Eu lhes proponho um filme de terror: imaginem uma Dilma que tivesse seguido direitinho os rigores da lei fiscal, que liderasse um governo de pessoas honestíssimas... Seria o fim da linha!
Por Reinaldo Azevedo - Acho que é chegada a hora de a gente ser grato a Dilma Rousseff. Acho que é chegada a hora de a gente ser grato aos ladrões que tomaram conta do governo. Calma! Eu explico. Sintetizemos assim, logo de cara, esta quadra da política brasileira: Dilma cometeu crime de responsabilidade contra a Lei Fiscal. Incidiu no Inciso VI do Artigo 85 da Constituição, com o crime devidamente descrito nos Artigos 10 e 11 da Lei 1.079. Pena para o crime: impeachment. Mas nem a Constituição nem a lei são guilhotinas fatais: ambas passam pelo crivo político. As duas Casas de representação são chamadas a se pronunciar: se a Câmara não fornecer ao menos 342 votos, a denúncia nem chega ao Senado. Se, nessa Casa, não houver ao menos 54 adesões, o impeachment não acontece. Então, meus queridos leitores, Dilma só vai perder o mandato porque não conseguiu miseráveis 172 votos, de 513 possíveis, na Câmara, e 28 de um total de 81 no Senado. Alguém que chega ao quinto ano de mandato, depois de ter sido a supergerentona do PAC, eleita com o apoio dos dois maiores partidos do País, sem ter conseguido conquistar a adesão de ao menos um terço da Câmara e do Senado, vamos ser claros, essa pessoa não tem condições de governar o País.
Mas por que não conseguiu?
Mas por que Dilma não conseguiu o apoio necessário do Congresso? Será que ela se negou a fazer as trocas que caracterizam o chamado presidencialismo de coalizão? Será que ela se negou a abrir a porteira dos ministérios e das estatais para os partidos da base aliada? Será que ela se negou a lotear a administração e, por isso, foi punida pelos políticos? Será que ela sentou sobre os cofres públicos e foi severa demais no uso da grana, de sorte a se indispor com tubarões da economia? A verdade está precisamente no contrário. Ninguém fez, como Dilma, a política do “é dando que se recebe”; ninguém, como a presidente, abriu com tanta generosidade as burras para meia dúzia de espertos. Ela cumpriu cada tarefa e cada etapa da baixa política. E por que a coisa desandou? Porque ela quebrou o País. É simples. Dilma mergulhou o Brasil na pior recessão de sua história. E, dadas as bobagens anteriores, nem o fez por gosto, mas por necessidade. Os erros estavam sendo cometidos antes, com ênfase especial no ano de 2014, quando ela disputou a reeleição. Sim, Dilma cometeu crime de responsabilidade. Sim, na sua gestão, o sistema de roubalheira, que ela herdou, atingiu o estado da arte. Mas vamos ser claros? Nem uma coisa nem outra, infelizmente, derrubam presidente no Brasil se a economia estiver crescendo e se os pobres estiverem, de algum modo, sendo beneficiados — ainda que o preço futuro de algum benefícios venham a ser, depois, recessão, desemprego e perda de renda. Quem derruba um presidente é a política em razão das besteiras que ele fizer na economia. E é por isso que a primeira e a última palavras, num processo de impeachment, são dadas pelos políticos. E por uma maioria esmagadora deles. A primeira é da Câmara, e a última é do Senado. Ouvi há pouco as falas dos senadores Paulo Paim (PT-RS) e Fátima Bezerra (PT-RN). Os dois insistem naquela ladainha chata do golpe e afirmam que Dilma está caindo porque, ora vejam, é a presidenta da redistribuição de renda e das conquistas dos trabalhadores — razão por que estaria sendo deposta pelas elites. Ora, a verdade está precisamente no contrário: Dilma só está caindo porque a economia passou a punir severamente os mais pobres, o que os levou a se descolar do governo. Tudo isso em meio a uma formidável roubalheira, com o crime de responsabilidade devidamente cravado na sua biografia. Eu lhes proponho agora um filme de terror: imaginem uma Dilma que tivesse seguido direitinho os rigores da lei fiscal, que liderasse um governo de pessoas honestíssimas. Fosse a mesma a política econômica, estaríamos no pior dos mundos. Aí, sim, Dilma nos empurraria para o abismo, para um caminho sem volta. Na dialética galhofeira da vida, sejamos gratos aos crimes de responsabilidade cometidos por Dilma; sejamos gratos aos ladrões. O conjunto da obra vai nos livrar de uma presidente que seria muito mais perigosa de fosse de uma pureza angelical.
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