Este é um artigo escrito pelo advogado gaúcho Paulo Renato Moraes (OAB/RS 9.150), especialista em Direito Eleitoral, com vasta experiência no Rio Grande do Sul. Diz Paulo Renato Moraes: “As eleições de 3 de outubro não trouxeram resultados muito diferentes das demais. Houve candidatos eleitos por razões alheias à política propriamente dita, quer por seus pendores esportivos, artísticos, ou até mesmo por ocuparem posições destacadas em veículos de comunicação social. Até aí, nada de novo no Brasil. De outra parte, constatou-se que o eleitorado resolveu mandar para casa, como se diz no jargão popular, candidatos que, apesar de longos períodos no exercício de cargos eletivos, tiveram sua trajetória política desgastada por, nem sempre fundadas ou comprovadas, acusações de improbidade administrativa ou corrupção. Também não foi a primeira vez que um candidato não conseguiu se eleger, por não ter seu partido alcançado o número mínimo de votos necessários para atingir o quociente partidário, que lhe possibilitaria eleger tantos deputados quantos indicasse o quociente eleitoral encontrado, como resultado da divisão do número de votos válidos apurados, pelo número de cadeiras a preencher em cada eleição proporcional, apesar de ter obtido votação individual maior do que muitos eleitos. Foi o caso da deputada federal gaúcha Luciana Genro, que concorreu nestas eleições de 2010 por um partido recém-formado, o PSOL, a exemplo do que aconteceu com Jussara Cony, que obteve votação expressiva para Vereadora em Porto Alegre, na década de 90, concorrendo pelo PcdoB. O ingrediente, este sim, novo, no caso de Luciana Genro, é que seu pai, o petista Tarso Genro, elegeu-se governador do Estado, atraindo para seus parentes até o segundo grau a inelegibilidade prevista no art. 14, § 7°, da Constituição Federal.
A proibição é de todos conhecida, desde a edição da Constituição Federal, sem que até hoje o Congresso Nacional tenha aprovado qualquer alteração ao art. 14, a não ser para permitir, no § 5°, a reeleição para um único período subseqüente dos titulares de cargo executivo. As peculiaridades do tema têm provocado o interesse e a curiosidade da sociedade gaúcha, mais particularmente da população portoalegrense, já merecendo a atenção e análise de destacados estudiosos do assunto, todos, por enquanto, negando a incidência da proibição constitucional no caso de candidatura a vereador da Capital, com base em respeitáveis fundamentos jurídicos e sociológicos. O entendimento, todavia, não é unânime. Este artigo tem a finalidade de estabelecer o contraponto necessário, embora sucinto, para afirmar, com amparo na Constituição Federal e na firme jurisprudência do TSE, que a dep.Luciana Genro, a partir de janeiro de 2011, estará inelegível para qualquer cargo, na jurisdição do governador. Isto quer dizer que a deputada não poderá ser candidata a Governadora, Vice-Governadora, Senadora, Suplente de Senadora, Deputada Estadual, Deputada Federal, Prefeita ou Vereadora, nas eleições que se ferirem nos próximos quatro anos, no Estado do Rio Grande do Sul, a não ser que o Governador, seu pai, podendo ser candidato à reeleição, não o faça e renuncie ao cargo até seis meses antes do pleito (Respe. 19.442 e 23.152, relatoria respectivamente da Min. Ellen Gracie e Min.Caputo Bastos, de 2001 e 2004, ambos citados no Respe. n° 29.730, de 18 de setembro de 2008, TSE). Afora isto, a dep. Luciana Genro poderá ser candidata a qualquer cargo em qualquer outro Estado da Federação, desde que cumpra as exigências relativas ao domicílio eleitoral, ou a Presidente ou Vice-Presidente da República, circunscrição/jurisdição superior à do Governador. O Tribunal Superior Eleitoral esgotou o tema, ao julgar recurso de Marcos Claudio Lula da Silva, filho do Presidente Lula, enfrentando, inclusive a atecnia da expressão “no território da jurisdição do titular”, empregado no § 7°, do art. 14, da Constituição Federal e seu verdadeiro e indeclinável significado, quando esclareceu, no voto do Min. Carlos Ayres Brito: “O Ministro Felix Fischer, ao interpretar o texto (do caput do art. 14, da CF), segundo ele, teleologicamente ou finalisticamente, entende que sua conclusão homenageia o princípio da igualdade, que é também de natureza republicana, sabendo que numa república o princípio é da igualdade de todos.(...) E o Ministro Felix Fischer colocou ênfase na semântica, na significação da expressão “território de jurisdição do titular”. Segundo Sua Excelência, jurisdição aqui não é propriamente dizer o direito:, não é jurisdição como sinônimo de atividade típica do Poder Judiciário e consistente em dizer o direito aplicável ao caso concreto. Não é jurisdizer, portanto, aqui, no âmbito judiciário. Segundo Sua Excelência, jurisdição do titular conota a idéia de territorialidade de atuação. O presidente da República atua territorialmente em todo o País, tanto quanto o governador atua no âmbito do Estado, ou do Distrito Federal, e o prefeito exerce a chefia do Poder Executivo municipal, portanto, nos lindes territoriais do município. E prossegue: “Chego à conclusão de que jurisdição aqui é uma palavra-gênero que serve para o presidente da República, o governador de Estado, ou do Distrito Federal, e o prefeito municipal, vale dizer, que serve para toda e qualquer chefia executiva. E arremata: Logo, Ministro Felix Fischer, inclino-me para entender que Vossa Excelência está falando de jurisdição num sentido espacial, num sentido territorial, como âmbito territorial de atuação político-administrativa de toda e qualquer chefia do Poder Executivo”. Com estes e outros argumentos que não cabem neste superficial estudo, o TSE reafirmou o intransponível obstáculo à candidatura pretendida, afastando a aparente impropriedade da expressão em foco, brandida pelos defensores da tese que desafia a inelegibilidade que, hoje, se coloca diante da eventual candidatura da dep.Luciana Genro à vereança da capital gaúcha. Além disso, convém registrar que o escopo do legislador constitucional foi e continua sendo o de evitar a permanência de clãs familiares no poder e impedir a influência do titular do cargo executivo em favor do parente, ainda que involuntária, provocando a desigualdade entre os candidatos, fator de desequilíbrio do pleito. Em palavras mais simples, é preciso que se diga que o eleitor que votou no pai tende a sufragar a filha, até pelo sentimentalismo da pessoa comum. Avulta, neste caso, esta possibilidade, tendo em conta que o eleitor de Porto Alegre está muito próximo do governador, eis que a sede do governo do Estado está localizada justamente em Porto Alegre, ou seja, no território de atuação do vereador. Por fim, não socorre à pretensão da - de certa forma - prematuramente lançada candidata a vereadora de Porto Alegre o fato de concorrer por partido político diferente do partido do governador, uma vez que a inelegibilidade em debate se dá por laços de parentesco, os quais, por sua própria natureza, estão bem acima de siglas partidárias, que servem, no mais das vezes, como peças decorativas, muito menos para encaminhar ideais político-sociais que venham a atuar no interesse do bem comum, e muito mais para mascarar os verdadeiros e inconfessáveis interesses individuais de seus usuários. De todo o exposto, pode-se concluir que a carreira política da dep. Luciana Genro não está encerrada, pois, além das possibilidades eleitorais já mencionadas, não há qualquer óbice a que a liderança política e a energia com que a deputada Luciana Genro se entrega à luta por justiça social e defesa dos direitos do menor e do adolescente, fartamente demonstradas ao longo de sua atividade parlamentar, sejam direcionadas para o também importante trabalho de conselheiro tutelar, cujo exercício está regulamentado, em Porto Alegre, pela Lei Municipal n° 6.787, de 11 de janeiro de 1991, que, em seu artigo 23 e incisos, estabelece os requisitos para registro dos candidatos ao cargo, sem que, nesse rol, figure qualquer impedimento por vínculos de parentesco com o governador do Estado”. Videversus levanta um questionamento: mesmo no caso da eleição para conselheira tutelar, não estaria a ainda agora deputada federal Luciana Genro impedida, uma vez que, eleita, receberia remuneração da prefeitura de Porto Alegre?
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