O percentual dos que decidiram anular ou votar em branco no segundo turno, no domingo (30), foi o maior registrado desde as eleições municipais de 2000: 13,3% em todo o país, segundo dados preliminares do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Em 2012, o índice foi de 9,2%. Em algumas cidades, essa parcela do eleitorado foi tão significativa que se assemelhou à diferença entre o candidato vencedor e o segundo colocado. No Rio, Marcelo Crivella (PRB) elegeu-se com 59,36% da preferência dos eleitores, enquanto 40,64% votaram em Marcelo Freixo (PSOL). Os 536,6 mil votos que separaram os dois candidatos são menos do que os 719,3 mil eleitores que não digitaram nem o dez (de Crivella) nem o 50 (de Freixo) nas urnas, mas resolveram votar em branco ou anular. O cientista político Marco Antonio Carvalho Teixeira, professor da FGV/EAESP, destaca ainda o índice de abstenção no pleito carioca, de 26,89%. Somando-se o número aos que votaram em branco ou nulo, o resultado indica que quase metade (47,03%) do município não respaldou nenhum dos dois candidatos. No caso do Rio, entra também na conta o fato de os eleitores precisarem escolher entre o que o acadêmico vê como "candidaturas antagônicas". "Uma delas considerada representante do fundamentalismo religioso. A outra, ideológica. Houve um vazio ao centro", afirma o cientista político. "Qualquer candidato que ganhasse já tomaria posse sob uma desconfiança muito grande. [Quase] metade da cidade não escolheu nenhum dos dois." Em Belo Horizonte, onde a disputa, para Teixeira, ficou entre "outsiders" da política em uma campanha de "nível horrível", os números de não votantes foram parecidos com os do Rio. Brancos e nulos somaram 20,37% dos votos e as ausências chegaram a 22,77%. A capital mineira elegeu Alexandre Kalil (PHS), ex-presidente do Atlético Mineiro. Parte da população votou após o recadastramento biométrico, que garante maior precisão ao excluir mortes não reportadas ao TSE e a mudança de cidade do eleitor. Diferente do Rio, onde a transição só ocorre em 2018 e os dados atuais de abstenção podem estar inflados. Entre seculares e religiosos, nesta eleição os grandes vencedores foram os descrentes. Trata-se de uma tendência que já apareceu no primeiro turno, em 2 de outubro, quando 13,18% dos votantes em todo o país lavou as mãos e preferiu não dar o voto a nenhum dos candidatos na disputa. Os resultados finais do domingo reforçam a mensagem de descontentamento da população com seus governantes, em quem perderam a confiança. Agora, três anos depois das manifestações de 2013, quando se intensificou a insatisfação política, o discurso do "não me representa" parece ter se traduzido pelas urnas. "Quando quase 30% da população que não vota [somando brancos, nulos e abstenções], chega-se a um patamar grave", diz Teixeira. Na avaliação do cientista político, exige-se de vencedores e derrotados uma "reflexão profunda". "Senão, vamos passar a ter governos eleitos em nome de parcela pequena da sociedade", diz Teixeira. "A democracia depende da legitimidade. Se as pessoas se recusam a participar, o processo fica enfraquecido."
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