Em um Congresso
Nacional com esmagadora maioria governista (dos 513 deputados, apenas 18% são
filiados a siglas de oposição), a aprovação de projetos e reformas na
legislação brasileira tradicionalmente só é levada a voto quando os interesses
do Palácio do Planalto ou dos grandes partidos estão em jogo. Na última
quarta-feira, a Câmara dos Deputados demonstrou que até a defesa da fidelidade
partidária, algo louvável no sistema político do País, pode resultar em
oportunismo. Em jogo, estavam os interesses de um governo obcecado pela idéia
da reeleição e alguns dos seus aliados preocupados em manter sua principal
moeda nas eleições de 2014: o tempo de propaganda no rádio e na televisão. O
projeto aprovado pelos deputados impede que novos partidos tenham o mesmo
acesso aos recursos do fundo partidário e ao tempo de TV que as siglas já
existentes no cenário político do País, antes de passarem pelo crivo das urnas.
Atualmente, 5% dos 300 milhões de reais que abastecem o fundo partidário são
partilhados igualitariamente entre todas as 30 siglas e o restante do bolo é
dividido de acordo com o tamanho das bancadas eleitas para a Câmara dos
Deputados. Ou seja, quanto mais deputados eleger, mais dinheiro o partido terá
direito. O espaço na propaganda eleitoral na TV e no rádio segue a mesma
lógica. Para justificar o apoio à proposta, os partidos governistas,
capitaneados por PT e PMDB, justamente as duas maiores bancadas, argumentaram
que o projeto fortalece siglas com bandeiras e ideologia política claras contra
a proliferação de legendas de aluguel. Porém, no atual xadrez político, a
preocupação da dupla PT-PMDB pode ser facilmente compreendida como uma
tentativa de sufocar a movimentação de potenciais rivais da presidente Dilma
Rousseff nas urnas, especialmente a ex-senadora Marina Silva e o governador de
Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). “O que foi feito é uma violência casuística
com vistas a impedir que novos concorrentes entrem em campo na eleição do ano
que vem. Quanto mais candidatos competitivos houver, maior probabilidade de
segundo turno”, avalia o cientista político Paulo Kramer, da UnB (Universidade
de Brasília). “O problema é quando o governo antecipa o calendário eleitoral
para decidir o destino das eleições. Era um projeto que não tinha importância e
logo ganhou força contra a oposição”, afirma o deputado Rubens Bueno, líder do
recém-criado partido Mobilização Democrática, uma fusão do PPS com o nanico
PMN. Mesmo com motivação eleitoral, o projeto aprovado na Câmara dos Deputados
tem o mérito de desencorajar quem pretende criar um partido político apenas
para entrar na barganha por cargos públicos e ter acesso a recursos do fundo
partidário. A proposta que inibe o surgimento de novas legendas tem como
reflexo imediato o desinteresse de parlamentares em se filiar a legendas que
provavelmente ficarão à mingua no ano que vem. No Congresso, os próprios
deputados avaliam que a proposta aprovada na Câmara chegará ao Supremo Tribunal
Federal antes de entrar em vigor. O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, é
um dos principais derrotados com a aprovação do projeto, já que atuava
diretamente para garantir que os partidos ainda em fase de criação se
alinhassem à sua provável candidatura na corrida presidencial de 2014. Depois
de criar o PSD em 2011, com 48 deputados federais e desidratar a bancada do DEM
no Congresso, o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab também prepara munição
jurídica para tentar evitar a debandada de políticos de seus quadros para o
recém-lançado Mobilização Democrática. O “MD” pretende conquistar uma bancada
de 20 a 30 deputados (hoje tem 13), boa parte de egressos do PSD. “Essa brecha está
à disposição de aventureiros, de pessoas que querem montar um partido para
vender tempo de rádio e de televisão”, disse Kassab na Executiva da legenda, em
Brasília.
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