domingo, 25 de outubro de 2015

Operador de mercado financeiro deu dois carrões a Eduardo Cunha

A empresa C3 Produções Artísticas e Jornalísticas não receberia a mínima atenção do mundo político, caso não fosse o bem mais valioso na declaração de bens do presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, do PMDB, devido ao capital social de R$ 1,4 milhão. Com sede no 29º andar de um edifício de 40 andares de esquina para Avenida Rio Branco, no centro do Rio de Janeiro, a C3 é uma sociedade entre Cunha e sua mulher, a jornalista Cláudia Cordeiro Cruz. Entretanto, desde que Cunha passou a ser investigado pelaOperação Lava Jato pela suspeita de ser um dos beneficiários da propina paga por contratos superfaturados da Petrobras, seus bens foram esquadrinhados de perto pela Polícia Federal. Recentemente, os policiais encontraram um vínculo incômodo para Cunha na C3. Em fevereiro e maio de 2012, a C3 Produções aumentou seu patrimônio com a compra de dois carros. Um Hyundai Tucson preto, ano 2009, custou R$ 80 mil, e um Land Rover Freelander prata, ano 2008, custou R$ 100 mil. Apesar de a C3 ficar no Rio de Janeiro e de carros assim estarem à disposição na cidade, a compra foi feita em uma loja em São Paulo. Estranhamente, os veículos não foram pagos com dinheiro da C3. Foram pagos por duas empresas que pertencem ao operador de mercado Lúcio Bolonha Funaro, investigado no escândalo do mensalão, em 2005. De acordo com documentos obtidos por ÉPOCA, o Hyundai Tucson foi pago com um cheque de R$ 25 mil da Cingular Fomento Mercantil Ltda., mais uma transferência bancária de R$ 55 mil; o Land Rover Freelander foi pago com um cheque de R$ 50 mil da mesma Cingular e outro de R$ 50 mil da Royster Serviços S.A. A Cingular e a Royster fazem parte de um conjunto de empresas de Lúcio Funaro. 


De acordo com a Procuradoria-Geral da República, além desses dois carros, Eduardo Cunha e Cláudia possuem mais seis veículos: doisPorsches Cayenne, um BMW 325i, um Ford Edge, um Ford Fusion e um Pajero Sport Flex. A frota está avaliada em R$ 940 mil. Como estão registrados em nome da C3 Produções e de outra empresa, a Jesus.com, os veículos não aparecem diretamente na declaração de bens entregue por Cunha à Justiça Eleitoral no ano passado. O documento oficial informa que o patrimônio de Cunha é de R$ 1,64 milhão. Nele, Cunha declara possuir apenas um carro, um Toyota Corolla 2007, avaliado em R$ 60 mil. O vínculo entre Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, portanto, permanecia oculto. Lúcio Funaro afirma que o pagamento dos carros foi “operação comercial privada, protegida por cláusula de confidencialidade, devidamente declarada às autoridades competentes”. O deputado Eduardo Cunha transferiu a resposta a seu advogado Antonio Fernando de Souza, que não respondeu. Algumas das empresas de Funaro foram investigadas pela CPI dos Correios, que examinou vínculos entre o mensalão e irregularidades em fundos de pensão. Na ocasião, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) detectou movimentações suspeitas feitas pela Royster. As investigações sugerem que a compra dos carros para a empresa de Cláudia Cruz é mais uma gentileza comercial de Lúcio Funaro para Eduardo Cunha. No auge da investigação do mensalão, em 2005, Funaro pagava o aluguel e o condomínio do apartamento que Cunha morava em Brasília. Eduardo Cunha negava que Funaro pagasse seu aluguel, mas os documentos o contradiziam. Naquele momento, Cunha era o líder da bancada vinculada ao então governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho. Quando Funaro foi convocado a depor na CPI dos Correios, para falar sobre sua ajuda a Valdemar Costa Neto e negócios suspeitos com fundos de pensão, a bancada de Garotinho o socorreu. A Procuradoria-Geral da República acusou Funaro de montar uma estrutura que permitia ao PT pagar o mensalão ao ex-deputado Valdemar da Costa Neto, do então PL, em troca de apoio no Congresso Nacional. Em maio de 2013, a Justiça concluiu que Funaro cometeu crime de lavagem de dinheiro no mensalão, mas deixou de aplicar a pena devido a um acordo de delação premiada. Desde março, Eduardo Cunha é alvo de um inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar seu envolvimento com o esquema de corrupção na Petrobras. A pedido da Polícia Federal, a loja de carros remeteu ao inquérito cópia dos cheques que pagaram os veículos da C3 Produções. Os papéis chegaram no dia 12 agosto. Oito dias depois, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou Eduardo Cunha por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, sob a acusação de receber propina de US$ 5 milhões em um contrato entre a Petrobras e a Samsung, responsável pela construção de dois navios-sondas. No inquérito que resultou na denúncia contra Cunha, Cláudia Cruz ainda não era investigada. 


No dia 15, o STF autorizou a abertura de outro inquérito contra Eduardo Cunha e incluiu Cláudia entre os investigados. A nova linha de apuração se refere às contas do casal na Suíça, que seriam abastecidas com dinheiro desviado de um contrato da Petrobras em Benin, na África. Os investigadores da Suíça rastrearam 1,3 milhão de francos suíços (R$ 5,3 milhões) depositados na conta Orion, de Cunha, entre maio e junho de 2011. Os pagamentos ocorreram por meio de uma empresa do lobista João Augusto Henriques. Cláudia Cruz é titular da conta Köpek, que recebeu US$ 1,1 milhão entre 2008 e 2014 e foi usada para o pagamento de despesas de cartão de crédito, de uma escola no Reino Unido e de uma academia de tênis nos Estados Unidos. Ao abrir a conta, Cláudia Cruz declarou ser dona de casa. Nesta quinta-feira (22), o ministro Teori Zavascki, do STF, determinou o bloqueio e o sequestro dos cerca de R$ 9,6 milhões depositados em favor de Eduardo Cunha na Suíça.

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