sexta-feira, 13 de março de 2015

Ressonância superpotente da USP permitirá autópsia sem abrir cadáver

A Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) começa a operar nesta sexta-feira (13) o mais poderoso aparelho de ressonância magnética da América Latina, capaz de revelar detalhes anatômicos tão pequenos quanto 0,05 mm, a escala da espessura de um fio de cabelo. Ele já deve começar a ser usado nas próximas semanas para examinar cadáveres em parceria com o Serviço de Verificação de Óbitos da capital, dentro de um projeto de pesquisa que busca aprimorar métodos não invasivos de fazer autópsias. A máquina também servirá para examinar pessoas vivas, porque é considerada segura. Inicialmente, porém, só pacientes que estiverem participando de projetos de pesquisa utilizarão o aparelho –a nova máquina ainda precisa ser aprovada para o uso mais amplo em hospitais. O projeto do aparelho é feito de forma que seja possível fazer uma higienização completa dele –não há risco, assim, de que pacientes vivos se contaminem de alguma forma com os cadáveres que passaram por ali. A resolução de imagens de pessoas vivas (que se mexem e não suportam ficar muitas horas dentro da máquina), porém, é menor do que aquela para tecidos mortos. Segundo Giovanni Cerri, professor de radiologia da USP e ex-secretário estadual de saúde, o potencial de melhoria em técnica de diagnósticos é grande. O segredo da precisão da máquina é um ímã com potência de 7 tesla, equivalente a um guindaste magnético capaz de erguer 20 carros. As melhores máquinas comercialmente disponíveis hoje têm potência de 3 tesla, e sua resolução volumétrica tem só um quarto da precisão da nova máquina. Um exemplo de aplicação está na detecção de tumores. "Com uma máquina atual de 3 tesla, é possível identificar um nódulo de 0,7 cm ou 0,8 cm", afirma o médico. "Com a máquina de 7 tesla vai ser possível identificar nódulos com menos de 0,5 cm." A diferença parece pouca, mas detectar um tumor mais cedo pode ser crucial para o sucesso de um tratamento, afirma. Outra área de pesquisa na qual o aumento de resolução será importante é a neurociência, especialmente o estudo de doenças neurodegenerativas, com os males de Alzheimer e Parkinson. Com um limite de resolução de aproximadamente 1 mm em estudos funcionais –nos quais a ressonância "filma" o cérebro em ação–, é possível enxergar padrões de conexão e transmissão de informações entre diferentes partes do sistema nervoso. Existem só 40 máquinas de ressonância magnética no mundo com potência igual ao novo aparelho da USP, e apenas cinco de potência maior, todas ainda em fase de desenvolvimento. Segundo a Siemens, empresa alemã que desenvolveu a máquina, o uso do aparelho em hospitais não deve demorar muitos anos. A USP participará dos estudos para demonstrar a segurança e a eficácia do uso do aparelho em hospitais. O equipamento, que pesa 38 toneladas e fica acomodado numa armação do tamanho de uma van, foi colocado em um laboratório subterrâneo no campus da avenida Dr. Arnaldo com auxílio de dois guindastes. O custo de US$ 7,6 milhões da máquina foi bancado com verbas da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), da secretaria estadual de Saúde e da própria USP. A máquina ficará sob administração do departamento de radiologia da faculdade, mas em princípio poderá ser usada por projetos de pesquisa de qualquer instituição que tenham mérito atestado por um conselho especial. "Não é viável que cada instituição do país tenha hoje uma máquina dessas, então a ideia é que esse aparelho consiga atender a comunidade de pesquisa como um todo", afirma Cerri. Ele argumenta ainda que o fato de o aparelho ainda não estar liberado para ser usado em hospitais é uma vantagem. As primeiras máquinas de 3 tesla, afirma, chegaram ao Brasil quando esse uso já era permitido, e por isso o país teria perdido a oportunidade de participar do desenvolvimento da tecnologia.

Nenhum comentário: