O ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal, Fábio Cleto, afirmou em delação premiada firmada com o Ministério Público Federal que um dos donos do grupo J&F - Joesley Batista, do Friboi - deu uma casa de luxo ao doleiro Lúcio Funaro como pagamento de propina por obter benefícios no Fundo de Investimentos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FI-FGTS). Segundo Cleto, a informação foi dada para ele por Alexandre Margotto, sócio de Funaro. O doleiro foi preso em um desdobramento da Operação Lava Jato no começo deste mês. Segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que pediu a prisão, Funaro é um dos operadores do deputado federal afastado Eduardo Cunha no esquema de propina na Caixa Econômica Federal, além de ter com o parlamentar, que é réu em duas ações penais na Lava Jato, uma "longa e íntima relação". A delação de Fabio Cleto, que já foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal, baseou o pedido de prisão e pedidos de buscas que atingiram Joesley Batista e outros empresários. De acordo com a delação, o empresário Joesley Batista procurou o grupo para ampliar o percentual de endividamento da Eldorado, fábrica de celulose do grupo J&F, que já havia conseguido recursos do FI-FGTS. Para defender o interesse da Eldorado, Cleto receberia "propina extra" de R$ 1 milhão. O dinheiro, no entanto, nunca foi pago, segundo o delator. "Alexandre Margotto comentou com o depoente que Lúcio Bologna Funaro havia recebido, como parte do pagamento de propina de Joesley por esta operação, uma residência no Jardim Europa, em São Paulo; que acredita que seja a casa onde Funaro reside atualmente, mas não tem certeza; Que não tem ideia do valor, mas tem conhecimento que uma casa no Jardim Europa não vale menos de R$ 15 milhões de reais; que o depoente nunca foi nesta casa; QUE o depoente nunca chegou a cobrar de FUNARO o valor da propina extra oferecida de R$ 1.000.000,00, pois tinha certeza que seria uma cobrança infrutífera", diz trecho da delação de Fábio Cleto. No caso do endividamento da Eldorado, Cleto contou que o aumento do limite era "aceitável" porque era um endividamento temporário, mas que seria necessária "toda uma argumentação para flexibilizar" a situação. O delator contou que partiu de Alexandre Margotto "a demanda", que "é possível que Eduardo Cunha também tenha reforçado o pedido", e que ele conseguiu argumentar tecnicamente de que a alteração seria viável, obtendo sucesso. Fábio Cleto afirmou em sua delação que, nas operações envolvendo o FI-FGTS, a propina era dividida da seguinte forma: Eduardo Cunha ficava com 80%, Lúcio Funaro com 12%, Margotto e Cleto ganhavam 4% cada um. Segundo ele, o próprio Funaro, com quem havia se desentendido, prometeu o pagamento extra. O desentendimento entre os dois começou por conta de "cobranças agressivas" de Funaro, que "ameaçou colocar fogo na casa do depoente (Cleto), com os filhos dentro". Depois da briga, Fábio Cleto quase deixou o cargo, mas foi convencido a ficar por Eduardo Cunha, que passou a tratar diretamente sobre a propina na Caixa Econômica Federal. Conforme Cleto, outro pleito de Joesley na Caixa Econômica Federal foi a captação de recursos do FI-FGTS para obras de logística, saneamento e energia da fábrica. Mas como o fundo tem limite para áreas, não havia disponibilidade para se investir em energia, somente logística e saneamento, no valor de R$ 940 milhões de reais. "Que, nesta época, em 2012, o depoente já não tinha mais relacionamento com Lúcio Bologna Funaro; que Lúcio Bologna Funaro pediu apoio para a operação por meio de Eduardo Cunha e este último pediu ao depoente apoio para a operação; QUE, então, a operação foi estruturada pela Viter (vice-presidência de gestão de ativos de terceiros da Caixa Econômica Federal), levada ao Comitê de Investimentos e aprovada; que em razão do pedido de Eduardo Cunha, o depoente votou favoravelmente no Comitê de Investimentos", narrou. Na operação, Cleto relata ter recebido propina de R$ 680 mil. O dinheiro foi recebido por meio de contas na Suíça em nome da offshore Lastal e os depósitos feitos pela Carioca Engenharia - a Carioca também foi beneficiada com dinheiro do fundo nas obras do Porto Maravilha. Os donos da Carioca fecharam delação e contaram que em razão do benefício faziam pagamentos em contas indicadas por Cunha no exterior. Na delação, Fábio Cleto conta que conheceu Funaro em 2010, por meio de Alexandre Margotto. Que estreitaram uma relação pessoal em razão de trabalho conjunto com operações financeiras. Até que Funaro avisou, em 2011, que o PMDB tinha cargos no governo, entre eles um na Caixa Econômica Federal, e que pensou em indicá-lo em razão do histórico profissional - Cleto se formou em administração e trabalhou no banco Itaú. Segundo o ex-executivo da Caixa Econômica Federal, nessa época, sabia que Funaro tinha ligação com Eduardo Cunha. Fábio Cleto foi avisado que a indicação tinha contrapartida e que algumas operações aprovadas teriam pagamento de propina e que isso seria dividido. O nome dele foi levado por Eduardo Cunha ao então líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves, que repassou o nome ao governo e ele foi entrevistado para o cargo pelo então ministro da Fazenda, Guido Mantega. Segundo ele, "a conversa foi técnica". O ex-executivo também narrou que manteve relacionamento "estreito" com Funaro e que eles foram viajar juntos para o Caribe. Nesta viagem, conheceu o empresário Joesley Batista, que era amigo de Funaro. "Que esta viagem foi no segundo semestre de 2011, provavelmente mais para o final do ano; que passaram entre 4 ou 5 dias no local; que provavelmente se tratava de uma quarta feira e provavelmente emendou com o final de semana; que questionado se o depoente possui alguma foto desta viagem, respondeu que não; que questionado a razão disto, respondeu que esta era uma preocupação de Lúcio Bologna Funaro, para não ter provas de que estavam juntos e não se comprometer provavelmente; que era uma preocupação tácita de todos, inclusive do depoente, pois não ficaria “bem” um funcionário da CEF viajando com Funaro e com um empresário", relatou Cleto. Na delação, Fábio Cleto revela aos investigadores que recebeu US$ 2,1 milhões de propina de dez empresas e obras. E que sempre o dinheiro vinha de depósitos feitos pela Carioca Engenharia. "Que, conforme explicado, era mais fácil e seguro para Eduardo Cunha realizar transferências de apenas uma empresa para as contas na Suíça do depoente do que realizar transferências das dez empresas; QUE em todos os casos envolvendo tais empresas, o depoente trabalhou para a aprovação dentro da CEF, por indicação de Eduardo Cunha ou Lúcio Bologna Funaro, e após a aprovação e o desembolso da operação, foi informado ao depoente o percentual pago a título de propina, com o posterior pagamento de valores no exterior pela Carioca", contou. Segundo o ex-dirigente da Caixa, além dos depósitos, ele também recebeu R$ 520 mil em dinheiro vivo como propina, em três vezes distintas - R$ 400 mil, R$ 40 mil e R$ 80 mil. E que "todos estes valores foram entregues por Eduardo Cunha ou por pessoas por ele indicadas". Cleto narra que Cunha entregou diretamente a ele R$ 40 mil em dinheiro em 10 de agosto de 2012 no apartamento funcional do deputado, hoje afastado do mandato, e que não se lembra onde foram entregues os R$ 80 mil em 30 de julho de 2013. Os R$ 400 mil foram entregues na portaria de Fábio Cleto em uma sacola, em 28 de abril de 2014. Fábio Cleto, Lúcio Funaro, Alexandre Margotto, Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves foram denunciados por fraudes com recursos do FI-FGTS. A denúncia ainda não foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal, que cuida do caso em razão do foro privilegiado de Cunha, e isso também não tem data para ocorrer.
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