A juíza Simone Barbisan Fortes, responsável pela condução do processo criminal nº 2007.71.02.007872-8/RS, que tramita na 3ª Vara Federal Criminal, em Santa Maria, está voando na condução da ação, desde que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região aprovou o seu pedido de remoção para Florianópolis, com a condição de que ela só faça a mudança após a conclusão do feito. Após ter rejeitado todas as dezenas de pedidos de diligências apresentados pelas defesas dos réus, e ordenado que passasse a correr o prazo de 20 dias para que as partes apresentem suas alegações finais, antes da sentença, ela agora rejeitou um lote de embargos apresentados por alguns dos réus: embargos de declaração e pedido de reconsideração de José Antônio Fernandes, Lenir Beatriz da Luz Fernandes, Ferdinando Francisco Fernandes e Fernando Fernandes; embargos de declaração de Rubem Hoher; manifestação da defesa de Carlos Dahlem da Rosa; pedido de reconsideração de Paulo Jorge Sarkis. Ela publicou sua decisão às 13h10m da última quinta-feira, dia 17 de janeiro de 2012. As defesas dos réus estão convencidas de que a juíza Simone Barbisan Fortes já tem a sentença pronta, e que está acelerando o trâmite do processo, em velocidade supersônica, para poder se mudar de vez para Florianópolis. Esse é um grande desejo da juíza, que já vinha apresentando o pedido de remoção há vários anos. Leia abaixo o inteiro teor da juíza, que irá ensejar novos recursos dos advogados.
AÇÃO PENAL Nº 2007.71.02.007872-8/RS
AUTOR
JUSTIÇA PÚBLICA
Réu
PAULO JORGE SARKIS e outros.
ADVOGADO
FABIO AGNE FAYET
DECISÃO
Vistos, etc.
Proferida a decisão que rechaçou os requerimentos de diligências finais e determinou a abertura do prazo para apresentação de memoriais, vieram aos autos embargos declaratórios, os quais serão examinados na sequência, pela ordem em que recebidos pela Secretaria.
1. Embargos de declaração e pedido de reconsideração de José Antônio Fernandes, Lenir Beatriz da Luz Fernandes, Ferdinando Francisco Fernandes e Fernando Fernandes.
Sustentam, em suma, que haveria contradição na decisão, já que "os pedidos ministeriais, os mais variados, foram sendo deferidos, sem que fosse necessário um aprofundamento na pertinência em cada diligência". A contradição tornar-se-ia mais evidente se observada a decisão posterior, disponibilizada em 10 de janeiro, "em que prorroga um prazo legal, para que o Ministério Público convenientemente possa apresentar seus memoriais, não nos 15 dias previstos em lei, mas em 20 dias". Haveria, ainda, contradição porque, de um lado, afirmou que algumas diligências deveriam ter sido requeridas durante a instrução e, de outro, permitiu que o MPF levasse adiante investigação paralela, sobre os mesmos fatos, contra réus diversos, denunciados em 2012, "sem obrigar o órgão acusatório a obedecer as regras processuais com relação ao aditamento da denúncia". Pede, então, o acolhimento dos aclaratórios, para o fim de deferir as diligências requeridas. Em caso de não provimento, postula "seja reconsiderada a decisão a partir da explicitação minudente sobre a pertinência de cada diligência".
1.1. Não cabimento do recurso
As contradições apontadas pela defesa teriam ocorrido entre decisões, e não na estrutura da decisão embargada, o que, por si só, afasta o cabimento do recurso. Veja-se, nesse sentido, aresto do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL - CONTRADIÇÃO - INOCORRÊNCIA - OFENSA À COISA JULGADA - REEXAME DE FATOS E PROVAS. 1. A contradição que autoriza o manejo dos embargos de declaração é a contradição interna, verificada entre os elementos que compõem a estrutura da decisão judicial e não entre duas decisões distintas. (...)
(AGA 201000559841, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:18/06/2010.)
Não obstante, buscando oferecer uma resposta judicial efetiva aos embargos, serão registrados na sequência alguns esclarecimentos.
1.2. Exame do mérito dos embargos declaratórios
a) Conduta do Juízo frente aos pedidos formulados pelas partes: contrariamente ao alegado pelos embargantes, inexistiu, durante o processamento da demanda penal, acolhimento dos "mais variados pedidos ministeriais" e, ao mesmo tempo, negativa aos pleitos formulados pela defesa.
