domingo, 19 de setembro de 2010

Consultor Rubnei Quícoli demole rede petralha

Personagem central da queda da ministra Erenice Guerra, da Casa Civil, o empresário e consultor Rubnei Quícoli, de 49 anos, demoliu a rede petralha encastelada na Casa Civil da Presidência da República. Em entrevista para o jornal O Estado de S. Paulo, ele apontou na quinta-feira um novo personagem na trama, que identifica como Stevam. “Ele é um avião, tem uma porta aberta na Casa Civil e outra no BNDES”, afirma Quícoli. Segundo ele, em meio às negociações para aprovação de projeto destinado à implantação de energia solar no Nordeste - empreendimento estimado em R$ 9 bilhões que não saiu do papel - surgiu Stevam, cerca de 25 anos. “Ele é a ligação do governo com a Capital Consultoria”, diz o consultor, que diz representar a EDRB do Brasil Ltda, em Campinas (SP). A Capital Consultoria citada por Quícoli pertence a um dos filhos da ex-ministra e opera em Brasília. Sua especialidade é o lobby comercial nas entranhas da administração federal. Condenado a 3 anos de reclusão por uso de dinheiro falso e mais um ano por receptação - sanções trocadas por penas restritivas de direito, segundo acórdão do Tribunal Regional Federal -, Quícoli passou o dia de ontem aos celulares que leva nas mãos, três aparelhos que não pararam de tocar. Era gente de Brasília, do Rio e de São Paulo. Foi sondado por gente que se apresentou como do PSDB, pessoas interessadas em seu relato na reta final da campanha presidencial. Ele narrou o que chama de “violência praticada por uma quadrilha”.
- Como o sr. foi parar na Casa Civil?
- Eu havia comentado sobre o projeto com o Marco Antonio Oliveira, que era diretor de operações dos Correios. Ele me foi apresentado no Rio por amigos comuns. No dia 17 de novembro, por intervenção do Marco Antonio, nos reunimos na Casa Civil com a então secretária executiva do ministério, Erenice Guerra. Ela participou sim. Ouviu nossa exposição sobre o projeto de instalação de torres solares no Nordeste e reconheceu a importância da proposta. Aplaudiu o projeto e nos encaminhou ao escritório da Companhia Hidrelétrica do São Francisco.
- Quem mais participou do encontro?
- O Vinícius Castro, que era o assessor jurídico da Casa Civil, mais uma outra funcionária desse setor, os sócios da EDRB (Aldo Wagner, diretor técnico, Marcelo Escarlassara, diretor comercial) e o Carlos Augusto Cavenaria, da KVA Elétrica. O governo estava funcionando provisoriamente no Centro Cultural do Banco do Brasil porque o Planalto estava em reforma. De lá fomos para um escritório no Shopping Brasília. Houve um interesse muito grande de Erenice, mas ela não falou em dinheiro, nem recomendou a empresa do filho. Ela foi muito verdadeira naquele momento.
- As dificuldades surgiram já nesse encontro?
- Não houve dificuldades na Casa Civil. Fora de lá começou essa violência. Logo que chegamos no escritório do shopping, por orientação da Casa Civil. Fomos surpreendidos com um contrato. Estavam lá o Vinícius e o Stevam, o homem do BNDES. Na hora que o Vinícius entregou o contrato nas minhas mãos ele disse: “Daqui pra frente quem resolve é ele, é o Stevam”. Eu e os sócios da EDRB nos entreolhamos, preocupados. Aquilo não estava combinado. Pedi que nos transmitissem o contrato por e-mail. Se houvesse alguma mudança a gente poderia sugerir. Sabe como é, o cabelo vai caindo a gente vai aprendendo. A gente precisava documentar tudo.
- Eles mandaram o contrato?
- Enviaram no e-mail de uma certa GC Empresarial, que era o contato do Stevam. Mas esse endereço nem está mais conectado. Você tenta e volta. Acho que criaram só para algumas operações. Na última reunião o Stevam ficou ameaçando, disse que a gente ia ter que pagar senão o BNDES não ia liberar o dinheiro. Era uma coisa de louco. O contrato rezava R$ 40 mil por mês a título de manutenção e mais 5% de um aporte de R$ 9 bilhões. São R$ 450 milhões, é muito dinheiro jogado no lixo do Brasil. Vi que estava diante de uma quadrilha que montou uma ação muito bem planejada.
- O que você fez?
