quinta-feira, 27 de junho de 2013

A GUERRA DO TRANSPORTE URBANO - ARTIGO DO PROFESSOR JOSÉ FERNANDES SOBRE "QUALIDADE NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO - UM DIREITO DE TODOS"

Leia a seguir artigo do professor José Fernandes, economista e mestre em Administração Pública, sobre um ponto essencial que funciona como pano de fundo na atual revolta das massas no Brasil inteiro, a questão dos direitos do consumidor (usuário dos ônibus) a uma prestação de serviço de transporte de qualidade. É inaceitável, por exemplo, que as pessoas sejam obrigadas a longas viagens, algumas de horas, apertadas como se fossem sardinhas em lata. E que alguns viajem sentados, enquanto outros vão em pé, pagando o mesmo preço da passagem, no mesmo ônibus, no mesmo itinerário. Isso é mesmo uma coisa para enlouquecer qualquer um. O artigo é o seguinte: "Serviço público é o conjunto de atividades de responsabilidade constitucional do Estado (União, Estados e Municípios), no exercício das funções de governos, prestadas à vida coletiva, como, por exemplo, água, energia elétrica, transporte coletivo, coleta e destinação de resíduos, esgoto, regulação do transito, saúde, educação, segurança. O art. 175 da Constituição Brasileira de 1988 determina: “Incumbe ao poder público, na forma de lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. O parágrafo único desse artigo informa que a lei disporá sobre: I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II – os direitos dos usuários; III – política tarifária; IV – a obrigação de manter serviço adequado. Em 1995 foi promulgada a Lei Regulamentadora do Serviço Adequado prevista no art. 175 da Constituição Federal. A Lei 8.987/95 relaciona os direitos e deveres dos usuários do serviço público, sem prejuízo das disposições do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). Em seu art. 6º, § 1º, define serviço público adequado: “como o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade e qualidade no atendimento”. A qualidade no atendimento pressupõe cortesia, redução no tempo de espera, ambientes compatíveis, gestão moderna e uso intensivo do meio eletrônico, com centrais de atendimento para demandas do cidadão de forma instantânea e consistente. Uma relação política considerada do ponto de vista do cidadão e não do governante.  Realizar um serviço público de qualidade significa atitude e comprometimento com a cidadania (art. 1º/II/CF). As concessões e permissões do serviço público são meios de que se vale a Administração para cumprir suas múltiplas atribuições constitucionais. A concessão clássica de Serviço Público é quando o poder público concedente transfere à execução de um serviço público a pessoa jurídica ou consórcio de empresas mediante concorrências, para realizá-lo por sua conta e risco, mediante remuneração paga pelo usuário na forma de tarifa. Muitos são os casos em que o poder público, por caminho obliquo, utiliza um derivativo da Concessão conhecido como permissão. A permissão se expressa por discricionário, precário, revogável em principio a qualquer tempo. A partir da Constituição de 1988, a permissão de serviço público deve ser precedida de contrato de adesão, observada a precariedade e a revogabilidade unilateral do contrato pelo poder concedente, visto que as clausulas são fixadas unilateralmente por este. Para prevalência do interesse publico primário (que independe da vontade do cidadão) é recomendável sempre licitar a concessão do serviço. Eventualmente, considerando as contingências, valer-se da permissão, utilizando o contrato de adesão, com as desvantagens de ser um expediente de conhecimento público restrito quanto às obrigações das partes. O enigma da Relação Concedente – Concessionário ou Permissionário - está na fiscalização e controle do serviço adequado como determina o art. 175 CF e a Lei 8987/95 que o regulamenta. A melhor alternativa para exercer a fiscalização são as Agencias Reguladoras, desde que a hegemonia de decisão seja dos usuários, pois o Estado é um ente abstrato constituído para defender o interesse público. Serviço público adequado e tarifas justas têm sido o enigma a ser decifrado, na medida em que o cidadão assuma seus direitos - de cidadania e dignidade da pessoa humana - fundamentos da Republica, e reconheça no Estado um ente servidor. A precariedade na prestação dos serviços públicos será monitorada quando as pessoas assumirem o papel de protagonistas e deixem de ser objeto das ações políticas. A incivilidade do excesso de passageiros em determinados horários, as longas esperas nos pontos de embarque e o tempo gasto entre a origem e o destino dos usuários acontecem porque o povo trabalhador é pacifico e resignado. Convivem com a circunstância de gastar mais tempo da casa ao trabalho, do que um avião de Porto Alegre a São Paulo. É uma indignidade aceitar que um trabalhador diariamente se submeta a tal circunstância, quando o homem já foi a lua, os aviões voam a mais de 800 km por hora, os trens rápidos andam a 500 km por hora, todos os dias a imprensa divulga gastos públicos aos bilhões e os impostos levam 35% da renda do brasileiro. Mais grave que esse martírio do dia a dia é a impostura do preço das passagens. Causa repulsa ao senso comum o cenário inumano do debate público sobre cálculo do preço da passagem, exemplo da desconsideração do governante com os direitos fundamentais dos governados. O preço da passagem urbana é o resultado da divisão do km rodado pelo índice de passageiros por km. Quem calcula o custo do km rodado? Quem pesquisa o índice de passageiro por km? Como? Quando? Onde? Os peritos que produzem esse valor pertencem à qual instituição? São suficientemente imunes a prepotência e a exploração dos fortes? Este é o buraco negro no calculo das passagens, porque se presta ao ardil, à fraude, ao embuste, à falsidade, à hipocrisia, à enganação e à burla do interesse do usuário, por ser o lado mais fraco e desprotegido desse cabo de guerra. Cada cidadão usa sua autonomia para transferir aos governantes, pelo voto, seu direito de autogoverno, achando que isso é o melhor para todos. Infelizmente, a política e o dinheiro corrompem a virtude e desgraçam sem piedade os governos. A sutil transferência de poder aos governantes abre a possibilidade da velhacaria contra o interesse público. Como? De fato podem existir três cálculos de tarifa:  a - planilha teórica; a planilha real com coeficientes técnicos verificados a campo; a planilha complexa, que confronta a planilha real com a contabilidade do concessionário e com os dados fiscais das pessoas físicas detentoras da concessão, valendo-se da transferência do sigilo fiscal, patrimonial e bancário. O último estudo, complexo, de caráter continuo, e permanentemente fiscalizado pelos usuários, é o caminho para o justo e o verdadeiro. Não é difícil alcançar o objetivo, basta que sejam observados procedimentos adotados por pessoas sem escrúpulos, particularmente os detentores de mandato eletivo, pois, obrigatoriamente, devem exercê-lo sob as luzes do interesse público, e a permanente vigilância da Agencia Reguladora. Pleitear desonerações ou subsídios não é justo, porque socializa o custo e privatiza o beneficio. Basta dizer que cada centavo a mais no preço da passagem, em Porto Alegre, representa por mês, mais de 300 mil no bolso de alguém".

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