Diversos requerimentos originados da defesa foram deferidos durante a instrução do feito. Apenas para exemplificar, mencione-se que o contraditório não se encerrou ao final dos interrogatórios (dezembro de 2011) tão só em razão de várias postulações defensivas, atendidas pelo Juízo. É dizer: o processo tramitou durante 1 (um) ano somente por conta de pedidos deduzidos pelas defesas, acolhidos judicialmente.
De outro lado, em relação aos pedidos formulados pelo MPF durante a instrução, embora os embargantes tenham apenas referido que seriam "os mais variados", "pedidos vários", sem ter apresentado um exemplo sequer, percorrendo os autos em análise não exaustiva, constatei apenas 2 (dois) deferimentos de diligências requeridas pelo parquet: um no início da ação penal (informações sobre financiamento de imóvel de um dos corréus, decisão de 26/05/2008, GED3488186) e outro ao final do contraditório, solicitando a juntada dos processos administrativos disciplinares de dois corréus, que tramitaram na Procuradoria Geral do Estado. No último caso, mencionou-se, no despacho de deferimento, que os documentos poderiam ter sido requisitados diretamente pelo órgão, mas, por economia processual, e considerando que o Estado do Rio Grande do Sul integra o polo ativo, determinou-se ao último a juntada da documentação (decisão de 08/02/2012, GED 7665703). Vale dizer, justificou-se a excepcionalidade do acolhimento do pleito ministerial.
b) Deferimento do pedido de dilação de prazo: o prazo para apresentação de memoriais inicialmente concedido às partes, de 15 dias, não constitui prazo legal (conforme o CPP, o prazo para tal ato seria de 5 dias). Cuida-se, em verdade, de um prazo judicialmente assinalado, tendo como fundamento a dimensão do processo, cuja análise demanda lapsos maiores daqueles usualmente adotados. Portanto, a dilação do lapso temporal de 15 para 20 dias não configura qualquer descumprimento da lei, como quer afirmar a defesa. Ademais, embora o requerimento de elastecimento do prazo tenha sido deduzido pela acusação, os efeitos do deferimento estenderam-se, obviamente, também às defesas, beneficiando-as, já que, assim como a acusação, terão 20 dias para juntar suas razões finais.
c) Observância do momento processual adequado: a defesa assevera que, para este Juízo, apenas as defesas devem obedecer a momentos processuais, não tratando o MPF do mesmo modo, tanto que o órgão teria ofertado diversas denúncias no correr de 2012 sobre os mesmos fatos em apuração nesta ação penal, sem aditar a denúncia.
Uma vez mais repito que, consoante jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, o princípio da indivisibilidade não se aplica à ação penal pública. De fato, a legislação não prevê momento e forma para a denúncia de coautores não incluídos inicialmente no polo ativo da ação penal. O Ministério Público, na condição de dominus litis, é quem faz a escolha do momento para denunciá-los e o formato em que pretende fazê-lo, se em aditamento à denúncia já existente ou em nova ação penal. Não pode haver interferência do Poder Judiciário nessa questão. Vejam-se, a título ilustrativo, as seguintes ementas:
EMENTA: (...) CAPÍTULO VI DA DENÚNCIA. FORMAÇÃO DE "QUADRILHAS AUTÔNOMAS". EXISTÊNCIA DE MERO CONCURSO DE AGENTES. TESE INSUBSISTENTE. CONFORMAÇÃO TÍPICA DOS FATOS NARRADOS AO ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL. ASSOCIAÇÃO ESTÁVEL FORMADA, EM TESE, PARA O FIM DE COMETER VÁRIOS CRIMES DE LAVAGEM DE DINHEIRO E CORRUPÇÃO PASSIVA, AO LONGO DO TEMPO. DELAÇÃO PREMIADA. AUSÊNCIA DE DENÚNCIA CONTRA DOIS ENVOLVIDOS. PRINCÍPIO DA INDIVISIVILIDADE. AÇÃO PENAL PÚBLICA. INAPLICABILIDADE. MÍNIMO DE QUATRO AGENTES. NARRATIVA FÁTICA. TIPICIDADE EM TESE CONFIGURADA. EXISTENTES INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. DENÚNCIA RECEBIDA. (...) 2. Também não procede a alegação de que a ausência de acusação contra dois supostos envolvidos - beneficiados por acordo de delação premiada - conduziria à rejeição da denúncia, por violação ao princípio da indivisibilidade da ação penal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido da inaplicabilidade de tal princípio à ação penal pública, o que, aliás, se depreende da própria leitura do artigo 48 do Código de Processo Penal. Precedentes. (...)
