terça-feira, 15 de setembro de 2015

Janio de Freitas vê no pacote um presente para Lula e joga Dilma no colo da oposição. Nunca antes na história da análise política!!!

De todas as opiniões que li sobre o pacotão do governo, a mais insólita, sem dúvida, é a de Janio de Freitas, na Folha. Não sei se reais ou fingidos, há frêmitos de incontida alegria. Segundo diz, as medidas adotadas por Dilma — que, parece-me, o articulista considera impopulares — são um presentão para Lula. Abusando da dialética, ou do que supõe entender dela, Janio escreve — e espero que a transcrição seja compreensível, leitor: “Ganhar presente é uma das delícias, só comparável à de dar presente. Deve ser por isso que Lula se mostrou, na Argentina, tão vibrante e afirmativo como o Lula dos velhos tempos. (…) Foi lá que Lula recebeu a notícia de que Dilma se curvava aos cortes de verbas dos chamados programas sociais e do PAC, cobrados pelos neoliberais, pelos adeptos do impeachment e pela oposição vai com as outras. Sua reação imediata foi inflamada, com centro na declarada ‘incapacidade de entender esses ajustes que cortam ganhos sociais e dos trabalhadores’”. E conclui a sua coluna prevendo um confronto entre Lula e, suponho, os “neoliberais” em 2018, com a vitória vocês adivinhem de quem… Uau! Está inaugurando um gênero no jornalismo: o da análise criativa, que dispensa os fatos e as imposições da realidade. Para que a análise do “companheiro” faça sentido, forçoso será, de saída, que Lula caminhe para a franca oposição e rompa com Dilma. E esse é apenas um dos requisitos. E, por óbvio, o PT terá de segui-lo nessa jornada, o que impõe a entrega dos cargos imediatamente. Pergunta: o PT de hoje sabe sobreviver sem as tetas do governo? Mais: o que Janio imagina? Que os oposicionistas sairão correndo para aplaudir o plano de Dilma — porque, afinal, na sua fantasia, são neoliberais —, abrindo espaço para que o PT fale em nome do povo oprimido? Esse é o segundo, mas não em ordem importância, requisito. Ah, tenham a santa paciência! Se e quando os MTSTs e MSTs da vida, meros tentáculos do PT, saírem às ruas contra o plano (e contra o povo, como sempre), o que imagina o criativo articulista? Que a conta do desgaste recairá sobre os ombros da oposição? Há dez meses, Lula estava sobre os palanques a defender que Dilma, e nunca Aécio Neves, era a garantia de um futuro glorioso. O que pretende o Babalorixá de Banânia? Dizer-se enganado? Segundo Janio, não haverá impeachment — por alguma razão, ele acha que o pacotão de agora o afasta, parece… —, e a batalha de 2018 será entre Lula, que falará contra o arrocho que Dilma representa, e a oposição, que, nessa formulação, defenderá, então, a continuidade. Caramba! Operou-se um genial milagre interpretativo, de sorte que Dilma, acreditem, está sendo jogada por Janio no colo da oposição. É, para usar uma palavra que costuma frequentar o meu vocabulário, estupefaciente. Há muito tempo eu realmente não lia nada tão insólito.
CUT e assemelhados
Eu não tenho dúvida de que a CUT e assemelhados vão se mobilizar contra o pacote. E que Lula pode, sim, inspirá-los porque a ele também não restou alternativa. Mas isso só deixará Dilma, criatura inequivocamente criada pelo demiurgo, ainda mais isolada. Comecem a contar os dias para que pipoquem greves em penca no funcionalismo federal, cujo reajuste salarial foi adiado. Janio terá de fazer com a sua coluna o que Dilma fez com o Orçamento de 2016: rever. A única forma de lhe dar alguma coerência interna é ele mudar a sua previsão. Se Dilma cair e Michel Temer assumir, a herança maldita petista continuará aí. Ainda que não participe do governo, a oposição terá necessariamente um compromisso com a estabilidade. E o chefão petista poderá voltar a fazer, então, aquele discurso que parece ser da predileção de Janio: o da irresponsabilidade. Duvido que colasse. Se Dilma fica até 2018 — e desta vez não haverá bonança externa para salvar um governo que traz a marca da corrupção, a exemplo do que aconteceu com Lula em 2005 —, é o governo do PT que permanece no poder. Se o Apedeuta investir na desestabilização, agregará a um governo desastroso, que tem a marca do seu partido, a fama de desleal e arruaceiro. E olhem que assim será se, em 2018, a eleição for a principal preocupação de Lula. Há um risco considerável de que seja a Justiça. Dilma caia agora ou fique até o fim do mandato, o PT estará lascado nas urnas, com Lula vestindo a roupa de campanha ou o uniforme do Pixuleco. Mas digamos que conclua um mandato que será necessariamente ruinoso: quem continuará a ser o pai da criança? Por Reinaldo Azevedo

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