terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Eduardo Cunha diz que PMDB irá à Justiça contra a criação de partidos

Um dia após ser eleito presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) bateu duro na articulação política do governo, chamando-a de "atrapalhada", e criticou o patrocínio do Planalto a novos partidos, como o novo PL que o ministro Gilberto Kassab (Cidades) pretende criar. "Só o governo, através do seu articulador Pepe Vargas, acreditava em Papai Noel", diz. Ele disse que o PMDB contestará as novas legendas judicialmente: "É absolutamente incoerente o governo defender a reforma política e estimular a criação de partidos fictícios".
 

Folha - Onde o governo errou?
Eduardo Cunha - O governo errou em ter candidato. Quis fazer interferência. O que ficou foi muito claro: um candidato de governo, bancado pelo governo a qualquer custo nas últimas semanas, um de oposição, bancado pela oposição a qualquer princípio. E eu fiquei sendo o candidato da Casa.
Folha - Mas o senhor impôs uma grande derrota política à presidente Dilma.
Eduardo Cunha - Porque os articuladores políticos do governo, muito atrapalhados, simplesmente resolveram fazer uma política absurda dentro da Casa. Eles quiseram assumir a derrota. Vieram para cá, na base da pressão e de tentar constranger deputados, partidos e ministros indicados. Vieram para uma luta perdida. Qualquer um que conhece essa Casa sabia que eles iam fracassar. Eles não tinham a mínima noção. Até porque são pessoas, do ponto de vista de articulação política, sem tanta experiência para isso.
Folha - O senhor está falando do Miguel Rossetto, Aloizio Mercadante e Pepe Vargas.
Eduardo Cunha - Eu não sei quem foi o responsável, não posso acusar ninguém. Eu recebo relatos de Pepe Vargas. Eu acho que Pepe verbalizou ameaças para ministros e parlamentares, se vai ter retaliação segunda-feira, se vai demitir o cargo do parlamentar se não votar no meu candidato.
Folha - Mas houve isso? Quais casos?
Eduardo Cunha - Não vou citar, vários partidos. Todos da base que têm ministro no governo. Eles assumiram uma condição de vida ou morte que não tinha necessidade. Na hora que Pepe resolveu partir para esse tipo de confronto, ele se inviabilizou não só com o presidente da Casa mas tornou a relação dele muito difícil com os partidos da base que não o atenderam. E os que o atenderam o fizeram constrangidos porque isso não é forma de fazer política.
Folha - O governo achava que Arlindo Chinaglia poderia vencer.
Eduardo Cunha - Só o governo, através do seu articulador Pepe Vargas, acreditava em Papai Noel. Como é que alguém que tem um cargo de relações institucionais busca quebrar a institucionalidade agindo dessa forma?
Folha - Mas representantes da JBS não pediram votos para o senhor?
Eduardo Cunha - Isso é outra coisa. É uma opção política que ele possa ter feito. Outra coisa é financiamento.
Folha - Em momento algum o JBS procurou o senhor?
Eduardo Cunha - Veja bem, há um sentimento da grande parte do País, principalmente São Paulo, em que o equilíbrio e independência do Poder Legislativo significa melhoria do ambiente do processo econômico do país. Tenho certeza que se você fizer uma enquete com os 100 maiores empresários do país certamente talvez 98 preferissem a minha eleição. Não preciso pedir, eu via na rua. Não quer dizer necessariamente que tenha tido poder econômico na minha eleição.
Folha - O sr. disse que vai encaminhar um projeto de pacto federativo.
Eduardo Cunha - Não disse que vamos mudar o pacto federativo. Tem propostas de reforma tributária. O pacto federativo é uma tese. Temos que fazer o debate.
Folha - O governo registrou deficit de R$ 17 bilhões em 2014. Vai dar para os outros (Estados e municípios) tirando de quem não tem (União)?
Eduardo Cunha - Eu não disse isso. Ninguém aqui é irresponsável. Eu sempre defendi o equilíbrio das contas públicas. O que não pode é governo dar incentivo fiscal para uma indústria setorial tirando de Estados e municípios de todo Brasil.