(STF, Inquérito 2245/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em 28/08/2007)
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. RECORRENTE DENUNCIADO POR APROPRIAÇÃO INDÉBITA E ESTELIONATO (ARTS. 168 E 171 DO CPB). EXCLUSÃO DE CORRÉUS DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA INDIVISIBILIDADE E OBRIGATORIEDADE DA AÇÃO PENAL. PRECEDENTES DO STJ. PARECER DO MPF PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. 1. Por se tratar de ação pública incondicionada, o fato de, eventualmente, existirem outros agentes não denunciados, que teriam participado dos crimes em questão, não induz à anulação do processo já instaurado, porquanto os princípios da indivisibilidade e da obrigatoriedade da ação penal não obstam o ajuizamento, em separado, de outra ação pelo Ministério Público, ou mesmo o aditamento da denúncia, em momento oportuno, depois de coligidos elementos suficientes para embasar a acusação. A nulidade pretendida só teria lugar se fosse o caso de ação penal privada, nos termos do art. 48 do Código de Processo Penal. Precedentes do STJ e do STF (HC 59.302/PE, Rel(a). Min(a). LAURITA VAZ, DJU 07.02.08). 2. Parecer do MPF pelo desprovimento do recurso. 3. Recurso Ordinário desprovido.(RHC 200701413707, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:07/06/2010.)
De outro norte, o Código de Processo Penal prevê de modo expresso que, na fase das diligências finais, apenas poderão ser pleiteadas medidas "cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução". Vale dizer, a própria legislação restringe os pedidos que podem ser formulados na etapa do art. 402 do CPP, excluindo aqueles cuja necessidade não surgiu de fatos ou circunstâncias esclarecidas durante a fase instrutória.
A decisão embargada, por conseguinte, ao indeferir os pedidos formulados pelas defesas ao fundamento de que feitos em momento processual inoportuno, apenas aplicou o que expressamente prevê o Código de Processo Penal.
Afasta-se, com base nesses fundamentos, a alegação formulada em embargos de declaração, no sentido de que o Juízo estaria tratando as partes de forma não isonômica.
1.3. Pedido de reconsideração
Melhor sorte não assiste ao pedido de reconsideração.
De início, vale lembrar que o prazo do art. 402 do CPP é peremptório (art. 798 do CPP), de modo que já precluiu o direto da defesa de justificar as diligências requeridas. A pertinência de cada medida intentada deveria ter sido apresentada no prazo do art. 402 do CPP, mas não o foi, de modo que as justificativas ora anexadas são intempestivas, rechaçando a necessidade de apreciação judicial.
Contudo, sempre buscando conferir uma resposta judicial efetiva, teço os argumentos que seguem.
Mencionou-se explicitamente, no exame judicial de quase todos os 54 requerimentos de diligências formulados pela defesa embargante, que o indeferimento fundamentava-se, além de outros motivos (dentre os quais, a falta de indicação da pertinência), na intempestividade. Não foi feita tal menção somente na análise dos requerimentos de n.s 15, 22, 25, 27, 28, 49. Todavia, no início da decisão atacada, restou claro que eventuais diligências postuladas nesta etapa, que poderiam ter sido requeridas no curso do processo, não seriam deferidas, a teor da norma vazada no art. 402 do Código de Processo Penal. E, assim como sucedeu com as outras medidas pleiteadas pela defesa embargante, também aquelas de n.s 15, 22, 25 e 27 são nitidamente extemporâneas. Quanto a esses requerimentos, portanto, assinalo que o indeferimento pauta-se também na intempestividade, de modo que a indicação da pertinência não permite alterar a decisão denegatória.
