Presidente afastado da Câmara diz que a presidente afastada da República lhe ofereceu a ajuda de membros da corte máxima do país e que foi ele quem não aceitou negociar o impeachment em troca de sua salvação no Conselho de Ética
Por Reinaldo Azevedo - Em entrevista à Folha publicada no domingo, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara afastado, negou que tenha chantageado o governo, como acusam Dilma Rousseff, presidente da República também afastada, e José Eduardo Cardozo, ex-advogado-geral da União. Segundo Cunha, o que se deu foi precisamente o contrário. Em quem acreditar? Ora, acredito nos fatos. E estes estão mais próximos da versão de Cunha. Não só! Ele diz que o governo de então lhe ofereceu duas vezes uma suposta ajuda de cinco ministros do Supremo: a primeira oferta teria sido feita pela própria Dilma; a outra, por intermédio do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão. Vamos ver. Cunha pôs para tramitar a denúncia contra Dilma no dia 2 de dezembro do ano passado. A votação do Conselho de Ética (depois anulada), favorável à sequência do processo contra Cunha, só aconteceu no dia 15. O deputado afastado diz ter testemunhas que provam que Jaques Wagner o procurou para negociar, mas ele teria se recusado a atender o então chefe da Casa Civil. Ora, basta recuperar o noticiário dos dias que antecederam a decisão de Cunha. A personagem mais buliçosa, que se movimentava pra lá e pra cá, era ninguém menos do que o próprio Lula, que defendia, sim, uma trégua com Cunha. No dia 1º de dezembro, um dia antes de o então presidente da Câmara aceitar a tramitação da denúncia contra Dilma, o deputado petista Zé Geraldo (PA), um dos três membros do partido no Conselho de Ética, afirmou o seguinte: “Eu defendo que devemos votar pelo país, não pelo Cunha. Não acreditamos no Cunha, mas o que pode acontecer no país amanhã pode ser o pior dos mundos”. Vale dizer: ele defendia abertamente que se salvasse o peemedebista. Isso parece indicar, pois, que o PT estava propenso ao acordo. Mais: não é segredo para ninguém que Lula ficou descontente com as manifestações públicas de petistas contra Cunha. Alertou que o partido teria de arcar com as consequências. Pensemos mais um pouco. Na entrevista à Folha, o deputado afastado diz que escolheu o dia 2 de dezembro porque era aniversário da filha — parece ironizar as razões familiares constantemente alardeadas por seus pares ao dizer “sim” ao impeachment — e porque sabia que o Congresso estava prestes a mudar a meta fiscal, o que daria argumento ao Planalto para afirmar que os crimes fiscais cometidos crimes não eram. Verdade ou mentira? Bem, uma coisa é certa: ele poderia ter esperado mais duas semanas para decidir. Ou por outra: poderia ter aguardado a votação no Conselho de Ética, tomando a sua decisão, pois, já conhecendo os votos dos petistas. Ademais, uma coisa é inquestionável: pondo a denúncia para tramitar, não haveria a menor possibilidade de contar com os votos dos companheiros. Logo, a lógica elementar indica que foi Cunha quem pôs fim à negociação, não o governo ou o PT. Se aconteceu, grave mesmo em toda essa história é a oferta feita por Dilma: a colaboração de cinco ministros do Supremo. Cunha diz não saber quais, o que é, convenham, estranho. Se a generosidade foi posta à mesa, fica difícil supor que não se tenham citado os nomes. Talvez cunha pretenda guardar a informação como um trunfo. Cardozo nega que isso tenha acontecido. Ocorre que, depois das lastimáveis intervenções deste senhor no processo de impeachment, que contribuíram para desmoralizar a própria AGU, fica difícil acreditar nele. Mas dá para acreditar em Cunha? Pois é… Não seria a primeira vez que o governo Dilma teria tentando pescar nas águas turvas de tribunais superiores, não é mesmo? Seja como for, vamos aplaudir: o acordo não aconteceu, e o país tem ao menos a chance de sair do atoleiro.
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