Folha - E a reforma política?
Eduardo Cunha - Nós temos de discutir. E tem uma medida urgente que a gente tem de fazer. Temos que conter a criação de partidos. Não podemos mais continuar com essa coisa. Já falei com o Michel Temer e ele vai contestar judicialmente a criação desses novos partidos que têm o objetivo claro de fraudar a legislação com vistas à futura fusão.
Folha - Fala do Partido Liberal, que o ex-prefeito Gilberto Kassab articula?
Eduardo Cunhas - Não dá para permitir cooptação de parlamentares de outros partidos. Isso seria um revés no governo, que vai se beneficiar da criação de um outro partido para diminuir sua dependência do PMDB, de criar uma base alternativa... Será contestado judicialmente e aqui, na Câmara, vamos tentar produzir algum tipo de legislação para, no mínimo, impedir. Tem também que acabar com esse mercantilismo de assinaturas. Esses apoiamentos para criar um partido não são filiações partidárias. Não pode ser assinatura. Não pode ficar comprando assinatura na rua para fazer partido. Tem que ser filiação mesmo. É absolutamente incoerente o governo defender a reforma política e estimular a criação de partidos fictícios. Porque o primeiro ponto da reforma política deveria ser fortalecer partidos, não o contrário.
Folha - Por que o PMDB não fez isso dois anos atrás? O governo está patrocinando isso...
Eduardo Cunha - Porque agora não é mais partido político. Vou criar um partido num dia para fazer fusão no outro? Isso é fraude! e o governo está patrocinando isso, vai ter o PMDB como oposição a isso.
Folha - Daqui a alguns dias o procurador-Geral da República divulgará lista com políticos envolvidos na operação Lava Jato. O sr. teme estar na lista?
Eduardo Cunha - Eu defendi a CPMI para investigar todo mundo, até a mim. As situações que surgiram foram categoricamente desmentidas. Se por ventura existir qualquer coisa, vamos ver o que é. Eu não estou imune à investigação. É muito simples: que se apareça e que se esclareça. Nada disso me preocupa porque nada disso me atinge. Estou absolutamente tranquilo. Não conheço nenhuma dessas pessoas que estão envolvidas nesse processo.
Folha - Está preparado para assumir a Presidência da República?
Eduardo Cunha - Será simplesmente para cumprir o rito. Não vai ser para assumir o poder da presidente da República.
Folha - Mas dizem hoje que tem mais poder que ela...
Eduardo Cunha - Quem?
Folha - Dizem que o sr. é inimigo íntimo da Dilma...
Eduardo Cunha - Por que íntimo? (risos)
Folha - O senhor é evangélico e já se posicionou contra temas polêmicos. Defensores dos direitos humanos, que defendem casamento gay e aborto, lamentam a sua vitória. Estes temas avançarão na sua gestão?
Eduardo Cunha - Primeiro, se quiser pautar um projeto, tem a ordem das pautas. Os projetos de lei têm que ter urgência para ser votada, assinada pela maioria dos líderes e 257 deputados a favor da urgência em plenário. Só aí você pode discutir a pauta e não existe nada na pauta nessa situação. Uma coisa é princípio. Princípio é óbvio que sou contra, tenho minha posição, mas aqui eu tenho que cumprir a pauta.
Folha - Conselhos populares é um tema que já está na Câmara.
Eduardo Cunha - Eu defendi como líder do PMDB a derrubada dos conselhos populares. Eu defendi que Henrique Eduardo Alves (ex-presidente da Câmara) pautasse o decreto do DEM para revogar o decreto da presidente. Sou absolutamente contrário.
Folha - Na campanha, Dilma disse que prioridade é apoiar projeto que criminaliza a homofobia.
Eduardo Cunha - O projeto que foi derrubado (PL 122/2006 do Senado), do ponto de vista daqueles que estavam preocupados, não era o problema da criminalização. A homofobia já é criminalizada. Não havia contestação, era preservar o direito de culto. Aquele projeto de lei impedia os cultos.
Folha - Mas a deputada Maria do Rosário apresentou um projeto em 2014 alternativo.
Eduardo Cunha - Eu não conheço, não posso falar.

Nenhum comentário: