sábado, 12 de agosto de 2017

CNJ manda investigar desembargador alagona acusado de cobrar propina em troca de sentença

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que a Presidência do Tribunal de Justiça de Alagoas investigue o desembargador Tutmés Airan de Albuquerque Melo, nos autos de uma reclamação disciplinar que o acusa da suposta cobrança de R$ 30 mil ou metade do valor da causa, para que decidisse favoravelmente à advogada Adriana Mangabeira Wanderley, em uma ação em que ela cobra R$ 800 mil em honorários advocatícios da Braskem, do Grupo Odebrecht, em valores de 2008. A decisão do corregedor Nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, é do dia 1º de agosto e viralizou nas redes sociais e em grupos do aplicativo WhatsApp, desde a tarde de quarta-feira (9). Noronha dá prazo de 60 dias para que a Presidência do Tribunal de Justiça comunique o resultado da apuração à Corregedoria Nacional de Justiça.


A reclamação disciplinar que tramita no CNJ em segredo de justiça expõe que a advogada Adriana Mangabeira Wanderley afirmou ter recebido proposta do ex-enteado de Tutmés Airan, o advogado Lucas Almeida, para que lhe pagasse metade dos honorários cobrados à Braskem, em troca de suposto favorecimento no julgamento de uma apelação sobre a causa. Na representação formalizada ao CNJ, no fim de abril deste ano de 2017, a advogada narrou ainda que, em janeiro, foi procurada por um colega de faculdade que disse que Tutmés teve prejuízo com um restaurante e que ela deveria entregar R$ 30 mil a um funcionário do Tribunal de Justiça. E afirmou ainda que só se ganhava causa com Tutmés se os advogados fossem Luís Medeiros, Nivaldo Barbosa (ex-sócios do desembargador) e seu ex-enteado Lucas Almeida.

Na primeira instância, o juiz Henrique Gomes Barros Teixeira chegou a determinar o bloqueio de R$ 10 milhões das contas da Odebrecht, em 17 de abril, para garantir o pagamento da causa ganha pela advogada. Mas uma decisão de Tutmés Airan mudou o efeito do recurso, desconhecendo a natureza alimentar dos honorários, dias depois de ter recebido a visita de advogados da Odebrecht, com uma mala considerada suspeita por Adriana Mangabeira Wanderley. A advogada incluiu na reclamação ao CNJ a informação de que “é procedimento dos advogados da Odebrecht fazer visitas ao requerido com malas”. E juntou fotografia de um desses momentos, em 15 de abril, dois dias antes do bloqueio da conta. 


Adriana Mangabeira Wanderley decidiu deixar de defender a Braskem, após o ingresso do advogado Marcos José Santos Meira na causa que conseguiu R$ 1 bilhão para a subsidiária da Odebrecht. A advogada assinou o subestabelecimento para o advogado, que é filho do ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), José de Castro Meira. Marcos Meira é o mesmo que foi objeto de um laudo da Polícia Federal, no âmbito da Operação Lava Jato, que revelou que seu escritório recebeu pelo menos R$ 11,2 milhões da Odebrecht de 2008 a 2014. O pai do advogado, quando ministro, relatou processo em que considerou prescrita uma dívida de R$ 500 milhões cobrada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional da Braskem.


O desembargador disse estar muito chateado e entristecido com o que chamou de “infâmia”. E depois de atribuir a reclamação a uma decisão sua que negou a liberação dos honorários à Adriana Mangabeira Wanderley, afirmou que iria processar a advogada, porque ela não provaria nenhum ato ilegal cometido por ele. “Na verdade, ela não gostou de uma decisão monocrática minha, que depois foi homologada pela 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, à unanimidade. Ela queria porque queria receber a liberação de um honorário que ainda era extremamente controvertido. E fez essa infâmia aí, porque não liberei o honorário para ela, por uma questão de cautela, porque podia ser que no final da ação ela perdesse. Eu vou me defender, naturalmente, com absoluta tranquilidade e vou processar ela, até onde os processos possam permitir, tanto no âmbito penal, quanto no âmbito cível”, disse Tutmés.

O desembargador afirmou que a advogada denunciante teria “ficha corrida não recomendável”, sem credibilidade. E desqualificar a denúncia que sugere entrega de propina em malas, ao afirmar que advogados que não moram em Alagoas costumam circular com malas nos Tribunal, como teria sido o caso do representante da Braskem, que é de Salvador (BA). “Essa história de advogado com mala é uma maldade muito grande. Recebo advogados para entregar memoriais e nem precisa marcar hora no gabinete. O advogado estava acompanhado do Telmo Calheiros, que preside a comissão de ética da OAB de Alagoas. Isso é maldade infinita. Essa moça tem uma ficha corrida pouco recomendável. Ela não é uma pessoa que, assim, a princípio mereça muita crença. Então, estou à disposição da imprensa e das autoridades, para prestar os devidos esclarecimentos, sem dificuldade nenhuma”, declarou o desembargador.

