quarta-feira, 18 de maio de 2016

Sonia Braga diz em Cannes que impeachment é "revoltante"


"Não entendo como um presidente da Câmara criminoso pode julgar uma pessoa que nem foi condenada e contra a qual não se descobriu nada", disse a atriz Sonia Braga, logo após exibir o filme "Aquarius", longa nacional que foi mostrado no Festival de Cannes com um grande ato anti-impeachment realizado pela equipe do longa. A atriz, que disse ter acompanhado a votação na Câmara em sua casa, em Nova York, a classificou de "revoltante e horrível". "Não uso a palavra golpe, porque me traz pesadelos dos anos 1960", disse ela: "Mas acho que houve uma manipulação, uma transformação forçada. Eu endosso a democracia". "Um golpe de Estado aconteceu no Brasil", anunciava a placa que o diretor ostentou assim que subiu a escadaria do tapete vermelho, em frente à sala em que "Aquarius" foi projetado minutos depois. Foi acompanhado pelo elenco, incluindo a atriz principal, Sonia Braga, que não trouxe cartaz, mas posou para fotos endossando o protesto. Ao entrar na sala com os cartazes, a equipe do longa foi acompanhada por dezenas de outros convidados, também brasileiros, que empunharam os mesmos dizeres e uma faixa: "Parem o golpe". O Aquarius que dá nome ao filme é o prédio em que a trama é ambientada: último representante de seu estilo na praia de Boa Viagem, no Recife, é alvo de uma construtora, que pretende demoli-lo. Mas enfrenta a única moradora que ainda vive ali, Clara (Sonia Braga), uma crítica de música aposentada e viúva, cercada de discos, livros, álbuns de fotos. "Não é filme de zumbis, mas é quase, com o mercado sendo o zumbi", define o diretor. A abordagem crítica da especulação imobiliária e da ocupação do espaço físico não é tema estranho a Mendonça Filho, que já o explorou no filme "O Som ao Redor" (2012), sobre uma rua no Recife atual que reproduz estruturas de poder e mazelas de séculos de história brasileira. Para o cineasta pernambucano de 47 anos, que começou a carreira como crítico, "Aquarius" é "um filme de esquerda", e Clara, a protagonista, empreende uma "luta esquerdista", por não se conformar com o destino que a construtora quer dar ao seu imóvel: "A grande questão hoje no Brasil é se ter um ponto de vista. A direita aceita as situações. O pessoal da esquerda questiona". A crítica internacional foi elogiosa ao filme. O jornal francês "Le Monde" crava que "Aquarius" leva a Palma de Ouro, o prestigioso prêmio principal do festival. "É o filme mais amplo da competição, o mais rico, o mais raivoso. Um baque", disse Aureliano Tonet, editor de cultura do jornal. Para a revista segmentada "Variety", o trabalho de Sonia é "incomparável" e Mendonça Filho, "um mestre". Segundo a revista "Screen Daily", que tem acompanhado todos os filmes da competição, a interpretação da atriz, "uma força da natureza", é uma das mais fortes de sua carreira. Sonia já esteve em Cannes outras cinco vezes, uma delas em 1985, para mostrar "O Beijo da Mulher Aranha", de Hector Babenco, que acabou rendendo a Palma e o Oscar ao ator William Hurt. O Brasil só levou a Palma de Ouro de melhor filme em 1962, por "O Pagador de Promessas", de Anselmo Duarte. Na competição, a última participação do país foi em 2012, com "Na Estrada", uma coprodução internacional dirigida por Walter Salles. O anúncio dos vencedores da 69ª edição do Festival de Cannes acontece no domingo (22). Foi uma manifestação patética desse esquerdismo retrô em Cannes, bem em sintonia com a história do filme esquerdista "enragée". Sonia Braga está transformada em uma espécie de Madame Hortense, do filme "Zorba, o Grego", de 1964. Ela é a reencarnação da Boubolina. 

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