atividade de alto potencial poluidor sem licenciamento ambiental: As atividades realizadas envolvendo o manejo, acondicionamento, armazenamento e operação de equipamentos contendo PCB´s necessitam de licenciamento ambiental nos termos do Artigo 10 da Lei Federal nº 6938/81. Não foi verificada a existência da referida autorização por parte do órgão ambiental competente nem protocolo de solicitação do licenciamento para aquela atividade, apesar dos responsáveis reconhecerem a necessidade de tal procedimento. 

3.3-Operação de Laboratório sem licença e credenciamento junto ao órgão ambiental estadual: O laboratório analítico da Companhia opera sem licença ambiental não estando credenciado junto ao órgão ambiental estadual. As fotos 10 e 11 ilustram a situação constatada. Fotos 10 e 11– Situação do laboratório analítico da empresa. Na vistoria realizada no dia 04/08/11 foi constatada a presença de equipamentos analíticos, produtos químicos e materiais associados à atividade. Verificou-se a geração de efluentes provenientes da lavagem dos equipamentos, sendo informado pelo Eng. Químico responsável a realização de procedimentos de coleta e armazenamento daqueles efluentes contendo produtos perigosos em recipientes (bombonas) e posterior envio para área de armazenamento da Companhia. Os efluentes gerados pelo Laboratório são lançados na rede de esgotos e posteriormente o arroio Dilúvio, não recebendo nenhum tipo de tratamento. 

3.4- Acúmulo de materiais oleosos na rede pluvial e coleta de amostras para avaliação ambiental: Devido ás condições operacionais inadequadas da atividade de manejo, acondicionamento, armazenamento e manipulação de equipamentos contendo PCB verificaram-se a presença de substâncias oleosas da rede de drenagem da área. Os transformadores e tanques de armazenamento são mantidos a céu aberto, proporcionando o arraste dos poluentes e resíduos para as caixas de drenagem pluvial. Objetivando avaliar a presença dessas substâncias o local procedeu-se a coleta de amostra da água contida na caixa de drenagem e do material sedimentar, conforme ilustram as fotos 12 e 13. 

As amostras localizaram-se nas coordenadas latitude 30° 03´17,8”S, longitude 51° 09´28,3”O (Datum SIRGAS 2000.) Foram recolhidos dois litros de água e 0,5 Kg de material sedimentar acumulados numa das caixas de drenagem do pátio onde se encontram depositados os transformadores e tanques de armazenamento. As amostras foram coletadas em frascos adequados e acondicionadas em caixa térmica e encaminhadas para avaliação em laboratório credenciado, a critério da CEEE. As amostras geraram o Laudo de Coleta anexo ao presente relatório. Relatório final será elaborado quando do recebimento dos resultados analíticos. 

4 - CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES: Reveste-se de gravidade e preocupação os procedimentos e falta de controle operacional associado ao manejo, acondicionamento e armazenamento de PCB´s evidenciados na vistoria realizada no dia 04/08/11 nas dependências de Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE, situada na Av. Ipiranga, 8450 – Jardim Carvalho – Porto Alegre/RS. Destaca-se que os equipamentos cujo líquido isolante contenha teores iguais ou maiores que 500 mg/kg de PCB devem atender a todos os requisitos estabelecidos na NBR 8371:05 e NBR 12335/92. Os procedimentos de manejo, acondicionamento, armazenamento e operação de equipamentos contendo PCB´s devem ser realizados do forma a atender estritamente os condicionantes estabelecidos nas referidas normas. O transporte de PCB, quando em vias públicas, deve atender ao Decreto Federal nº 96.044, ABNT NBR 7500 e ABNT NBR 7503. O transporte de continentes que acondicionam PCB, materiais contaminados e equipamentos elétricos devem ser feitos preferencialmente em veículos providos de sistema de contenção, com volume suficiente para conter no mínimo 30% da carga transportada. Causa surpresa o fato da atividade não possuir licença ambiental, descumprindo diversas normativas atinentes, bem como operar equipamentos e armazenar substâncias reconhecidamente perigosas e tóxicas. As Bifenilas Policloradas (PCBs) são uma classe de contaminantes formados por dois anéis de benzeno unidos por uma ligação de carbono-carbono, com 1 a 10 átomos de cloro substituindo os átomos de hidrogênio, nas posições 2-6 e 2’-6’ dos anéis aromáticos. A sua fórmula geral é C12H(10-n)Cln, onde 1≤n≤10 e sua massa molecular varia entre 188 e 494 g mol-1 (WHO 1992, 2003), Entre os 209 possíveis congêneres de PCBs, cerca de 130 são prováveis de ocorrer em misturas comerciais (UNEP 2002). 

Estes contaminantes podem ser manufaturados pela progressiva cloração da bifenila em presença de um catalisador apropriado, assim como o cloreto de ferro (WHO 1992), o que dá a esse produto uma coloração característica. Devido às implicações à saúde e impacto ao ambiente o uso e produção de PCBs foram severamente restritos ou banidos em muitos países. No Japão a sua produção e uso foram banidos em 1972. No mesmo ano a Suécia restringiu a sua utilização e produção, já os Estados Unidos o fizeram em 1977, a Noruega em 1980, a Finlândia em 1985 e a Dinamarca em 1986 (WHO 1976, WHO 2003). 

O Brasil proibiu a fabricação, a comercialização e o uso de PCBs, através da Portaria Interministerial 19, de 2 de janeiro de 1981. Entretanto, permite o funcionamento de equipamentos já instalados, até sua substituição integral ou a troca do fluído dielétrico por produto isento de PCBs. Dois anos depois, o Ministério do Interior estabeleceu a Instrução Normativa 001 SEMA/STC/CRC, de 10 de junho de 1983, que disciplina as condições de armazenamento, manuseio e transporte de PCBs e/ou resíduos contaminados (Penteado & Vaz 2001). 

Em 1966, a presença de resíduos de PCB na biota foi descoberta após a pesquisa realizada por Sören Jensen em um programa de investigação de acúmulo do inseticida p,p’-DDT no ambiente (Boon 1986). Desde então investigações em muitas partes do mundo têm revelado ampla distribuição dos PCBs em amostras ambientais, sendo o transporte atmosférico o principal mecanismo para a dispersão global desses compostos (Lang 1992, Tanabe et al. 1987). 

Em 1988 o CONAMA publicou a Resolução nº 06/88 disciplinando no art. 4º o que segue: As Bifenilas Policloradas (PCB´s) presentes no solo e em águas superficiais entram na atmosfera pela volatilização. Uma vez na atmosfera estará presente tanto na fase vapor, quanto adsorvida no material particulado. Através de ciclos de volatilização, condensação e deposição, estes compostos podem ser transportados pela atmosfera de áreas de baixa e média latitude em direção a áreas de alta latitude, formando um gradiente translatitudinal conhecido por “efeito de destilação global” (ATSDR 2000). O transporte destes compostos através de espécies migradoras também pode ocorrer. Em pesquisa realizada com a espécie de salmão Oncorhynchus nerka, em lagos no Alaska, foi observado que esta espécie em sua migração de reprodução transportava PCBs para os lagos em que desovavam. Devido a esta espécie morrer após a reprodução, toda a carga corpórea destes compostos era depositada no lago (Krummel et al. 2003). 

As formas de entrada destes contaminantes ocorrem pelo despejo direto do poluente, pelo escoamento continental e pela precipitação atmosférica. Após entrarem no ambiente aquático, estas substâncias, devido a sua baixa solubilidade em água, tendem a ser adsorvidas pelo material particulado em suspensão e pelo sedimento ou se solubilizar em biofilmes superficiais ou tecidos vivos. Estes compostos são capazes de ser bioacumulados pela biota e biomagnificar através da cadeia trófica (Hoivik & Safe 1998, EPA 1999a, Froescheis et al. 2000). 

Em peixes, a principal via de assimilação dos PCBs é a alimentação, embora, os compostos dissolvidos na água possam entrar por difusão através das brânquias e do tecido epitelial e os PCBs dissolvidos também podem ser absolvidos através do intestino. No ambiente a degradação destes compostos depende do posicionamento e do número de átomos de cloro nas moléculas e geralmente a persistência cresce com o aumento do número de átomos de cloro (ATSDR 1998). A maioria dos congêneres de PCB, principalmente aqueles que não possuem moléculas de hidrogênio adjacentes nos anéis, são extremamente persistentes no meio ambiente. Estima-se que os PCBs têm uma meia-vida entre três semanas e dois anos na atmosfera, com exceção dos congêneres com um e dois cloros, e mais de seis anos em solos e sedimentos aeróbicos (UNEP 2002). Misturas comerciais de PCBs provocam uma ampla variação de efeitos tóxicos incluindo hepatomegalia, atrofia do timo, imunosupressão, neurotoxicidade, toxicidade dérmica e etc. Estas várias respostas tóxicas são dependentes da via e duração de exposição da mistura de PCBs; da espécie utilizada considerando a idade e sexo do indivíduo e das características da mistura, o que inclui a sua pureza, a quantidade de cloro e a distribuição relativa de congêneres (Hoivik & Safe 1998). 

A Agência Internacional para Pesquisa de Câncer (International Agency for Research on Cancer - IARC) incluiu os PCBs no grupo 2A, caracterizado por existir evidências limitadas de carcinogenicidade em humanos e evidências suficientes em animais de laboratório (Larini 1997, ATSDR 2000). Os PCBs têm sido apresentados como eficazes promotores de tumores em ratos e camundongos. A capacidade das misturas de PCBs para gerar tumores hepáticos parece ser relacionada com a porcentagem de cloro das misturas. Estudos sobre carcinogenicidade em fígado promovida por misturas de PCBs foram recentemente reavaliados e concluiu-se que apenas as misturas com alta porcentagem de cloro apresentaram potência carcinogênica (Hanberg 1996). Os PCBs também interferem na homeostase dos hormônios tireoideanos. Em estudos realizados em ratos e macacos, os PCBs causaram redução na concentração de tiroxina (T4) total e livre no plasma e um concomitante crescimento na concentração de Hormônio Estimulante da Tireóide (TSH). A redução da concentração de T4 no soro também foi descrito em trabalhadores que foram expostos a estes compostos (Hagmar et al. 2001). 

Alterações no sistema imunológico, induzidas por PCBs, também foram constatadas. Mamíferos que foram expostos a PCBs apresentaram depressão da resposta imune humoral e celular (Duffy et al. 2002). Um trabalho realizado na Suécia com seres humanos apresentou uma correlação significativa entre a diminuição de células NK e o aumento do nível de PCBs no soro (EPA 1999b). Os PCBs também são capazes de atravessar a barreira placentária causando uma significante exposição pré-natal. Além disso, são excretados pelo leite e podem expor recém nascidos a concentrações relativamente altas. Devido a ampla variedade de efeitos destes compostos, a exposição durante o período uterino e pós-natal pode ser crítica, uma vez que os indivíduos em desenvolvimento são mais suscetíveis aos efeitos tóxicos induzidos pelos poluentes do que os adultos (Krauthacker et al. 1998, Walkowiak et al. 2001, Dallaire et al. 2002). Apesar dos estudos realizados, ainda existem muitas incertezas quanto aos efeitos dos PCBs tanto nos seres humanos quanto em outros seres vivos, impossibilitando uma real análise de seus efeitos nos ecossistemas. Embora estes compostos tenham sido proibidos pela primeira vez na década de 70, a data limite para o seu uso expira em apenas 2025. Ainda é possível encontrar altas concentrações destes compostos no ambiente, permeando a cadeia trófica dos ecossistemas em que se encontram e consequentemente contaminando os seres humanos. 

A Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE opera atividade potencialmente poluidora sem o devido licenciamento ambiental, mantendo substâncias perigosos e tóxicas em desacordo com as normas ambientais vigentes, causando poluição e gerando riscos assumidos de causar danos à saúde da população e ao meio ambiente. Investigações sobre a possível dispersão dessas substâncias foram realizadas através da coleta de amostras de água e material sedimentar em caixa de passagem pluvial existente no pátio de armazenamento de transformadores e tanques contendo PCB´s. Medidas urgentes devem ser providenciadas, contemplando: a) Preparação de local adequado para o manejo, acondicionamento e armazenamento dos resíduos de PCB´s acumulados na área da empresa até deu destino correto, atendendo as normas atinentes e exigências do órgão ambiental competente; b) Isolamento e correta identificação das áreas de estocagem, atendendo os critérios técnicos de segurança ocupacional e ambiental; c) Realização de inventário completo da localização e quantitativos de PCB´s existentes nas dependências da CEEE, num prazo máximo de 30 dias, a ser apresentado a Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre; d) Realização de investigação ambiental minuciosa na área de influência da atividade (solo e água), a ser efetivada por profissional(ais) legalmente habilitado(s), da existência de sítios de contaminação junto aos espaços utilizados para manejo dos transformadores e tanques de armazenamento, bem como no solo abaixo do piso do atual depósito, utilizando procedimentos de amostragem que possam representar a real extensão da eventual contaminação por PCB´s, mediante a apresentação de projeto técnico a ser autorizado pelo órgão ambiental competente, num prazo de 60 dias a contar da presente data; e) Avaliação da saúde ocupacional dos trabalhadores envolvidos nas atividades de manejo dos PCB´s na área da CEEE, através da elaboração de laudo médico assinado por profissional habilitado, a ser apresentado num prazo de 90 dias; f) Apresentação dos protocolos de licenciamento ambiental das atividades irregulares desenvolvidas, destacadamente aqueles associados ao manejo e depósito de resíduos perigosos, bem como do Laboratório Analítico, num prazo de 90 dias a contar da presente data. Em ambas as atividades deverão ser informadas os procedimentos para contenção e tratamento de eventuais efluentes gerados. Lançamentos de efluentes somente poderão ser realizado mediante autorização do órgão ambiental estadual – FEPAM; g) A Empresa deverá apresentar Plano de Gerenciamento de Resíduos (recicláveis, da construção civil, Classe I e II) nos termos da Lei Federal nº 12.305/10, devidamente aprovado pelo órgão ambiental competente, promovendo o manejo ambientalmente seguro, desde a coleta, transporte, tratamento e disposição final; h) Deverá ser elaborada pelo setor competente Manual de Riscos da atividade, promovendo informações qualificadas a serem fornecidas aos trabalhadores da CEEE naquela planta. O Manual de Risco deverá atender as disposições do “Projeto de Manual de Riscos” do órgão ambiental estadual – FEPAM (01/01), a ser apresentado à Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre, num prazo de 120 dias; i) Recomenda-se, também a realização de Auditoria Ambiental independente para avaliação da situação constatada. Este é o relatório, em 16/08/2011. Biólogo/Bioquímico Jackson Müller Promotoria Regional de Defesa do Meio Ambiente Divisão de Assessoramento Técnico - DAT e-m

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