A Fundação José Sarney, entidade privada instituída pelo presidente do Senado Federal, senador José Sarney (PMDB-AP), para manter um museu com o acervo do período em que foi presidente da República, desviou para empresas fantasmas e outras da família do próprio senador dinheiro da Petrobrás repassado em forma de patrocínio para um projeto cultural que nunca saiu do papel. Do total de R$ 1,3 milhão repassado pela estatal, pelo menos R$ 500 mil foram parar em contas de empresas prestadoras de serviço com endereços fictícios em São Luís (MA) e até em uma conta paralela que nada tem a ver com o projeto. Uma parcela do dinheiro, de R$ 30 mil, foi para a TV Mirante e duas emissoras de rádio, a Mirante AM e a Mirante FM, de propriedade da família Sarney, a título de veiculação de comerciais sobre o projeto fictício. A verba foi transferida em 2005, após ato solene com a participação de Sarney e do presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli. A Petrobrás repassou o dinheiro à Fundação Sarney pela Lei Rouanet, que garante incentivos fiscais às empresas que aceitam investir em projetos culturais. Mas esse caso foi uma exceção. Apenas 20% dos projetos aprovados conseguem captar recursos. O projeto de Sarney foi aprovado pelo Ministério da Cultura em 2005 e está em fase de prestação de contas na pasta. Antes da aprovação, o próprio José Sarney chegou a enviar um bilhete ao então secretário executivo e hoje ministro da pasta, Juca Ferreira, pedindo para apressar a tramitação.
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Em 14 de dezembro, o ministério comunicou que o projeto estava aprovado e, no dia seguinte, a Petrobrás anunciou a liberação do dinheiro. A Petrobrás informou que a fundação foi incluída no programa de patrocínio como "convidada" e por isso não teve de passar pelo processo de seleção. O objetivo do patrocínio, que a fundação recebeu sem participar de concorrência pública, que a estatal faz para selecionar projetos, era digitalizar os documentos do museu. Pela proposta original, que previa o cumprimento das metas até abril de 2007, computadores seriam instalados nos corredores do museu, sediado em um convento centenário no centro histórico de São Luís, para que os visitantes pudessem consultar online documentos como despachos assinados por Sarney na época em que ocupava o Palácio do Planalto. Até agora não há um único computador à disposição dos visitantes. Na relação de despesas foram anexados até recibos da própria entidade para justificar o saque de R$ 145 mil da conta aberta para movimentar o dinheiro do patrocínio. Em recibo de 23 de março de 2006, em papel timbrado da fundação, Raimunda Santos Oliveira declara ter recebido R$ 35 mil por "serviços prestados de elaboração do projeto de preservação e recuperação do acervo" do museu. Ela declara que já trabalhou na fundação, mas isso aconteceu nos anos 90. Sobre o recibo: "Não sei do que você está falando”. A lista de empresas que emitiram as notas revela atuação entre amigos no esforço para justificar o uso do dinheiro. Uma delas, a Ação Livros e Eventos, tinha como sócia até pouco tempo atrás a mulher de Antônio Carlos Lima, o "Pipoca", ex-secretário de Comunicação da governadora Roseana Sarney (PMDB) e atual assessor do ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, aliado da família. Das 34 notas fiscais emitidas pela Ação, que somam R$ 70 mil, 30 são seqüenciais. É como se a firma tivesse apenas a Fundação José Sarney como cliente. Uma das sócias, Alci Maria Lima, que assina recibos anexados à prestação de contas, nem sabe dizer que tipo de serviço a empresa prestou: "Eu assinei o recibo, mas não sei o que foi que a empresa fez, não”. "Pipoca" é irmão de Félix Alberto Lima, dono de outra empresa, a Clara Comunicação, que teria prestado serviços ao projeto da fundação. As notas da Clara totalizam R$ 103 mil. Outra empresa cujas notas foram anexadas na prestação de contas, o Centro de Excelência Humana Shalom, não existe nos endereços declarados à Receita Federal. Por "serviços de consultoria", teria recebido R$ 72 mil da Fundação José Sarney. Uma terceira empresa, a MC Consultoria, destinatária de R$ 40 mil, nunca existiu no endereço no qual foi registrada na Receita. Funcionários do prédio jamais ouviram falar dela. Na prestação de contas, há até notas referentes à compra de quentinhas em um restaurante na rua do museu. A fundação pagou R$ 15 mil pelas marmitas. Pelo valor unitário, R$ 4,50, o restaurante teria fornecido mais de 3 mil quentinhas.
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