sábado, 26 de abril de 2014

DELEGADO DIZ QUE CORONEL DA REPRESSÃO POLÍTICA DA DITADURA PODE TER SIDO MORTO POR VINGANÇA

Fábio Salvadoretti, delegado-adjunto da Divisão de Homicídios da Baixada Fluminense, afirmou na sexta-feira que ainda não é possível descartar nenhuma hipótese para explicar o assassinato do coronel Paulo Malhães, da reserva do Exército, no sítio onde morava, na zona rural de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Uma das hipóteses é que o crime tenha relação com o depoimento de Malhães na Comissão Nacional da Verdade, em março, quando relatou ter participado de prisões e torturas durante a ditadura militar. "Pode ter sido um homicídio por motivo de vingança e até mesmo um latrocínio, uma vez que foram levados vários pertences da vítima", disse o delegado. Segundo ele, os criminosos fugiram com dois computadores, pelos menos três armas antigas colecionadas pelo militar, um aparelho de som, jóias e cerca de 700 reais em dinheiro. Segundo as investigações, os assaltantes arrombaram a casa por volta de 13 horas de quinta-feira e ficaram esperando a chegada de Malhães e de sua mulher, Cristina Batista Malhães, para rendê-los. O caseiro, identificado apenas como Rogério, que estava na propriedade, não teria percebido a invasão e também foi rendido. Os criminosos separaram as vítimas, perguntando insistentemente por armas e jóias. Malhães foi mantido em seu próprio quarto, onde foi encontrado morto. O corpo estava de bruços, com o rosto contra um travesseiro, com sinais de sufocamento. Os criminosos amarraram Rogério e Cristina e foram embora depois do crime, às 22 horas de quinta-feira. Uma testemunha afirmou ter visto do lado de fora da propriedade outras duas pessoas dando cobertura. Apenas um dos integrantes do bando estava encapuzado.  A mulher de Malhães conseguiu se libertar das cordas durante a madrugada e chamou a Polícia Militar, mas os policiais só chegaram de manhã. Eles alegaram que a área é perigosa. De acordo com o delegado Salvadoretti, a região da antiga Estrada de Madureira é disputada por várias facções criminosas. Ex-integrante de órgãos de repressão do regime militar de 1964-85, Malhães admitiu ter participado da tortura, assassinato e desaparecimento de militantes políticos. Ele contou detalhes sobre o funcionamento da Casa da Morte de Petrópolis, na Região Serrana fluminense, um centro clandestino de tortura e homicídios, e afirmou que foi encarregado pelo Exército de desenterrar e sumir com o corpo do deputado Rubens Paiva, desaparecido em 1971. A médica Karla Malhães, mais velha dos cinco filhos do coronel, disse que a família "está surpresa e não sabe o que pensar" sobre o crime. Karla contou que conversou com o pai no domingo, e chegou a perguntar se ele havia sofrido ameaças por conta dos depoimentos prestados às Comissões Nacional e Estadual da Verdade. Malhães negou ter sido ameaçado. "É tudo muito assustador, muito surpreendente, não sabemos o que pensar. Por enquanto é latrocínio, roubo seguido de morte", afirmou Karla, no sítio do pai. Karla contou que na infância não sabia das atividades do pai. A filha disse só ter tomado conhecimento das prisões e torturas depois dos depoimentos às comissões da verdade: "Não sabíamos de nada e ficamos surpresos. Dissemos a ele que não devia ter falado, tanto tempo depois, ainda mais sem nos preparar. Nunca entendemos por que ele decidiu falar. Sempre foi uma pessoa muito reservada, muito difícil. Não era de conversar". Ainda conforme ela, Malhães se isolou ainda mais da família depois dos depoimentos. O coronel completou 77 anos no dia 17 de abril, sem qualquer comemoração, disse Karla.

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