A diligência de n. 28, a seu turno, não foi indeferida apenas por conta da ausência de pertinência, mas também porque "se o software ainda está em desenvolvimento, não pode guardar relação direta com as imputações iniciais", ou seja, não pode oferecer contraprova aos fatos narrados na inicial acusatória. Assim sendo, o apontamento da pertinência não autoriza, por si só, o acolhimento da medida postulada. Neste ponto, importa relembrar que o controle da admissibilidade das diligências pleiteadas pelas partes na fase do art. 402 do CPP inclui-se no âmbito de discricionariedade do Magistrado condutor do feito, como bem explicado nas ementas seguintes, respectivamente do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, que utilizo como razão de decidir:
RECURSO EM HABEAS CORPUS. ROUBO QUALIFICADO. PROCESSO PENAL. ARGÜIÇÃO DE DEFICIÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA NA FASE DE
ALEGAÇÕES FINAIS. DESÍDIA DO ADVOGADO CONSTITUÍDO. RÉU FORAGIDO. NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVO PARA A PRÁTICA DO ATO. NÃO APRECIAÇÃO DAS RAZÕES FINAIS OFERTADAS, FORA DO PRAZO, POR PATRONO CONSTITUÍDO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA ASSEGURADOS. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 523 DO STF. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE REINQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. IMPROCEDÊNCIA. NULIDADE DA AUDIÊNCIA DE OITIVA DE TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO
(...)
3. O deferimento de diligências na fase do artigo 499 do Código de Processo Penal está condicionado à avaliação de sua conveniência, cabendo ao julgador aferir, em cada caso concreto, dentro da esfera de discricionariedade, a real necessidade de sua realização para a formação de sua convicção, não consubstanciando cerceamento de defesa o seu indeferimento, nulidade, ademais, se ocorrente, também de caráter relativo, que deve ser argüida "opportuno tempore", sob pena de preclusão.
4. No que diz respeito à nulidade decorrente da realização de audiência de inquirição das testemunhas de acusação sem que fosse "assegurada ao paciente a presença, ainda que irregular, de seu defensor constituído nos autos", trata-se de matéria que não foi examinada pelo Tribunal de origem, não podendo esta Corte enfrentá-la, sob pena de supressão de instância.
5. Recurso de habeas corpus conhecido em parte, mas desprovido.
(RHC 12.690/PR, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 06/04/2006, DJ 26/02/2007, p. 640) (sem grifo no original)
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIA. ANTIGA REDAÇÃO DO ARTIGO 499 DO CÓDIGO DE PROCESO PENAL. AGORA ARTIGO 402 DO MESMO DIPLOMA PROCESSUAL. VIOLAÇÃO À AMPLA DEFESA. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA. I - O deferimento de provas submete-se ao prudente arbítrio do magistrado, cuja decisão, sempre fundamentada, há de levar em conta o conjunto probatório já existente. II - É lícito ao juiz indeferir diligências que reputar impertinentes, desnecessárias ou protelatórias (art. 400, § 1º, do CPP, incluído pela Lei 11.719/2008). III - Indeferimento devidamente fundamentado. IV - Inocorrência de afronta aos princípios da ampla defesa e do contraditório ou às regras do sistema acusatório. V - Ordem denegada. (HC 102719, RICARDO LEWANDOWSKI, STF)
Por fim, a diligência de n. 49, desacolhida inicialmente por ausência de justificativa, também merece ser indeferida porque, sendo o Ministério Público de Contas órgão integrante da estrutura estatal, os documentos podem ser providenciados diretamente pelos interessados, fazendo uso do direto de petição, consoante fundamentação expendida na decisão atacada, no item IV, parte final do subitem "35", de modo que a indicação da pertinência também não permite modificar a denegação do pedido. Em respaldo ao indeferimento, transcrevo aresto do e. Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PENAL. OMISSÃO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ART. 168-A DO CP. RAZÕES RECURSAIS. INTEMPESTIVIDADE. MERA IRREGULARIDADE. NULIDADE DA SENTENÇA. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. APLICAÇÃO DO ART. 71 DO CP. JULGAMENTO ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. DIFICULDADES FINANCEIRAS. EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE. PROVA INSUFICIENTE. PENA DE MULTA. 1. A intempestividade das razões recursais da defesa constituem-se em mera irregularidade que não obsta o exame da matéria nelas suscitadas. 2. O indeferimento motivado de diligência na fase do art. 499 do CPP, mormente se considerado que poderia perfeitamente ser cumprida pela parte, não acarreta cerceamento de defesa. (...) (ACR 200272080019459, TADAAQUI HIROSE, TRF4 - SÉTIMA TURMA, DJ 29/06/2005 PÁGINA: 826.)
