segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Petrobras, em violenta crise causada pelo regime petralha, e com caixa esgoelado, revê contratos e cobra multas de seus fornecedores


Com o aprofundamento da crise da Petrobras, causado pelo saque produzido pelo regime petralha, cresce o número de fornecedoras do setor de óleo e gás que avaliam ir à Justiça contra a companhia. Uma dezena de afiliadas à Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) já estuda processar a petroleira, diz José Velloso, presidente executivo da entidade. É que o aperto no caixa da estatal — que impôs uma freada em desembolsos — afeta as finanças da cadeia produtiva do segmento. E impulsiona as consultas a advogados especializados sobre os caminhos do litígio contra a gigante brasileira de petróleo. "Num mercado em que a Petrobras é quase cliente único, processar a empresa é uma decisão extrema e que deve ser avaliada considerando o peso da estatal na carteira do fornecedor. Era raro. Mas, no atual cenário, vai acontecer", conta Velloso: "O mercado está parado. A Petrobras não nos recebe. Pelo vácuo de informação, em caso extremo, recomendamos ao associado ir à Justiça contra a companhia". A Abimaq conta com 500 fornecedoras de máquinas e equipamentos para o setor de óleo e gás, que respondem por quase dez mil das 35 mil demissões nessa indústria de janeiro a julho. Cerca de 90 empresas esperam receber pagamentos de companhias em recuperação judicial, conta Velloso. Destas, 50 processam empresas que fazem a intermediação entre a Petrobras e os fornecedores na execução de projetos. "Já há perto de R$ 500 milhões em dívidas a serem recebidas por fornecedores de máquinas e equipamentos para óleo e gás", avalia Alberto Machado Neto, professor do MBA da FGV e diretor de Petróleo e Gás da Abimaq. A forte redução nos investimentos da Petrobras — que caíram de uma faixa de US$ 45 bilhões anuais até 2013 para menos de US$ 27 bilhões este ano — tem efeito em cascata no mercado. Uma fonte da estatal conta que serão reduzidos aportes para 2016 para menos de US$ 25 bilhões. A Petrobras reconhece negociar com fornecedores parte de seus contratos visando a redução de custos, mas não informa valores. E afirma seguir na busca pela competitividade nos processos e pelo desenvolvimento nacional de fornecedores, que somam mais de dez mil em seu cadastro. "No setor offshore, as empresas são especializadas. Não é possível diversificar atividades. E a redução da curva do petróleo pela Petrobras é absurda, passando da produção de dois milhões de barris por dia hoje para só 2,8 milhões em 2020. É um crescimento pífio", diz Marcelo Nacif, gerente geral da Swire Oilfield Services, multinacional de serviços de transportes. Para preservar o caixa, a Petrobras renegocia e até rescinde contratos. A concessão de aditivos foi suspensa e, de meados de 2014 para cá, relatam advogados e empresas do setor, é crescente a aplicação de multas às contratadas, incluindo penalidades ligadas a contratos já terminados. A carioca BSM Engenharia, de serviços de logísticas à atividade offshore, foi à Justiça contra a estatal. Argumenta ter sofrido aplicação de multas abusivas, de R$ 18 milhões. E cobra R$ 11,7 milhões por serviços realizados. "A questão mostra uma conduta abusiva por parte da Petrobras. Com a posição dominante que tem no mercado de óleo e gás no Brasil, ela impõe uma série de condições listadas em contrato padrão e que não aceitam negociação de cláusula. (O abuso) fica ainda mais flagrante com as multas, pois faz notificações sobre inadimplementos cometidos mais de um ano atrás. Como fazer a defesa de algo já passado?" — questiona Leonardo Marins, advogado da BSM. Segundo Marins, a Petrobras informa das multas em documentos. As explicações da fornecedora são recusadas sem apresentação de justificativa. Com isso, o valor da multa é descontado do pagamento por serviços prestados. "Isso significa que a empresa recebe um pagamento cada vez menor, reduzindo o fluxo de caixa", pondera Marins, ressaltando que a BSM tem a Petrobras como cliente há mais de 30 anos. A BSM pediu recuperação judicial em julho, dias após rescindir um contrato com a Petrobras, alegando ser inviável manter as operações devido à aplicação de multas abusivas. A Petrobras esclareceu, por meio de nota, que aplicou multas e sanções à empresa ao longo da execução de contrato de serviços para a operação na Base de Imboassica, em Macaé, que tinha duração de cinco anos. As penalidades eram relativas ao não cumprimento de prazos e obrigações contratuais. Após a rescisão do contrato pela BSM, a Petrobras substituiu a empresa por nova contratada. Márcio Cotrim, sócio do escritório Leal Cotrim, vê uma mudança de paradigma: "A estatal tem feito leituras mais restritas dos contratos, favorecendo aplicação de sanções e multas. Como têm cláusulas abertas, as empresas se esforçam para resolver administrativamente, mas já fazem consultas sobre o caminho judicial". A Petrobras afirma que observa a legislação, suas normas internas e os procedimentos previstos em contratos para aplicação de multas e resolução de disputas. E que sempre notifica a empresa de conduta passível de penalidade, garantindo prazo para apresentação de defesa pelo fornecedor, que é avaliada para, só depois, aplicar a multa. O impacto do desinvestimento afeta empresas de todos os portes. Segundo fontes do setor, a Rolls-Royce avalia desativar a fábrica de propulsores marítimos que inaugurou em Duque de Caixas no primeiro trimestre. Já a OneSubsea, unidade de Cameron Schlumberger de produtos e sistemas para o setor de óleo e gás, dizem executivos próximos, estuda direcionar sua produção no País para a exportação. Especialistas avaliam que os debates sobre a posição dominante da Petrobras na indústria de óleo e gás devem esquentar. Para João Emílio Gonçalves, gerente executivo de política industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o tema é incontornável: "Não há como recuperar demanda na cadeia sem recuperação da Petrobras. A discussão sobre contar com um operador único do pré-sal é importante. Limita investimentos e é um fardo para a estatal, que tem de entrar em todos os projetos, mesmo que avalie não ser o melhor".

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