terça-feira, 13 de junho de 2017

MÉDICOS DA HU DA UFSC DENUNCIADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO CATARINENSE ACREDITAM QUE FICARÂO ANÔNIMOS E IMPUNES


No dia 2 de maio de 2017, há um mês e 11 dias, o procurador federal João Marques Brandão Neto apresentou denúncias individualizadas contra 26 médicos do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. A denúncia foi protocolado na 1ª Vara Federal Criminal, que é conduzida pela juíza Simone Barbisan Fortes. Ela é conhecida dos gaúchos por ter conduzido grande parte do processo da Operação Rodin, do qual pediu afastamento justo antes da apresentação da sentença, e também pediu remoção de cidade, mudando-se de Santa Maria para Florianópolis. Até agora ela ainda não pronunciou os denunciados como réus nos processos. Alguns dos 26 médicos (que estão gastando entre 40 mil e 100 mil reais mensais no pagamento de seus advogados) têm a certeza de que seus processos andarão a passos de tartaruga, e que seus nomes permanecerão no anonimato, sem o conhecimento da opinião pública. Mais do que isso, eles têm certeza de que sairão impunes dos processos nos quais são acusados de estelionato. Eles acreditam que seus processos permanecerão sigilosos, correndo em sigilo, e dessa forma seus nomes serão preservados. A denúncia por estelionato contra os 26 médicos do Hospital Universitário é quase uma proeza, um milagre, que tenha acontecido. Ela foi apresentada quase dois anos após a deflagração da Operação Onipresença, que investigou médicos suspeitos de assinar a folha ponto no Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e abandonar as emergências para atender em clínicas e hospitais particulares. O autor da denúncia, o procurador federal João Marques Brandão Neto, individualizou as condutas de cada um em peças acusatórias separadas. Ele não divulgou os nomes dos médicos no documento. Ao todo foram 26 denúncias e um pedido de diligências contra um profissional do grupo de 27 médicos indiciados pela Polícia Federal em junho de 2015. Deflagrada no dia 9 de junho de 2015, a Operação Onipresença indiciou 26 que não cumpriam suas cargas horárias previstas em contrato, realizando ainda atendimentos em unidades de saúde privadas no momento em que deveriam estar no na unidade federal. Alguns médicos assinavam até cem horas semanais sem comparecer ao trabalho.O prejuízo total para a União, em cinco anos, é de R$ 36,1 milhões. Conforme o delegado Allan Dias, da Polícia Federal, à época alguns médicos sequer compareciam para trabalhar no HU (Hospital Universitário, que é um hospital escola da universidade) e recebiam salário mensal entre R$ 16 mil e R$ 19 mil. Os relatos de que médicos do HU não cumpriam a jornada de trabalho estabelecida no hospital público apareceram pela primeira vez em 1998, quando auditores do Tribunal de Contas da União realizaram inspeções na unidade. "Praticamente nenhum médico fica no hospital durante as quatro horas diárias de trabalho. Ao serem questionadas sobre o assunto, todas as chefias admitiram que o problema existe", relata o documento de inspeção realizada 19 anos atrás. Ou seja, nesse período, muitos médicos provavelmente se aposentaram sem terem cumprido o contrato que mantinham com a União. Em 2004, o Ministério Público Federal abriu inquérito civil para apurar o mesmo caso, a partir de duas auditorias realizadas pela Controladoria-Geral da União, que também constatou as mesmas ilegalidades. Somente 11 anos depois este inquérito do Ministério Público Federal se transformou em ação civil pública, em março de 2015. No dia 6 de abril daquele ano, a Justiça determinou, em decisão liminar, que a UFSC teria que implantar ponto eletrônico até 31 de dezembro de 2016. Em abril do ano passado, a universidade finalmente implantou o ponto eletrônico em suas dependências. Mas, isso não significa qualquer garantia de que os médicos do Hospital Universitário estejam cumprindo suas horas contratadas na prestação do serviço. Quando explodiu a Operaçáo Onipresença aconteceu uma gigantesca romaria de carrões importados à frente do prédio da Superintendência da POlícia Federal, na Avenida Beira Mar Norte, em Florianópolis. Eram os carrões dos principais nomes da advocacia catarinense, convocados para a defesa de médicos tão importantes, tão conhecidos. Os médicos foram instruídos, em peso, a se manterem calados durante a inquirição policial. Mas, as declarações deles eram, a essa altura, praticamente desnecessárias e inúteis. As investigações da Operação Onipresença começaram em outubro de 2013, após uma denúncia sigilosa. Em 9 de junho de 2013, a Polícia Federal cumpriu 52 mandados de busca e apreensão em Florianópolis, Tubarão, Itajaí e Criciúma para recolher documentos comprovantes nas investigações. O que foi comprovado é que médicos professores concursados da UFSC, com contratos de dedicação exclusiva, que tinham entre 40 e 60 horas semanais de contrato com o Hospital Universitário, também atendiam em clínicas particulares ou lecionavam em universidades privadas. O atendimento no Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina ficava por conta do artífico da consulta com hora marcada. Ou seja, eles não atendiam conforme a demanda de pacientes exigia, mas conforme os horários que eles próprios disponibilizavam. Essa manobra permitia que os médicos tivessem trabalhos paralelos nos horários que em deveriam estar atendendo no Hospital Universitário. E nesses atendimentos em clínicas privadas ou hospitais privados eles obtinham uma alta remuneração. Entretanto, não abriam mão de seus empregos públicos, de forma a garantir uma aposentadoria tranquila no futuro por conta dos contribuintes aos quais eles sonegavam atendimento, apesar de pagos para isso. O delegado federal Allan Dias, que comandou a investigação, inclusive tendo infiltrado agentes sob seu comando dentro do hospital para comprovar documentalmente as faltas dos médicos, diz que "não faltam médicos no HU, eles precisam apenas ir trabalhar". Continua o delegado: "Há casos de médicos que não foram trabalhar nenhum dia e receberam R$ 15 mil por mês. De 848 consultas que deveriam ser ofertadas em média por dia, foram efetivamente realizadas 226, cerca de 25%. Essas provas da investigação configuram a prática de diversos crimes, incluindo falsidade ideológica, prevaricação, abandono de função pública e estelionato contra a União". Com tantas provas de crimes, o delegado federal Allan Dias pediu a prisão provisória da maioria dos 27 médicos, mas a Justiça Federal negou todos os pedidos. O que os catarinenses (e brasileiros em geral) seguem não entendendo é a razão pela qual esses processos correm em segredo de Justiça. Se não há segredo de Justiça nos processos da Operação Lava Jato, por que deveria seguir havendo essa providência nos processos dos médicos catarinenses? A juíza Simone Barbisan Fortes, que ficou famosa pelo caso da Operação Rodin, agora tem a possibilidade de confirmar a sua fama. E a primeira providência que deveria tomar seria o levantamento do segredo desses processos, assim como fez no caso da Operação Rodin. Os catarinenses, e brasileiros em geral, continuam esperando pacientemente pela manifestação dela, tornando todos esses 26 médicos em réus e deixando os processos sem sigilos.

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