2. Embargos de declaração de Rubem Hoher
Argumenta a defesa que o interrogatório de Lair Ferst é misto: meio de defesa para ele e meio de prova para os demais, "pois é notório que realizou delação premiada". Assevera que, mesmo que o interrogatório do corréu fosse considerado apenas meio de defesa, "seria apenas para o próprio juízo", "sendo certo que o processo não se esgota no primeiro grau". Por esses motivos, seria ambígua a decisão atacada. Repisa, na sequência, a importância do deferimento das diligências pretendidas, a fim de comprovar que são inverídicas as declarações de Lair Ferst relativamente ao corréu Rubem Höher.
Para além disso, estaria havendo tratamento diferenciado entre as partes, com deferimento dos pedidos da acusação e denegação dos pleitos defensivos, o que tornaria a decisão contraditória. Também denotaria a incoerência do ato judicial embargado "o modo como sempre a magistrada pautou o processo até então", não havendo, no entender do embargante, razão plausível para indeferir o pedido do embargante, "a não ser o prazo fatal da prorrogação da jurisdição, fato notório publicado nos jornais de ontem e hoje".
Ao final, pede seja reconhecida a ambiguidade e a contradição aventadas, conferindo-se efeitos infringentes aos embargos, "interrompendo o prazo para outras manifestações e eventuais recursos" e determinando-se a realização das diligências postuladas pelo embargante.
Ao exame das teses.
Em relação ao argumento de ambiguidade, reporto-me ao que já explicado na decisão embargada, e acima repetido: é ato discricionário do Juiz da causa (sem necessidade de considerar eventual entendimento diverso de tribunal superior) avaliar a pertinência, utilidade e relevância da prova proposta na fase do art. 402 do CPP. Nessa linha de raciocínio, repito que, entendendo o interrogatório apenas como meio de defesa, não me parece útil ou relevante construir prova do que fora apenas declarado por corréu em interrogatório. Diferente seria se houvesse, além da declaração do denunciado, elementos confirmando o que fora dito. Apenas nesta hipótese o interrogatório poderia servir para auxiliar na prova. Porém, não é o que acontece no caso concreto, em que não há mínimo indício confirmando as afirmações de Lair Ferst tangente a eventual saque bancário efetuado pelo embargante.
No atinente à contradição aventada, esclareço o seguinte:
(a) a questão do alegado tratamento desigual entre as partes já foi analisada, pelo que faço remissão aos itens "1.1" e "1.2" supra;
(b) o pedido formulado pelo MPF de intimação das instituições bancárias foi juntado aos autos do PCD n. 2007.71.02.004243-6, acessível em Secretaria a quaisquer corréus. Todavia, como o pedido guarda relação com o trâmite desta ação penal, determinou-se, na decisão que indeferiu o requerimento ministerial (disponível para consulta no portal do TRF4), a intimação das demais partes, no que providenciará a Secretaria. Cabe destacar que o pleito efetuado pela acusação foi rejeitado, afastando-se, também por este motivo, a alegação de tratamento diferenciado entre as partes;
(c) os indeferimentos dos pleitos apresentados na fase do art. 402 do CPP pautaram-se exclusivamente na legislação aplicável e na remansosa jurisprudência dos tribunais superiores, não tendo qualquer vínculo com a remoção/extensão de jurisdição desta Magistrada. O Estado-Juiz, é sabido, não está autorizado a decidir em desacordo com a lei. Se a norma prevista no Código de Processo Penal restringe as hipóteses de deferimento de medidas complementares eventualmente requeridas pelas partes, cabe ao Magistrado atender à disposição legal, não lhe sendo facultado ampliar, a seu livre arbítrio, a previsão legal.
