quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Tribunal de Justiça paulista decide não levar a juri a nutricionista que atropelou na calçada e matou o jovem executivo Vitor Gurman


O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu nesta quinta-feira (21) que a nutricionista Gabriella Guerrero – denunciada por atropelar e matar o jovem executivo e administrador Vitor Gurman, de apenas 24 anos, em julho de 2011, na Vila Madalena (zona oeste de São Paulo) quando conduzia um Land Rover – não vai a júri popular. Com isso, o crime antes considerado doloso (com intenção) passa a ser culposo (sem intenção). A decisão revoltou a família e os amigos da vítima. Já a defesa da nutricionista a considerou um sinal de Justiça. 


Ela tinha ido a um bar da região com seu namorado, o dono do Land Rover. E ambos beberam. Como ele estava bêbado, ela, alcoolizada, resolveu pegar o volante. Atropelou na calçada e matou o jovem executivo que estava saindo de uma visita à casa da avó na mesma rua. Por 2 votos a 1, os desembargadores acolheram recurso apresentado pelos advogados dela no qual pediam a anulação da decisão da Justiça em primeira instância, que aconteceu no ano passado. Segundo a denúncia, a nutricionista havia ingerido bebida alcoólica e dirigia acima da velocidade. De acordo com o Ministério Público Estadual, ela assumiu o risco de matar, o que no meio judicial é chamado de dolo eventual. No homicídio doloso, as penas podem variar de 12 a 30 anos de prisão. No culposo, geralmente a pena é revertida em serviços à comunidade. 

É por isso que o Brasil não tem jeito, nem terá, enquanto houve um sistema legal que permite absurdos dessa ordem, e a maldita da hermenêutica imperando, permitindo que julgadores torçam a lei conforme desejam. No mês passado, o relator desembargador Miguel Marques e Silva, da 14ª Câmara de Direito Criminal, já havia dado seu voto pela manutenção da sentença inicial de pronúncia (quando o acusado é mandado a júri). Os desembargadores Fernando Torres Garcia e Hermann Herschander, que haviam pedido vista, não seguiram o relator nesta quinta-feira (21). Em seu voto, Garcia, afirmou que não há indícios suficientes para comprovar que ela agiu dolosamente.

Segundo ele, para que se admita a figura dolosa nos crimes de trânsito, "culposos em regra", exige-se que haja elementos concretos que indiquem que o motorista assumiu o risco de produzir o resultado "com absoluta indiferença à objetividade jurídica". "De qualquer forma e como já exaustivamente mencionado, não há indícios, mínimos que sejam, a indicar que a recorrente, deliberadamente, embriagou-se e assumiu o risco de produzir o resultado que lamentavelmente ocasionou a morte do jovem Vitor Gurman", escreveu Garcia. 

O júri popular (composto por sete pessoas da sociedade civil) é usado para julgar casos de homicídios intencionais. "A decisão do Tribunal de Justiça reconhecendo que Gabriella Guerrero deveria responder por delito de homicídio culposo restabelece a verdade dos fatos. Durante todo o processo ficou demonstrado de maneira clara que ela jamais agiu com dolo, ou seja, que pretendia causar a morte da vítima", disse José Luis Oliveira Lima, advogado da acusada. Este advogado é o mesmo que defendeu o bandido petista mensaleiro José Dirceu no processo do Mensalão do PT. 

Nilton Gurman, tio da vítima, disse que a família recebeu indignada a decisão, mas que vai recorrer. "Estamos indignados e inconformados, mas vamos continuar lutando. Um absurdo que alguém que bebe, dirige e mata alguém fique impune. Se a Justiça não funciona, vamos acreditar na Justiça divina", afirmou Nilton, que criou o grupo Viva Vitão, o qual luta pelo combate à violência no trânsito e mudanças nas leis para motoristas que matam ao volante. Para ele, a vítima nunca se vê defendida. "São inúmeros casos iguais, não estamos falando só do Vitor. Se acreditam que beber e andar em alta velocidade não causam esses resultados, a impunidade vai continuar. Até que se quebre esse paradigma, será assim. É dolorido saber que a Justiça não tutela o cidadão de bem, a vítima", afirmou Nilton.

O dolo, segundo o Ministério Público, ocorreu porque a jovem dirigia com velocidade acima do permitido no local do acidente – o limite na rua Natingui era de 30 km/h e o veículo estaria entre 62 km/h e 92 km/h, segundo um dos laudos, e ela havia ingerido bebida alcoólica.

Gabriella Guerrero disse que havia bebido apenas uma margarita e que perdeu o controle do veículo. Ela afirmou que isso aconteceu quando tentou segurar o namorado à época e dono do carro, que estava embriagado e sem cinto no banco do passageiro. Laudo particular apresentado pela família indicava que a velocidade do veículo era de 38 km/h a 44 km/h. Sobre o uso de bebida alcoólica, a defesa sustenta que os laudos comprovaram que a nutricionista não estava embriagada e que ela nunca se recusou a fazer exames, como diz a família da vítima. "O que aconteceu foi uma tragédia para duas famílias", disse Oliveira Lima, o defensor do bandido petista mensaleiro José Dirceu.

Já o advogado da família Gurman e assistente da Promotoria na acusação, Alexandre Venturini, defende que há indícios suficientes para a acusação por dolo eventual. Segundo o advogado, a nutricionista estaria, sim, alcoolizada, conforme mostrou exame no IML (Instituto Médico Legal), embora os índices não apontassem para embriaguez. Aos desembargadores, Venturini sustentou que ela "admitiu que ingeriu bebida alcoólica e acabou ceifando uma vida". "Entendo e respeito a dor que a própria autora deve sentir até hoje. Mas não há como comparar com a dor da família, que é insuportável", afirmou.

A nutricionista e o namorado dela foram condenados a pagar indenização de aproximadamente R$ 1,3 milhão à família Gurman. Os familiares entraram com a ação argumentando que a vítima ajudava no orçamento familiar e usava sua renda para sustentar a avó. Tanto o juiz de primeira instância como o Tribunal de Justiça julgaram a ação procedente. Um imóvel do ex-namorado da nutricionista chegou a ser penhorado. Na época do crime, familiares e amigos de Gurman passaram a organizar manifestações exigindo rigor na punição a quem mata ao volante. O grupo segue com a campanha "#não foi acidente".

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