Em julho de 2016, o então presidente do Tribunal de Justiça de Alagoas, Washington Luiz Damasceno Freitas, foi afastado do cargo de desembargador, após apuração de denúncias de corrupção pelo CNJ. Ele permanece afastado até hoje. A advogada Adriana Mangabeira Wanderley já havia ingressado no CNJ com uma representação contra Tutmés Airan, em 28 de abril, com juntada de documentos em 2 de maio, expondo que o desembargador havia admitido o recebimento de recurso da Braskem já considerado deserto, porque não teria havido o pagamento das chamadas custas de preparo relativas à ação principal. Nesse mesmo dia, a advogada peticionou no processo, comunicando pedido ao Tribunal de Justiça que acompanhasse a representação feita junto ao CNJ.


Dias depois dessa primeira representação, sem manifestação das partes, o desembargador incluiu o processo na pauta de julgamento da sessão de 17 de maio da 1ª Câmara Cível, quando foi rejeitada por unanimidade a preliminar que argumentava pela deserção pelo não pagamento das custas obrigatórias do recurso da Braskem, com votos favoráveis, além do de Tutmés, dos desembargadores Fernando Tourinho de Omena Souza e Fábio José Bittencourt Araújo, que anularam a sentença de origem, favorável à advogada. 

A primeira reclamação da advogada ao CNJ teve que ser refeita, porque teria sido protocolada errada, direcionada à presidente do CNJ, Cármen Lucia. E a reclamação que agora prossegue é a segunda protocolada, reformulada. Em maio, a presidente da Seccional Alagoana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Fernanda Marinella, e a Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas da OAB Nacional foram comunicados sobre a reclamação disciplinar junto ao Conselho Nacional de Justiça. 

Um dos acusados, Luís Medeiros, ingressou com queixa crime pedindo a condenação contra Adriana Mangabeira Wanderley, por calúnia, R$ 500 mil em reparação de danos a serem destinadas a instituições que tratem de mulheres com distúrbios mentais ou dependência química. E pediu que a Justiça que realize exames de sanidade mental e de dependência química na denunciante. 

Lucas Almeida, ex-enteado de Tutmés Airan, disse: “Eu tenho muito pouco a dizer sobre a denúncia da advogada Adriana Mangabeiras. Primeiro porque não tenho a menor intimidade com ela (nunca trocamos duas palavras), segundo porque não sabia que ela atuava como advogada em Maceió (achei que tivesse outra atividade) e terceiro porque eu jamais tomei conhecimento do processo dela. Na verdade, eu estou me sentindo como uma pessoa que está passando na rua e leva um tapa de um desconhecido sem ter absolutamente nada a ver com a história. A coisa se torna preocupante, entretanto, pela irresponsabilidade da informação e pelo estrago causado à imagem. Sobretudo num tempo em que falar da corrupção entre parentes de juízes e juízes virou moda, notadamente porque muitas vezes essas denúncias têm fundamento. Tenho recebido informações sobre o histórico criminoso dessa moça, que pode ser facilmente levantado a partir de uma busca simples no Google pelo seu nome. Enfim, vamos manter a calma, tomar as medidas judiciais cabíveis e esperar que as coisas sejam esclarecidas".

Já o advogado Luís Medeiros comentou: “Não a conheço, nunca estive com ela, jamais tratei sobre processo dela e não sei nem do que se trata. Irei ajuizar queixa-crime, ação de danos e representação, pedindo que ela seja submetida a exame de insanidade mental e a teste de dependência química, afinal, o enredo mirabolante por ela criado só pode ser obra de uma pessoa acometida de enfermidade mental ou de uma mente entorpecida pelo uso contínuo de psicotrópicos e alcaloides. Defendo a minha honra porque sou honesto e jamais permitirei que qualquer aventureira tente macular a mim e a minha profissão”. 

Por sua vez, o advogado Nivaldo Barbosa Jr afirmou: "Acerca da representação promovida por uma advogada contra um desembargador de Alagoas no CNJ envolvendo meu nome, gostaria de esclarecer que não a conheço, jamais estive com ela, não sei do que trata o processo dela e não sei de onde extraiu tal versão. Outrossim, o referido desembargador espontaneamente averba-se de suspeito nos processos em que atuo, de modo que a acusadora será instada judicialmente a comprovar tais alegações, sem prejuízo das providências penais cabíveis. Por fim, estou disponível, como sempre estive, para qualquer esclarecimento ou investigação, providência, aliás, que eu mesmo solicitarei. Nivaldo Barbosa Jr". 

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