sábado, 13 de abril de 2019

Relatório do banco UBS mostra série de ingerências de Bolsonaro na Petrobras

Embora tenha gerado maior reação do mercado, o recuo no reajuste de 5,7% no preço do diesel anunciado na quinta-feira (11) não foi o único sinal de interferência na gestão da Petrobras desde o início do governo Jair Bolsonaro (PSL). Em relatório, analistas do banco UBS citam ainda a pressão por investimentos em Israel, os prazos mínimos para reajustes do diesel e a criação do Cartão Caminhoneiro como outros exemplos. No início da gestão, Bolsonaro tentou também emplacar um amigo no comando da empresa. O presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, reconheceu em nota na sexta-feira (12) que a suspensão do reajuste foi decidida após alerta do presidente da República sobre os riscos de greve dos caminhoneiros, mas afirmou que a empresa é "completamente autônoma" para a tomada de decisões. Analistas, executivos do setor e pessoas próximas ao comando da estatal dizem que sinais de interferência se acumulam desde o início da gestão e são reforçados por declarações do primeiro escalão do governo Bolsonaro.

Logo no início de janeiro, Castello Branco indicou Carlos Victor Guerra Nagem para assumir a gerência-executiva de Inteligência e Segurança da Petrobras. Chamado por Bolsonaro de "amigo particular", ele é funcionário de carreira, mas nunca havia assumido cargo de chefia. A nomeação foi defendida em redes sociais pelo presidente, mas acabou sendo vetada pelo comitê que analisa os postulantes a cargos da cúpula da companhia por que Nagem não possuía os requisitos mínimos para ocupar o cargo. O governo tem pressionado também a companhia a apoiar a exploração de petróleo na costa israelense, em um momento em que a empresa decide focar seus esforços na produção do pré-sal brasileiro. A participação da estatal em Israel foi negociada durante visita oficial de Bolsonaro no fim de março. O ministro de Energia daquele país, Yuval Steinitz, disse esperar a companhia em leilão em que o país oferece 19 blocos exploratórios.

Com relação ao diesel, o primeiro sinal de intervenção foi dado em 26 de março, quando a Petrobras anunciou prazo mínimo de 15 dias para reajustes e a criação de um cartão para a compra do combustível a preço fixo. Como na quinta-feira, a empresa disse primeiro que era decisão interna. No dia seguinte, porém, Bolsonaro puxou a responsabilidade para o governo e parabenizou o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, pelas medidas. "Os investidores podem interpretar isso como influência do acionista controlador na tomada de decisões da companhia, como aconteceu no passado", escreveram nesta sexta os analistas Luiz Carvalho e Gabriel Barra, do UBS. As notícias reavivaram lembranças do período de controle de preços dos combustíveis que garantiu à companhia em 2013 o topo de lista elaborada pelo Bank of America com as empresas mais endividadas do mundo. Em nota enviada à CVM, a Petrobras diz que manterá a política de paridade internacional dos preços dos combustíveis e que a suspensão do reajuste será de "mais alguns dias".

Considerando o volume de vendas de diesel no País em 2018, a suspensão do reajuste custará à estatal cerca de R$ 14 milhões, em receita adicional que seria obtida com a cobrança de R$ 0,123 a mais em cada litro. Executivos e analistas do setor dizem também que a ingerência nos preços pode impactar o processo de venda de ativos da estatal - que estuda oferecer algumas de suas refinarias - e na atração de investimentos para o setor de combustíveis. "A intervenção do governo na Petrobras está declarada", disse o presidente da Abicom, Sérgio Araújo: "A prática de preços predatórios acaba com o mercado competitivo, reforça o monopólio e prejudica a sociedade".  Desde o início do programa de subvenção ao preço do diesel, no fim de maio de 2018, as empresas importadoras reduziram suas atividades no País. Em novembro, a Raízen, que opera com a marca Shell, anunciou corte de R$ 2 bilhões em investimentos.

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