Com base nos fundamentos acima declinados, indefiro os embargos declaratórios opostos por Rubem Höher. Saliente-se que, como a decisão denegatória dos pedidos de providências complementares (art. 402 do CPP) não está sujeita a recurso, nenhum prazo interrompeu-se com a interposição dos embargos de declaração em apreço. Da mesma forma, a marcha processual não restou paralisada em razão dos aclaratórios, pois a oposição do referido recurso não suspende a eficácia da decisão embargada, cuja executividade é imediata. Esse foi o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal em Questão de Ordem suscitada na recém julgada Ação Penal n. 470, verbis:
EMENTA: (...) INÍCIO DA INSTRUÇÃO SEM JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE EFEITO SUSPENSIVO DO RECURSO. (...) 6. Não é necessário o julgamento dos embargos de declaração para dar início à instrução do processo ou à oitiva das testemunhas arroladas pelas partes, dada a ausência de efeito suspensivo do recurso em questão. 7. A alegada demora na publicação do acórdão proferido nos embargos de declaração não causou prejuízo à defesa, sendo relevante assinalar que o referido acórdão já foi publicado. 8. Não há qualquer dissintonia entre os atos praticados nesta ação penal e suas respectivas publicações para efeito de intimação. Eventual demora é a natural do procedimento de publicação, não havendo, contudo, qualquer ato ou procedimento sigiloso. (...) (AP-QO5 470, JOAQUIM BARBOSA, STF) (sem grifo no original)
3. Manifestação da defesa de Carlos Dahlem da Rosa
A defesa alega, em síntese, que, quando protocolada a petição sub examine, ainda estava em curso o prazo para requerer diligências finais, em razão de embargos de declaração anteriormente opostos, e rejeitados em decisão publicada na data de 13/12/2012. Dessa forma, conclui que o prazo estipulado na decisão embargada, de 10 dias, teria sido interrompido, recomeçando a contar a partir da publicação da decisão que admitiu e rejeitou referidos aclaratórios. Por entender tempestivo, apresenta requerimento de diligências finais, na forma do art. 402 do CPP.
Reportando-me à fundamentação expendida ao final do item "2" supra, registro que o prazo para a defesa peticionante requerer diligências finais (art. 402 do CPP) não foi suspenso com a oposição dos embargos declaratórios, de modo que as providências finais agora postuladas foram apresentadas intempestivamente, prejudicando seu exame.
Importa destacar, outrossim, que os julgados colacionados na manifestação defensiva em apreço referem-se à interrupção do prazo para a interposição de outros recursos, e não à suspensão da eficácia da decisão embargada, de modo que, no caso concreto, a oposição de embargos de declaração por Carlos Dahlem da Rosa, em 29/11/2012, não retirou das partes, inclusive do corréu embargante, a obrigatoriamente de cumprimento imediato das determinações judiciais constantes da decisão atacada.
Por fim, quanto à incompletude da versão digital do processo, localizada ao final do volume n. 153, resta prejudicado o pedido, porquanto já disponibilizada mídia às partes, com correção da falha, conforme decisão publicada em 09/01/2012 (GED 9094770).
4. Pedido de reconsideração de Paulo Jorge Sarkis
A defesa pugna pela reconsideração da decisão que indeferiu as diligências pleiteadas na fase do art. 402 do CPP. O pedido será apreciado em tópicos, de acordo com a diligência a que se refere.
4.1. Lavratura de certidão: a certidão teria o condão de demonstrar que não há registros de relação entre o corréu Paulo e a empresa Pensant. Seria impossível a defesa técnica fazer o link entre os dados constantes da mídia e os fatos que pretende provar, pois "não tem conhecimento do teor das mídias indigitadas". Assevera que as mídias vieram aos autos ao longo da instrução "e não poderiam ter sido objeto de requerimento anterior, haja vista, inclusive, que o Rito processual em destaque permite à Defesa formular seus requerimentos ao final de toda a dedução acusatória".
Consoante informação que aportou aos autos durante a instrução, os equipamentos de informática apreendidos na fase de investigação foram integralmente espelhados pela Polícia Federal. Esclareceu o Delgado de Polícia Federal responsável pela condução do inquérito que "da cópia espelhada, são efetuados filtros, isto é, mídias óticas que compilam, unicamente, os arquivos de dados do computador apreendido (retirando, áudios, jogos, aplicativos, programas operacionais e outros elementos que pesam e não são úteis ao labor investigatório). Essas mídias óticas filtradas não podem ser modificadas, pelo uso do "rash", que é um código certificador que imutabiliza o conteúdo e pode ser auditado" (fls. 25.596/26.598).
