É claro que se deveria tomar a coisa como piada de mau gosto, mas é verdade. Michel Temer, vice-presidente da República, presidente do PMDB e coordenador político do governo, vai cobrar, imaginem vocês, empenho do PT — que é o partido ao qual pertence a presidente da República — no apoio ao ajuste fiscal. Nesta segunda, antes de Dilma viajar para o México, ele pretende se encontrar com ela para dizer o óbvio: se os petistas ficam sabotando as MPs no Senado, com que força ele busca o apoio dos demais parlamentares da base — sem contar que o próprio presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), não é, assim, um entusiasta do pacote, né? O vice também anda desconfiado, informa a Folha, de que a resistência não se restrinja ao PT e contamine áreas do governo. A presidente, é bem verdade, tem mostrado seu empenho no pacote, mas sabe que, entre outros, Lula, na prática, trabalha contra, embora finja que não. Se o chefão petista mandar, a CUT se desmobiliza, mas ele não vai fazer isso. Da mesma sorte, a direção do partido não move uma palha para conter os rebeldes. Aí as coisas realmente ficam difíceis. Na sexta, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, arrumou a mais eloquente e silenciosa de todas as gripes. Aos poucos, ele vê o seu plano de austeridade ser descaracterizado, e mais sobressaem os esforços do governo de aumentar impostos do que de cortar gastos. Mesmo com o facão anunciado de R$ 69,9 bilhões no Orçamento de 2015, prevê-se gastar neste ano mais do que no ano passado — isso para uma economia que terá uma recessão, segundo a estimativa oficial, de 1,2%. É evidente que, com a ausência, Levy quis deixar claro que não precisa do governo para sobreviver. Não é um político da base. Já o governo, tudo indica, depende dele para não experimentar uma turbulência de consequências incertas. Dilma, ademais, pressionada por Lula, faz a coisa errada. Na sexta, ela se reuniu com o antecessor. Os dois falaram sobre eventuais concessões ao petismo. Ora, por que o coordenador político não estava numa reunião como essa? Quer dizer que Temer negocia o apoio às MPs como elas estão, e Dilma negocia mudanças com Lula, que o vice ignora? Aí é sacanagem, né? Por que isso acontece? Porque o governo Dilma, a rigor, não existe. É uma peça de ficção. Ela se elegeu com um discurso, governa com outro; conquistou o segundo mandato com uma penca de promessas; não poderá cumprir nenhuma delas; franjas do petismo que apoiam a sua gestão e lhe dão alguma sustentação popular, bem pequena, não podem defender o ajuste porque vai contra suas bandeiras — é o caso da CUT, por exemplo, que, há pouco de mais de um mês, marchou contra o que chamou de “golpismo” e em apoio à presidente e, agora, lota as galerias do Congresso contra as Medidas Provisórias. O governo Dilma é, em suma, uma equação que, depois do sinal de igual, tem um enorme conjunto vazio. É um troço sem conteúdo e sem identidade. Nem pode falar em nome de uma austeridade que combata os desmandos de antes — porque, afinal, não é um governo de oposição àquele de antes — nem pode fazer a defesa da continuidade porque continuidade não há. Então se tem esse enorme nada! É por isso que Dilma se sente mais à vontade falando sandices sobre as civilizações pré-colombianas em entrevista a um jornalista do México… O Brasil é coisa complicada demais pra ela, coitada! Por Reinaldo Azevedo
Nenhum comentário:
Postar um comentário