quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Calheiros no Senado, Alves na Câmara e o Congresso no lixo

Do jornalista Reinaldo Azevedo - Ezra Pound dizia que os poetas são as antenas da raça. Entendo que os, digamos, artistas do regime são, então, as antenas do regime. Não faz muito tempo, o músico Wagner Tiso, comentando o lulo-petismo, se disse preocupado com resultados, não com a ética. O ator Paulo Betti defendeu a necessidade de se “enfiar a mão na merda” para governar. A era lulo-petista viverá, em breve, dois capítulos que recendem à ética bettiana e reafirmam o realismo tisiano. Quando Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves, ambos do PMDB, se sagrarem, respectivamente, presidentes do Senado e da Câmara, Betti e Tiso terão motivos para comemorar. Antenas. Abaixo, há uma sequência de posts com uma pequena amostra da obra recente desses dois patriotas, como se não bastasse a folha corrida de atos pregressos. Para funções tão importantes da República, o PMDB pode não ter escalado os seus melhores homens, mas certamente indicou os mais influentes, aqueles que representam, por assim dizer, o sumo e a súmula moral do partido. Henrique Eduardo Alves, na sua campanha eleitoral, percorre o país a bordo de um jatinho emprestado por um colega de bancada, o deputado Newton Cardoso (PMDB-MG), o famoso Newtão, ex-governador de Minas que encontrou tempo para se tornar bilionário mesmo sendo político. “Ou por causa”, intuirão os leitores mais desconfiados. Em tempo: Newtão não incluiu o avião entre os seus bens na declaração entregue ao TSE porque diz que o aparelho está arrendado. Certo. Ele tem dinheiro para comprar uma frota… O aparelho é só o seu pecado com asas. A empreiteira para a qual Alves direcionou algumas de suas emendas é uma casa de periferia guardada por um bode. E isso, meus caros, não é metáfora nem trecho de alguma obra de realismo mágico, subgênero literário que encontrou na América Latina ambiente propício ao pleno florescimento. O surrealismo não precisa ser imaginado. Está nas coisas. Há mesmo um bode na tal casa. Só não está lá a empreiteira que recebeu a bufunfa. O dono da empresa era, até a semana passada, um seu assessor. O homem achou melhor se demitir. Os Renans, o pai e o filho, que é deputado federal, não conseguem explicar a questão quântica que envolve a família e a propriedade de algumas rádios, que, a um só tempo, são e não são do clã. Tudo depende do modo como se olhe a coisa e dos documentos que são consultados. Em 2007, Calheiros teve de renunciar à Presidência do Senado porque ficou claro que uma empreiteira pagava a pensão de um filho que ele teve fora do casamento. Homem ético, cuidadoso com as palavras, ao se referir ao episódio e ao período em que a amante estava grávida, ele dizia sempre “a gestante”, deixando claro que é um político de sangue-frio e que consegue manter o devido distanciamento crítico entre a Presidência do Congresso e as folias de alcova… Seus pares se negaram a cassar seu mandato. Menos de seis anos depois, eis Calheiros, mais uma vez, como o primeiro da fila na sucessão ao Senado, candidato a dar sequência à gestão de José Sarney, o Nosferatu que confere ao PMDB o senso muito aguçado de eternidade que tem o partido. É evidente que essa gente não chegou agora à política. Alves já foi da base de apoio de FHC, e Renan chegou a ser ministro da Justiça na gestão tucana. Os fatalistas, quem sabe convencidos por Betti e Tiso, dizem que o “Presidencialismo de coalizão” obriga a essas coisas… É besteira. Já tratei desse assunto em outras oportunidades e não vou entrar no mérito agora. Volto ao ponto: os petistas não inventaram esses caras, mas permitiram que alcançassem altitudes inéditas. Encontram no pragmatismo à moda peemedebista o instrumento necessário à consolidação de sua hegemonia. Também em nome do realismo, as oposições, em especial o PSDB, buscarão uma composição com esses valentes, porque a resistência poderia lhes custar não participar da mesa diretora das respectivas Casas. Seria esse um risco a correr? Seria, sim, desde que houvesse alguma interlocução com a sociedade e um discurso. Mas não há. Vai, uma vez mais, se enrolar no administrativismo e articular um de seus muitos silêncios. Quando alguns vigaristas acusam uma parcela da imprensa de ser o verdadeiro partido de oposição do país, não deixa de haver certa verdade no que dizem. Oposição à safadeza, à sem-vergonhice e à sem-cerimônia com que a política brasileira enfia a mão naquela metáfora de Paulo Betti.

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