quarta-feira, 22 de junho de 2016

Heráclito Fortes se diz inocente e causa constrangimento ao explicar denúncia a procurador


Frente a frente com o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava-Jato, o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), citado na delação premiada de Sérgio Machado, causou constrangimento nesta quarta-feira ao se colocar à disposição do Ministério Público para explicar a citação do ex-senador e ex-presidente da Transpetro a seu nome. Da tribuna da Câmara, Fortes afirmou que faz "o que for preciso" para esclarecer o seu envolvimento na delação de "um réu confesso", e citou como possibilidades uma acareação e a quebra de seu sigilo telefônico. O deputado, também ex-senador, disse ainda que "o que sempre quis na vida foi ficar imune a escândalos e escandalosos". — Eu estou aqui nesta Casa há muitos anos, e o que eu sempre quis na vida foi ficar imune a escândalos e aos escandalosos. Mas vejam os senhores: semana passada, senhores procuradores, eu fui denunciado pelo réu confesso que, através de uma delação premiada, quer aliviar os crimes que cometeu. As providências que eu quis tomar eram todas perigosas. Veio um advogado e me disse: 'Se você pede uma acareação, ele está perdido, mas ele não diz que lhe deu um milhão, ele diz que lhe deu dez. E aí? — indagou o deputado, olhando para Dallagnol. Heráclito Fortes foi citado por Machado como beneficiário de R$ 500 mil disfarçados de doação eleitoral. O acerto inicial, segundo o delator, era o pagamento de R$ 1 milhão a Fortes e R$ 1,5 milhão ao ex-presidente do PSDB, Sérgio Guerra, para aprovar, na Comissão de Infraestrutura do Senado, da qual Fortes era presidente, o limite de endividamento da Transpetro. Na explicação ao procurador, que esteve na Câmara para promover o projeto de dez medidas contra a corrupção, o deputado pediu que a força-tarefa analise as atas das reuniões da Comissão. Fortes alega que teve que lidar com uma briga entre interesses da Bahia e de Pernambuco, e que ficou "imprensado" entre "o vozeirão de Antonio Carlos Magalhães" e o então senador Marco Maciel. Ele contou a Dallagnol que recebeu inclusive um telefonema da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, pedindo que ele lidasse com a situação. Ele diz que o episódio ocorreu em 2006, data em que Sérgio Machado teria o ajudado com uma doação oficial, e que as acusações de Machado são "sem pé nem cabeça". "Ainda bem que foi oficial porque, se ele dissesse: 'Não, eu dei no caixa dois', eu jamais teria como provar. E vejam: o assunto se deu em 2006, ele falou que deu em 2010 e, em 2014, ficou me devendo. Uma coisa sem pé nem cabeça", disse, acrescentando: "Mas o raio de ação da calúnia é dez vezes maior do que o do desmentido, de forma que o apelo que eu quero fazer ao Ministério Público é: me coloco à disposição para o que for preciso, acareação, quebra de sigilo telefônico, porque eu acho importante", defendeu-se, a um procurador atento. Depois da "acareação" entre Dallagnol e Heráclito Fortes, o procurador da Operação Lava-Jato comentou a saia justa: "Acho que talvez tenha havido um equivoco, porque os próximos passos da colaboração premiada do Sérgio Machado acontecerão perante o Supremo Tribunal Federal, então não é uma coisa relacionada a mim", explicou, perguntado sobre o pedido do deputado. O procurador negou qualquer constrangimento em comparecer ao Congresso, onde muitos parlamentares, investigados, defendem mudanças na Lava-Jato. "O que vemos é um Congresso se movimentando pela aprovação dessas dez medidas. Já temos uma frente parlamentar especifica para a aprovação, com 218 deputados. Isso renova nossas esperanças no sentido de que teremos um movimento como aconteceu na Ficha-Limpa, em que pessoas do Parlamento se movimentam para dar uma resposta contra a corrupção. Questionado se deveria ser político para lidar com parlamentares investigados ou citados em delações, o procurador disse que deve ser "cordial" mesmo com "criminosos e condenados", mas nunca ceder para agradar quem quer que seja. Ele criticou a possibilidade de qualquer alteração na lei de delações premiadas e mudanças na celebração de acordos de leniência, uma espécie de colaboração para empresas. Dallagnol disse temer que, num momento de stress da classe política, haja propostas para "abafar as investigações": "Foram exatamente esses institutos, colaboração premiada e leniência, que nos permitiram chegar onde chegamos, com uma expansão exponencial das investigações, descobrindo novos fatos, processando pessoas e recuperando R$ 3 bilhões aos cofres públicos. É possível melhorar, mas eles foram úteis como estão previstos hoje. O receio que temos é que nesse momento de stress, de tensão política e decorrente das investigações é que sejam aproveitada a oportunidade de uma proposta para realizar um retrocesso e para barrar ou abafar as investigações. O procurador defendeu a celebração de acordos com presos e disse não ter "qualquer sentido" tentar mudar esse dispositivo. "A não ser que se busque frear as investigações", afirmou. Na classe política, muitos criticam a oferta de delação a investigados presos, entre eles o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também citado na delação de Sérgio Machado. "Não tem qualquer sentido uma proposta de proibir a colaboração por parte de réus presos. Digamos que uma pessoa é presa por extorsão mediante sequestro, existe uma vítima em cativeiro e esta pessoa é presa. Você vai deixar de fazer acordo, deixar que ela indique onde a vítima está simplesmente porque ela está presa?" — questionou. "Não faz sentido algum limitar colaborações de pessoas presas. A não ser dentro de um contexto em que se busque frear as investigações. O procurador defendeu a reforma política e uma reforma no sistema de Justiça. Ele citou como exemplo o fato de que só há uma "alavanca" para celebrar acordos de delação quando as pessoas são punidas. Ele diz que, na Lava-Jato, como no Mensalão, há uma compreensão de que acusados terão uma pena severa, e que isso ajuda no desenrolar da Operação. "Foi apenas porque existiu o Mensalão e o Marcos Valério que temos hoje a Lava-Jato. Sem um sistema que puna pessoas, não temos acordo de colaboração e nem expansão de investigação", disse. 

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