A partir das mídias digitais e laudos periciais remetidos pela Polícia Federal, anexou-se aos autos um CD, gravado pelo Operador de Informática desta Subseção, contendo apenas os arquivos citados pela Polícia como elementos de prova, bem como os relatórios escritos (decisão de 14/08/2009, fls. 24.886/24.887, v. 95, GED 5031799). O que foi juntado aos autos, por óbvio, poderá ser utilizado como elemento de prova por ambas as partes. Entretanto, se a defesa pretendia utilizar, para comprovar sua tese, também dados não acostados ao processo, constantes dos equipamentos apreendidos, deveria ter solicitado o espelhamento completo da mídia respectiva tão-logo carreado o exame pericial pela Polícia Federal, o que feito ainda em 2009 (fl. 24.888 e seguintes, v. 95).
Portanto, exsuge mais uma vez a questão da extemporaneidade: a medida em questão poderia ter sido requerida desde agosto de 2009. Não obstante, optou a defesa por postular apenas neste momento processual, inviabilizando seu deferimento. Oportuno repetir que apenas diligências até então indisponíveis, ou seja, que não poderiam ter sido requeridas em momento anterior, são passíveis de apresentação na fase do art. 402 do CPP. Nessa perspectiva, Nestor Távora e Romar Rodrigues Alencar, ao comentar o art. 402 do CPP:
Deve-se ter em mente que esta etapa da audiência é verdadeiramente complementar, viabilizando-se o pleito de diligências de caráter probatório, até então não cogitadas pelas partes, e que vão se destinar ao esclarecimento da verdade, já que tais circunstâncias afloram do manancial probatório que acaba de ser produzido. Se a diligência já poderia ter sido requerida, e não foi por displicência da parte, não deve ser deferida. (Curso de Direito Processual Penal, Ed. Juspodivm, 7º ed., 2012, p.785)
4.2. Intimação do MPF para apresentar documentos: a documentação pretendida teria "o condão de demonstrar ponto estratégico do trabalho final" a ser apresentado em Juízo, cujo conteúdo, a teor do art. 402 do CPP, não precisa ser explicitado. Os documentos comprovariam fato conhecido apenas depois da resposta à acusação. Aduz que, "fosse requerida em momento anterior, esta prova poderia colocar em risco toda a estratégia da defesa a ser esgrimida nos próximos dias".
4.3. Solicitação de documentos à UFSM: a pertinência da documentação intentada faria parte da estratégia de defesa, que não necessitaria ser demonstrada antes do tempo.
Analiso conjuntamente os itens "4.2" e "4.3", porque idênticos os argumentos declinados pela defesa.
De início, mais uma vez importa lembrar que o deferimento ou não de diligências requeridas na fase do art. 402 do CPP está na esfera de discricionariedade do juiz condutor do processo. É entendimento pacífico dos tribunais superiores que cabe ao magistrado averiguar a pertinência e necessidade das medidas complementares requeridas ao final da instrução. Se a defesa utiliza a estratégia de não indicar a pertinência e necessidade da prova, e o Juízo não logra percebê-las sponte própria, como ocorreu na hipótese concreta, não há como acolher os pedidos.
No mais, são extemporâneos os requerimentos, conforme fundamentação do item "4.1" acima, à qual me reporto.
Por fim, oportuno rememorar o que já fora explicado na decisão cuja reconsideração ora se pretende: enquanto a antiga redação do art. 499 do CPP fixava que poderiam ser deferidas diligências cuja "necessidade ou conveniência" surgisse durante a instrução, o novo art. 402 do CPP possui redação mais restritiva, permitindo o acolhimento de providências finais apenas se a "necessidade" aparecer durante a dilação probatória, de modo que a simples conveniência da parte - inclusive quanto ao momento processual em que postulada a diligência - não pode justificar o deferimento da prova.
Pelos motivos acima declinados, rejeito o pedido de reconsideração formulado pela defesa de Paulo Jorge Sarkis.
Intimem-se.
Santa Maria, 17 de janeiro de 2013.
SIMONE BARBISAN FORTES
Juíza Federal Titular
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