segunda-feira, 18 de maio de 2015

A reforma política e os aspectos deletérios do “Distritão”, como quer Eduardo Cunha

Há alguns tontos que já andaram mandando comentários malcriados pra cá me acusando de sempre concordar com Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara. Em primeiro lugar, o arquivo prova não ser verdade. Em segundo lugar, o fato de eu considerá-lo extremamente hábil — quem não? — e sagaz não implica comunhão de idéias. E, sim, confesso que me divirto ao vê-lo pôr o PT na roda, como se dizia no tempo de eu se moleque. O partido estava tão acostumado a dar as cartas que não havia se preparado para a possibilidade de alguém enfrentá-lo. Negar que isso seja do meu gosto seria mentir para o leitor. Mas é evidente que tenho discordâncias fundas com Eduardo Cunha. E uma delas diz respeito a aspectos da reforma política que ele almeja. Começo, no entanto, pelas concordâncias. Ele quer, e eu também quero, que as empresas continuem a fazer doação para campanhas eleitorais. No seu modelo, ela seria feita para o partido, e este transferiria recursos aos candidatos. Haveria, ainda, um teto para as pessoas jurídicas. Ok. No melhor dos mundos, concordaria com as duas restrições, mas eu as considero inúteis, já que poderiam ser facilmente burladas. Não vejo por que criar uma legislação para não ser cumprida. Mas é evidente que a proposta, mesmo com esses quesitos, é melhor do que a proibição da doação, como quer o PT, o que corresponderia a jogar a política na clandestinidade. O texto da reforma também cria mais dificuldades para que os partidos tenham acesso ao fundo partidário. Será necessário ter um desempenho mínimo. Não entro em minudências agora para ir diretamente à discordância. Eduardo Cunha e parte considerável do PMDB querem, em vez do voto proporcional, como é hoje, um tal “distritão”. Seriam eleitos em cada estado os deputados mais votados. E ponto final. São Paulo, por exemplo, tem 70 parlamentares na Câmara. Computadas as urnas, os 70 com mais votos se tornariam deputados, independentemente do quociente eleitoral da legenda. Como é hoje? No sistema proporcional, o principal peso é, na verdade, dos partidos. Contam-se todos os votos do PT, do PMDB, do PSDB e assim por diante. Estabelece-se um consciente, e cada partido terá o número de cadeiras de acordo com a votação que obteve. Aí, sim, definido esse total, estão eleitos os mais votados, em ordem decrescente. Qual é o bem do modelo? Incentiva-se o voto partidário, o que é bom. Qual é o mal? Um deputado com muito voto acaba ajudando a eleger um sem-voto. Ou por outra: uma figura muito popular pode obter 1.5 milhão de votos, o que dá ao partido direito a duas cadeiras. Ocorre que o segundo colocado na legenda pode ter apenas 10 mil. Sim, é o caso de Tiririca, que acaba ajudando a eleger ilustres desconhecidos. Aí, então, vem essa conversa do distritão. Por que ela é deletéria? Porque vai estimular a multiplicação de Tiriricas, não o seu fim. Um partido com pouca representação e inserção social poderá sair por aí caçando celebridades. Mas: vai estimular a corrida de todos contra todos. Pior: as campanhas tendem a encarecer, já que o candidato será instado a caçar votos no Estado inteiro. A saída é tão ruim, mas tão ruim, que, a ser o distritão, então é melhor continuar com o sistema proporcional. Os defeitos do modelo pretendido por Cunha e parte considerável do PMDB são mais graves do que os do modelo em vigor. O texto do deputado Marcelo Castro (PI-PMDB), relator da emenda que tramita na Câmara, estabelece mandato de cinco anos para cargos do Executivo, sem direito à reeleição no período subsequente. Sempre fui contra a dita-cuja — opus-me quando foi aprovada, no governo FHC. Mas aí começam os problemas. Para haver a coincidência de mandatos, Castro elevou para cinco anos o mandato dos deputados. Aí o problema se deslocou para o Senado. Fazer o quê? O relator, inicialmente, queria mandato de igual período. Eduardo Cunha pressionou em favor de 10 anos, em vez dois 8 atuais. Castro cedeu e recuou, tantos foram os protestos, e manteve os cinco pretendidos inicialmente. O presidente da Câmara não gostou e agora luta para que se evite a votação na comissão, enviando o texto diretamente ao plenário para ser emendado. Vamos ver: a coincidência de mandatos é, sim, importante. Como sou contra a reeleição e considero quatro anos um período curto demais, defendo os cinco. Mas aí é preciso, obviamente, elevar para cinco o mandato dos deputados. E o Senado? Hoje, o mandato do senador tem o dobro do seus colegas da Câmara, e acho isso correto porque a Câmara Alta têm de refletir a estabilidade; a outro, dos deputados, reflete as urgências da sociedade. Assim, mandato de apenas cinco anos não me parece bom. Qual é a saída? Parece-me simples: que sejam 10 anos, desde que o senador estivesse proibido de disputar a reeleição ao fim desse período. Se quiser concorrer a outro cargo, ok. Ainda nesse capítulo, o texto de Castro mantém o suplente de senador, o que me parece uma excrescência. Minha proposta? Se o parlamentar decidir exercer um cargo no Executivo, que o segundo mais votado (ainda que de partido adversário) assuma. Afinal, convenham: o eleitor deu ao político um mandato de senador, não de ministro. A suplência, como existe hoje, é indecente. Há, reitero, aspectos extremamente positivos no texto — fim da reeleição para o Executivo, mandato de cinco anos, possibilidade de financiamento de empresas — e há dois aspectos detestáveis, que colaboram para o atraso do país: o distritão e a manutenção da suplência no Senado. Não interessam ao País. Em tempo: eu sou um fã muito antigo do voto distrital, o puro mesmo, mas negociaria o misto. Por Reinaldo Azevedo

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