segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Executivos da Odebrecht dizem ter dado R$ 100 milhões ao PT

 

 Executivos da Odebrecht disseram em tentativa de delação premiada que a empresa pagou pelo menos R$ 100 milhões em propina para o PT em negociações intermediadas pelo ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega. Os repasses teriam sido realizados por meio do Setor de Operações Estruturadas da holding, chamado pelo Ministério Público Federal de “escritório de lavagem e pagamento de propina”. De acordo com o relato dos executivos, a maior parte dos pagamentos teria sido feita em troca de benefícios obtidos nos últimos anos graças a projetos como a desoneração da folha de pagamentos e a redução de imposto de renda sobre o lucro de empresas brasileiras no Exterior. Na negociação de delação, os funcionários detalharam os valores astronômicos que abasteceram o Setor de Operações Estruturadas, comandado pelo diretor Hilberto Silva no 16º andar da sede da Odebrecht, em São Paulo, o mesmo onde funciona a presidência da empresa. O superior hierárquico de Hilberto Silva era o sinhozinho baiano Marcelo Odebrecht, preso há um ano e uma das delações mais esperadas da Lava-Jato. As contas usadas para ocultar e viabilizar pagamentos no Brasil e no Exterior eram abastecidas pelas diversas firmas do grupo. Apenas a Braskem teria bancado entre R$ 450 milhões e R$ 550 milhões para o setor no período em que o departamento funcionou, segundo levantamento prévio da empresa. E-mails que já estavam em poder dos investigadores da Lava-Jato mostram que a Odebrecht atuava fortemente junto ao governo pela aprovação de medidas que, de fato, favoreceram seus negócios, principalmente junto a Guido Mantega. Um exemplo foi o debate sobre a Medida Provisória 647/2013, convertida em lei em maio de 2014. Em março de 2014, Marcelo Odebrecht encaminhou a um dos assessores de Mantega, Sérgio Eugênio de Risios Bath, as ponderações da empresa sobre o projeto que tratava das regras para redução da alíquota do imposto de renda sobre lucros no Exterior de empresas brasileiras. “Acho que conseguimos trazer praticamente todas as empresas para um acordo”, escreveu Odebrecht ao assessor do ministro. Dias depois, o diretor jurídico da Odebrecht, Maurício Ferro, reforçaria, em e-mail a Marcelo Odebrecht, a importância de ele atuar para que o projeto saísse como desejavam. “Será importante você ter a reunião com GM (Guido Mantega) amanhã depois da PR (presidente Dilma Rousseff). Receita continua criando dificuldades e Dyogo precisará do apoio do ministro”, escreveu. Mensagens no celular do ex-presidente do grupo Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, mostram que, de fato, a Odebrecht falava em nome do setor junto ao governo. “Otávio, CNO (Construtora Noberto Odebrecht) vai trabalhar via CNI o destaque do parágrafo 2 do art. 83 no plenário. Segundo eles a ação será alinhada com o relator”, escreveu um diretor da Andrade ao executivo. Em mensagens no celular de Azevedo, o relator do projeto, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), negocia diretamente pontos da medida com o executivo. O debate sobre o projeto foi acompanhado de perto pelo líder do PMDB no Senado, Eduardo Braga (AM), pelo então vice-presidente Michel Temer (PMDB) e por Guido Mantega, o mais longevo ministro da Fazenda da história (2006-2015). Com operação em 27 países, a Odebrecht foi uma das principais beneficiadas pelo projeto, que resultou em redução de 34% para 25% da alíquota de imposto de renda a ser pago sobre lucros obtidos fora do País. A declaração dos executivos da Odebrecht sobre os R$ 100 milhões repassados ao PT com a intermediação de Mantega complementa informação prestada por Monica Moura, mulher do ex-marqueteiro petista João Santana, em tentativa de delação premiada. Ela disse ter sido orientada a procurar o então ministro da Fazenda para receber a indicação de executivos dispostos a dar contribuições em dinheiro, que não passaram por contas oficiais do PT e, por isso, não foram declaradas à Justiça Eleitoral. O que não se sabia, na época, era o motivo dos pagamentos feitos pela Odebrecht, agora revelado pelos executivos na tentativa de delação. Para enviar recursos de suas empresas a contas geridas pelo Setor de Operações Estruturadas, a Odebrecht usava diferentes mecanismos envolvendo fornecedores, que também deverão ser investigados pela Lava-Jato, se as informações forem aceitas pela força tarefa. De acordo com o relato, empresas especializadas em importação e exportação de produtos ajudavam a Odebrecht a “superfaturar” a avaliação em laudo e para fins de tributação de itens adquiridos fora do Brasil. Com isso, a empresa enviava ao Exterior mais recursos do que efetivamente pagava pelos produtos. A diferença dessa conta era transferida para offshores ligadas à empresa, geridas pelo Setor de Operações Estruturadas, de onde saiu a maior parte dos R$ 100 milhões intermediados por Mantega. Depois de apresentar por escrito os temas que estariam dispostos a detalhar à força-tarefa, os executivos passaram nos últimos dias pelos chamados “testes de sinceridade”, nos quais foram questionados sobre os documentos apresentados. Para organizar a delação, a empresa separa as menções a políticos em duas categorias: aqueles a quem a empresa considera ter pago caixa 2 para campanha e os que receberam propina referente a obras públicas. A força tarefa tem rejeitado versões em que a empresa trata pagamentos como caixa 2 — crime para o qual a legislação prevê punição mais branda. Ainda assim, o lugar de cada um nas listas da Odebrecht deixa em suspense políticos e advogados que acompanham as negociações.

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