domingo, 17 de janeiro de 2016

Uma parte da história da dívida do Rio Grande do Sul, e um reconhecimento a um grande homem, José Ernesto Azzolin Pasquotto

José Ernesto Azzolin Pasquotto, unico secretário da Fazenda gaúcha que reduziu tamanho nominal da dívida mobiliária 
Lá na década de 80 as contas públicas do Rio Grande do Sul já eram um desastre. O Estado vivia da emissão de títulos pelo Tesouro. Esses títulos tinham seus vencimentos negociados diariamente na mesa de operações da Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários do Estado do Rio Grande do Sul, a Divergs. O que salvava os governos era a apropriação da renda dos funcionários públicos, o que era conseguido por causa da inflação. O Estado girava no mínimo 30 dias no over night com os salários dos funcionários. Com uma inflação que chegou a 80% ao mês, não havia correção diária que salvasse os funcionários. O dinheiro era aplicado pelo governo no open market e gerava um ganho financeiro brutal. Representava a produção de um outro orçamento paralelo. o orçamento financeiro. O governo do PMDB, de Pedro Simon, chegou a ter a folha de pagamento de um ano inteiro, com 13ª e 30% de férias antecipadas dos funcionários depositado no Fundo Garantidor de Liquidez dos Titulos da Dívida Pública Mobiliária do Estado do Rio Grande do Sul, que era gerido pela Divergs. Isso era uma conta que só se tornou de conhecimento do governador bem mais tarde. Essa "abastança" serviu para diminuir ou eliminar o tamanho do endividamento do Estado? Diminuiu minimamente o endividamento, por um brevíssimo período. Sabem por que? Porque políticos, partidos políticos e corporações de Estado só querem saber de gastar. Arrecadar não é com eles, porque depende da atividade econômica. E eles não estão nem aí para a atividade econômica, para os empreendedores. Os bancos cortejavam o Estado para que lançasse mais títulos no mercado. Quanto mais títulos estivessem disponíveis no mercado, mais os bancos ganhariam no spread, a medida de risco. E o Estado do Rio Grande do Sul, alegremente, ia ao mercado, todos os dias. Então um secretário da Fazenda, José Ernesto Azzolin Pasquoto, com o tesouro abarrotado de dinheiro no Fundo Garantidor de Liquidez dos Títulos da Dívida Pública Mobiliária do Estado do Rio Grande do Sul, começou a reagir aos spreds exigidos pelo mercado financeiro. E ele me deu ordem para colocar anúncios minúsculos, em páginas pares, no Jornal do Comércio de Porto Alegre, anunciando os leilões de título da dívida pública do Tesouro do Estado do Rio Grande do Sul. Esses títulos eram recomprados pelo próprio emissor, o Estado, desagiados e aplicados no próprio fundo, que crescia exponencialmente. Não foi por acaso que Amador Aguiar, o então plenipotenciário do Bradesco, "apaixonou-se" por Pasquotto e mandou buscá-lo em Porto Alegre para uma reunião na Cidade de Deus, em Osasco. Lá, ofereceu um grande cargo para Pasquotto no Bradesco. É claro.... era necessário retirá-lo da secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul. O convite não foi aceito. Por um breve período, Pasquotto conseguiu diminuir o tamanho nominal da dívida pública mobiliária do Estado do Rio Grande do Sul. Não demorou para que membros do governo Pedro Simon descobrissem os valores depositados no Fundo Garantidor de Liquidez dos Títulos da Divida Pública Mobiliária do Estado do Rio Grande do Sul e começassem a guerra para explodir Pasquotto do cargo de secretário. Ele acabou saindo, para concorrer a deputado, e os sucessores dilapidaram os recursos com uma voracidade espantosa em menos de um ano. Pasquotto teve interrompida sua candidatura a deputado para que fosse colocado na condição de vice de Fogaça ao governo do Estado. Não deixaram que ele falasse um vez sequer nos programas de televisão. Na verdade, queriam que ele fizesse parte do esquema apenas como arrecadador de recursos junto ao empresariado. Mataram ali uma futura carreira política de Pasquotto que nunca saiu do ponto inicial. Todos os outros estão até hoje aí desfrutando de mandatos, que são, na verdade, autorização para avançar sobre recursos públicos. Está aí um nome para ser recuperado e enobrecido na história política do Rio Grande do Sul.  

2 comentários:

Unknown disse...

Como sobrinho deste grande homem e que tive o prazer de conviver e muito aprender com ele agradeço profundamente esta matéria. Essas e outras práticas nebulosas no trato das contas públicas é que deram origem à necessidade da Lei de Responsabilidade Fiscal e a proibição de endividamentos dos governos com bancos públicos, hoje repaginados como as tais pedaladas fiscais. Lindo texto. Grande homenagem. Estou profundamente agradecido e quase às lágrimas.

Eduardo Dutra Aydos disse...

Homenagem merecida Victor. Meu conhecimento do Pasquotto foi episódico e mediado pela amizade e reconhecimento que lhe tributava meu pai, seu colega, o fiscal do ICM Eduardo Bastos Aydos. Sempre o tive como integrante daquela seleta e muito reduzida condição de homem público a quem, a proximidade do poder e as contingências da militância partidária, não ofuscaram a capacidade de elevar-se, nas afeições do cotidiano e nas opções do seu enfrentamento político, acima e além do entrechoque das licenciosidades e irracionalidades que povoam o imaginário e a atuação da nossa elite política. Os partidos políticos, vez por outra, albergam algumas dessas personalidades marcantes que, por vários traços do seu compromisso público registram passagens meteóricas na sua experiência de governo. Deles se pode dizer, parafraseando o poeta Vinicius, que não se eternizam na vida pública, mas lhe imprimem um intenso e duradouro impacto enquanto nela sobrevivem.