quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Empreiteiras cometeram crimes, sim, mas é preciso tomar cuidado para não distorcer a natureza do que está em curso: elas serviam às aspirações hegemônicas de um partido

O procurador da República do Paraná, Deltan Dallagnol, que integra a força-tarefa da Lava Jato, concedeu por escrito uma entrevista ao jornal O Globo. Disse coisas com as quais concordo inteiramente. Outras têm de ser devidamente sopesadas. Começo por aquilo em que pode haver discordância não exatamente na origem da constatação, mas nos desdobramentos. Vamos ver. Dallagnol afirma o seguinte sobre as empreiteiras que participaram do esquema do Petrolão: “As empreiteiras são protagonistas de um grande e danoso esquema criminoso de sangria de recursos públicos que ocorre há muitos anos. A corrupção é praticada há tanto tempo por essas empresas que se tornou um modelo de negócio que objetivava majorar lucros. Se as empresas se organizaram em cartéis para fraudar licitações e aumentar ilegalmente suas margens de lucro, não faz sentido alegar que foram vítimas de achaques por seus cúmplices”. Vamos lá. Que elas cometeram crime, não há dúvida. Que se organizaram para negociar com os bandidos que estavam na Petrobras, também não. Que participaram do jogo, quando poderiam tê-lo denunciado, idem. Então, de fato, os comandantes das empresas também agrediram a lei e têm de ser punidos. Mas precisamos tomar cuidado para que isso não distorça a natureza do jogo: a Petrobras estava sob o comando de um partido político — e não de vários. PMDB e PP estavam lá segundo a lógica do loteamento, mas a estatal estava subordinada a um ente de razão chamado PT e obedecia a uma visão estratégica de poder. Caso se considere que os agentes criminosos da Petrobras estão em pé de igualdade com os agentes criminosos das empreiteiras, sabem o que vai acontecer? Vai desaparecer a essência da questão: um partido político fez da estatal instrumento da tomada e consolidação do poder. O procurador negou que tenha havido promessa de pagamento de taxa de sucesso para Youssef. E concordo com o seu argumento quando diz que converter a redução de uma multa num imóvel não é prêmio. Vamos lá. Afirmei neste blog ontem: “A multa é parte da pena, como é a prisão. Tanto é que passa por uma espécie de dosimetria também. Se Youssef terá reduzido tempo de reclusão em razão de ter colaborado com a Justiça, o mesmo deve ocorrer com a sanção pecuniária. É parte do jogo”. Disse hoje o procurador ao Globo: “Assim como é possível reduzir a pena de prisão em razão da colaboração, também é possível reduzir a pena de multa de modo proporcional à colaboração”. É isso. Por Reinaldo Azevedo

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