O senador Zezé Perrella (PDT-MG), cuja família é dona de um helicóptero que foi flagrado com quase meia tonelada de cocaína, discursou nesta terça no Senado. Ele se disse “vítima de injustiça”. Qual “injustiça”? Até agora, que eu saiba, ele e o filho, o deputado estadual Gustavo Perrella (SDD-MG), estão sendo considerados apenas testemunhas. Gustavo, a irmã e um primo são os donos da empresa proprietária do aparelho. A questão da cocaína é gravíssima, sim! Estupidamente grave. Mas o que há de mais ameno nessa história já é uma vergonha. Deveria bastar para que pai e filho pegassem o boné e fossem pra casa. Já que ele diz que a família na precisa da política, parece-me evidente que a política não precisa deles. O piloto que foi preso transportando a cocaína era “assessor parlamentar” do Perrelinha na Assembleia de Minas. Tenham paciência! O custo do combustível da aeronave era fraternalmente divido entre pai e filho — ou melhor, entre a Assembleia Legislativa de Minas e o Senado; nós pagávamos, em suma, para que os Perrellas (ou quem mais entrasse naquele helicóptero) saíssem voando por aí. O aparelho estava especialmente adaptado para carregar pequenas cargas. Suponho que não fosse para levar soja, boi ou fertilizantes. Os Perrellas não precisam da política? Então a política não precisa dos Perrellas.
Afirmou o senador:
“Meu filho usou o ano inteiro R$ 14 mil com o abastecimento de aeronave. Poderia usar R$ 20 mil por mês. Se está errado, que se mude o regimento. Quando eu vejo tudo isso, dá vontade de largar a política. É muito fácil jogar pedra. Nunca precisamos disso, de R$ 14 mil por mês”.
“Meu filho usou o ano inteiro R$ 14 mil com o abastecimento de aeronave. Poderia usar R$ 20 mil por mês. Se está errado, que se mude o regimento. Quando eu vejo tudo isso, dá vontade de largar a política. É muito fácil jogar pedra. Nunca precisamos disso, de R$ 14 mil por mês”.
Pois que se faça a sua vontade, senador! Não hesite! Pule fora! A política é mesmo um lugar cruel demais para almas sensíveis e probas.
Cocaína
O piloto, “funcionário” da Assembleia, avisou o patrão, o Perrellinha, que iria fazer um “bico”, um frete. O chefe disse “ok”. Não deveria ter dito. Como deixou claro a Anac, isso é ilegal. Aeronaves privadas, de pessoas ou empresas (como é o caso), não podem ter fins comerciais. É espantoso que os Perrellas não soubessem disso. Quanto ao resto da história, a mirabolância não bate com os fatos e com a matemática. Na segunda, escrevi aqui um post, felizmente endossado por especialistas demonstrando por que a história contada pelo piloto à Polícia Federal tem cara de ser mais falsa do que talco Pom Pom disfarçado de cocaína. Reproduzo trecho (para quem não leu). Volto depois. Percebam que eu não entendo nada de helicóptero, mas sei fazer conta (em azul)
O piloto, “funcionário” da Assembleia, avisou o patrão, o Perrellinha, que iria fazer um “bico”, um frete. O chefe disse “ok”. Não deveria ter dito. Como deixou claro a Anac, isso é ilegal. Aeronaves privadas, de pessoas ou empresas (como é o caso), não podem ter fins comerciais. É espantoso que os Perrellas não soubessem disso. Quanto ao resto da história, a mirabolância não bate com os fatos e com a matemática. Na segunda, escrevi aqui um post, felizmente endossado por especialistas demonstrando por que a história contada pelo piloto à Polícia Federal tem cara de ser mais falsa do que talco Pom Pom disfarçado de cocaína. Reproduzo trecho (para quem não leu). Volto depois. Percebam que eu não entendo nada de helicóptero, mas sei fazer conta (em azul)
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... O helicóptero da Família Perrella é um Robinson 66 (R-66). Não que eu esteja a fim de comprar um, mas fiz a lição de casa para vocês. É dos mais baratinhos. Por US$ 970 mil, vocês podem comprar um. Quem entende da área diz ser uma aeronave ideal para transportar pequenas cargas. Entendo. Em seu depoimento, o piloto afirmou que o aparelho já saiu de Avaré, em São Paulo, carregando a droga. Fez uma viagem relativamente curta até o Campo de Marte. Dali seguiu para Divinópolis, em Minas Gerais, região onde fica a sede da empresa dos Perrella. Da cidade mineira, rumou para a fazenda no Espírito Santo, onde foi surpreendido pela Polícia Federal.
... O helicóptero da Família Perrella é um Robinson 66 (R-66). Não que eu esteja a fim de comprar um, mas fiz a lição de casa para vocês. É dos mais baratinhos. Por US$ 970 mil, vocês podem comprar um. Quem entende da área diz ser uma aeronave ideal para transportar pequenas cargas. Entendo. Em seu depoimento, o piloto afirmou que o aparelho já saiu de Avaré, em São Paulo, carregando a droga. Fez uma viagem relativamente curta até o Campo de Marte. Dali seguiu para Divinópolis, em Minas Gerais, região onde fica a sede da empresa dos Perrella. Da cidade mineira, rumou para a fazenda no Espírito Santo, onde foi surpreendido pela Polícia Federal.
O peso máximo para um R-66 sair do chão é 1.225 quilos — ocorre que só a aeronave pesa 581 quilos. Sobram 644. Desse total, devem-se descontar 224 kg do combustível. Sobraram 420. Notem: só a carga de cocaína (445 kg) já ultrapassou esse limite. Há ainda os dois pilotos — calculemos 140 quilos. A conta não fecha. Restaria uma possibilidade: o helicóptero não estar com a carga completa de combustível. Quanto teria de ser? Vamos pensar:
peso da aeronave – 581 kg
peso dos pilotos – 140 kg
peso da cocaína – 445 kg
soma – 1.166
peso da aeronave – 581 kg
peso dos pilotos – 140 kg
peso da cocaína – 445 kg
soma – 1.166
Sobraram apenas 59 quilos para o combustível. Com 224 kg, segundo pesquisei, a autonomia do R-66 é de três horas, voando a 220 km/h. Assim, pode-se percorrer, chegando ao limite da pane seca (os prudentes não ousam tanto) 666 km. Huuummm… Regra de três: se, com 225 kg de combustível, pode-se voar 660 km, com 59 kg, voa-se, no máximo, 173,8 km. Pois é… Vejam lá a rota do helicóptero. Entre Avaré e o Campo de Marte (também fui pesquisar), em linha reta, já são 265,8 km. Entre o Campo de Marte e Divinópolis, há 513 km — chega-se bem perto da autonomia do aparelho se tivesse saído com o tanque cheio. De Divinópolis até a fazenda no Espírito Santo, sempre em linha reta, há 393 km. Nada nessa conta fecha. A minha hipótese é que o piloto pode não estar contando toda a verdade. O mais provável é que esse aparelho tenha sido abastecido em vários pontos ao longo da trajetória. E intuo que a droga entrou no helicóptero foi em Divinópolis mesmo, não em Avaré.
Encerro
Paulinho da Força, presidente do Solidariedade, se negou a afastar Gustavo Perrella do partido. Em nota, disse que que evitar prejulgamento e coisa e tal. Pois é… Num país normal, o uso de dinheiro público para abastecer o helicóptero que pertence a uma empresa e a contratação de um piloto como assessor parlamentar já liquidariam uma carreira política — especialmente quando o tal helicóptero é adaptado para carregar cargas, como é o dos Perrella. A propósito: qual é a carga habitual? Essa história não fecha, quer nos seus aspectos, digamos, narrativos, quer na matemática.
Paulinho da Força, presidente do Solidariedade, se negou a afastar Gustavo Perrella do partido. Em nota, disse que que evitar prejulgamento e coisa e tal. Pois é… Num país normal, o uso de dinheiro público para abastecer o helicóptero que pertence a uma empresa e a contratação de um piloto como assessor parlamentar já liquidariam uma carreira política — especialmente quando o tal helicóptero é adaptado para carregar cargas, como é o dos Perrella. A propósito: qual é a carga habitual? Essa história não fecha, quer nos seus aspectos, digamos, narrativos, quer na matemática.
Retomo
Isso incrimina os Perrellas? Não. Mas o conjunto dos dados evidencia que, até agora, muito pouco se sabe sobre o que realmente aconteceu. Por mim, o senador cumpriria a sua vontade e deixaria esse negócio de política pra lá. Chega de tanto mártir na política, né, Senhor Perrella!? Por Reinaldo Azevedo
Isso incrimina os Perrellas? Não. Mas o conjunto dos dados evidencia que, até agora, muito pouco se sabe sobre o que realmente aconteceu. Por mim, o senador cumpriria a sua vontade e deixaria esse negócio de política pra lá. Chega de tanto mártir na política, né, Senhor Perrella!? Por Reinaldo Azevedo
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