sábado, 20 de junho de 2015

LEIA O ARTIGO DO JORNALISTA E FILÓSOFO LUIS MILMAN - A LISTA BURMANN-SCHLOSSER, A EMBROMAÇÃO E A JUSTIÇA

O reitor da Universidade Federal de Santa Maria, Paulo Afonso Burmann, enviou, neste último dia 18, uma carta ao Presidente da Federação Israelita do Rio Grande do Sul (FIRS), que lembra aquela situação em que alguém, apanhado em flagrante delito, com a boca na botija, tenta de qualquer forma convencer a quem o flagrou de que “não é bem isto que você está pensando”. Um espetáculo! Burmann, autor, juntamente com seu pró-reitor de pós-graduação e pesquisa, José Fernando Schlosser, enviaram aquele memorando famoso, de 15 de maio, exigindo de seus subordinados que informassem sobre a “presença de discentes e/ou docentes israelenses, ou a perspectiva” na UFSM. O caso foi parar no Ministério Público Federal e Polícia Federal, em 3 de junho, por força de uma notícia de crime que enviei a estes órgãos, solicitando as providências para a responsabilização dos autores da Diretriz Burmann-Schlosser, com base na Lei 7.716/ 1989, artigo 20, que trata de crimes de discriminação e preconceito. Também encaminhei pedido de providências à Presidente da República, ao Ministro da Educação e ao presidente do Conselho Universitário da UFSM, a instância deliberativa máxima da universidade, cargo que é, por estatuto, ocupado pelo próprio reitor. O caso, depois de noticiado, correu mundo, provocou protestos e repúdio, entre outros, da Sociedade Brasileira de Pesquisa Científica e do Senado da República. O reitor e seu pró-reitor saíram por aí, inicialmente, e como dois aloprados, a defender sua diretriz com a tese de que cumpriam a Lei de Acesso à Informação, no atendimento a um pedido que foi encaminhado a eles, ainda em 2014. Um despautério, principalmente para quem ocupa a posição deles na administração pública. Este apelo à legalidade foi desconstituído de maneira fulminante – e não poderia deixar de ser diferente - pelo próprio Ministro da Educação, José Janine Ribeiro, que, em nota, desmoralizou o reitor Burmann, afirmando que a Lei de Acesso à Informação não pode colidir com a Constituição da República. De fato, não pode e nem colide. A ladainha legalista da dupla Burmann-Schlosser esfarelou-se, mas suas tentativas de safarem-se das responsabilidades, não. Burmann foi à luta e, num primeiro momento, solicitou uma audiência ao presidente da FIRS, que acabou ocorrendo, à noite, em Porto Alegre, no dia 9 de junho. Ao final do encontro, o presidente da FIRS afirmou, em nota, que a diretoria da entidade ouviu as explicações de Burmann, mas que estava determinada a acompanhar os desdobramentos do caso junto ao Ministério Público Federal e Polícia Federal. Só isso. Burmann apelara ao “animus comovendi”, aquela decisão de choramingar junto à sua vítima para tentar obter dela o perdão pelo crime praticado. Mas, por óbvio, nem o tal “animus” se substitui à lei, nem uma possível disposição para o perdão, de parte da vítima, suprime a sua aplicação. Burmann continuou, assim, pulando na chapa quente do crime cometido. Isto, no entanto, o fez pensar em nova investida para salvar a pele. Mais uma vez ele foi, acompanhado de seu pró-reitor Schlosser, à Federação Israelita do Rio Grande do Sul, que pela segunda vez o recebeu, na noite de 18 de junho. Agora, no entanto, o enredo da ópera bufa se modificara. O reitor Burmann carregava uma carga de três folhas, com, imaginem, o dístico da República, na qual, descontado o acacianismo sobre a nobre missão da universidade, endereçava ao presidente da FIRS um pedido de desculpas. Isto mesmo, desculpas, pelas indesejadas consequências que seu famigerado memorando trouxera aos “israelitas". Na carta, ele reconhecia que a decisão de encaminhar o memorando não fora bem avaliada em seus aspectos formais e políticos. A FIRS saudou a iniciativa de Burmann. Finalmente ela obteve a admissão do reitor sobre a impropriedade de seu memorando. E divulgou a carta de Burmann em sua página oficial na internet. Reitor da UFSM e diretoria da FIRS, irmanam-se, na casa do ofendido, pelo pedido de perdão! Como mais tarde viria a afirmar, redimido e em entrevista coletiva, Burmann pode agora dar o caso por encerrado. “Vamos nos dedicar à nossa agenda positiva”, conclamou Burmann. “A UFSM é de todos nós!” Comovente? Nem tanto. A expiação do pecado, concedida pela FIRS - que chegou a saudar, por meio de Sebastian Watemberg, um dos vice-presidentes, “ a grande vitória da Federação” - nem sequer do pecado correto foi, porque Burmann não desculpou-se pelo que diz o memorando, não se retratou de seu conteúdo e não admitiu ter cometido um crime. Ele referiu-se à impropriedade política e formal do memorando. Lamentou suas consequências e foi só. Mas o que é isto? E o crime, indigitado na Lei 7.716 e proscrito na Constituição? Em nenhum momento Burmann admite que o cometeu. Afinal, se o fizesse, se tornaria réu confesso! Muito menos a diretoria da FIRS, em suas reuniões com o, chamemos assim, suspeito de crime de racismo, exigiu que ele confessasse o delito. Impropriedade formal, seja lá que diabos isto signifique, é impropriedade; e crime é crime. Arrepender-se da primeira nada tem a ver com confessar o segundo. O esperto Burmann sabe bem a diferença, mas tenta salvar o coro com uma embromação adolescente, com o apelo a uma investidura que ele conspurcou e, ainda, contando com o piedoso espírito que paira sobre a diretoria da Federação Israelita do Rio Grande do Sul. O caso, no entanto, é de alçada da lei e está sendo investigado pela Polícia e Ministério Público federais. E não será encerrado em reuniões noturnas, mas na Justiça.

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