- Saí à procura do Marco Antonio. Foi ele quem fez o contato com a Casa Civil. Ele havia ficado maravilhado com o projeto, disse que já conhecia a experiência na Alemanha. O Marco Antonio me apresentou ao sobrinho dele, o Marcos Vinícius. O que me causou muita estranheza é que a mãe do Vinícius é sócia da Capital. Fiquei atônito. Onde é que estou me metendo?
- Vocês não assinaram?
- Não assinamos nada. Depois que nos recusamos a assinar o contrato naquelas condições espúrias o BNDES reprovou nosso projeto alegando falta de detalhes técnicos, ausência de sustentação. Pedimos ao banco que pontuasse onde estava o erro. O projeto tem patente alemã. Uns dois meses depois, em maio, o Marco Antonio me procurou dizendo que poderia viabilizar a liberação do dinheiro.
- E depois?
- Voltei a Brasília e o Marco Antonio disse que precisava de R$ 5 milhões. Ele disse que o filho da Erenice, o tal Israel, não iria liberar nada se a gente não pagasse. Expliquei que para fazer essa operação a gente precisava de uma nota fiscal para o faturamento. Eu disse que não dava para enfiar tanto dinheiro na cueca e sair distribuindo por aí. Aí me mandaram uma nota de uma empresa que é do Saulo, filho da Erenice, a Synergy. Mostraram que eu poderia pulverizar os R$ 5 milhões, diluir em consultoria e intermediação.
- Ele disse para que seriam os R$ 5 milhões?
- Disse que era para apagar um fogo da Dilma Rousseff e da Erenice, dívidas acho que de campanha. E outra parte era para apagar o fogo do Hélio Costa, candidato do PMDB em Minas Gerais. É a palavra do Marco Antonio. Eu sustento isso, vou até o fim. Saímos de Brasília determinados a não pagar nada. Depois que me recusei a assinar o contrato, o Stevam ficou ligando. Ligava de telefone público. Fez pressão, “se você não assinar não vai mais chegar na Chesf, se não assinar não vai ter mais nada”. Não ligava de celular. Usava cartão, dois, três minutos. Caía a ligação, ligava de novo. É um avião. Tem uma porta aberta na Casa Civil, outra no BNDES.
- Tomou alguma medida?
- Fui informado que esse Stevam tem uma ligação muito forte com o BNDES. Não sei de onde vem esse trânsito todo dele no banco. Motivo deve ter. Ele compõe o grupo da Capital, é o elo dos contratos para projetos via BNDES. Passei e-mails para a Casa Civil alertando sobre os métodos dele. Um rapaz de 25 anos não pode fazer isso. Pedi providências. Aí houve aquele abafa, tiraram ele do circuito. Foi quando o Marco Antonio me pediu os R$ 5 milhões. Quem me passou os dados da empresa para justificar o dinheiro foi o Vinícius.
- O sr. tem provas do que diz?
- Está tudo documentado. Tenho toda a troca de e-mails com a Casa Civil, minhas mensagens direcionadas às secretárias da Erenice, inclusive aquelas em que relato a forma de abordagem que o Stevam fez, violência inaceitável. Meus e-mails comunicando que não iria pagar nada daquilo a título de manutenção de uma coisa que não existia ainda. A Erenice nos encaminhou para a Chesf. Foi o papel dela. Se ela sabia ou não da propina é uma questão de consciência de cada um. Meus celulares estão à disposição, podem quebrar meu sigilo telefônico.
- Qual o seu objetivo?
- Mostrar que o Brasil não pode engavetar projetos importantes para uma região de excluídos. Um projeto barato que iria gerar empregos e tributos. Não queria a queda da ministra. Esse estrago não foi eu que causei, foi a quadrilha que eles montaram.
- O sr. tem folha corrida na polícia?
- Uma vez fui processado porque cobrei uma pessoa, levei prejuízo. Fui acusado de ameaça e processado por coação de testemunha. Fui absolvido. Na Justiça Federal fui acusado de uso de dinheiro falso. Coisa de 7 notas de 50 reais falsas que entraram no meu posto de gasolina. Não sabia que eram notas falsas. Não prejudiquei ninguém. Cabe à Justiça me julgar. Isso é jogo sujo. Quando você lida com bandido, com gente que não tem escrúpulos, tem reação. Sentamos com bandidos que agem dentro da Casa Civil.
- O sr. tem ligação com partido político?
- Nunca tive envolvimento político a não ser nos meus 20 a 28 anos. Pertenci à juventude socialista no Estado, uma entidade vinculada ao PDT. Depois participei de um evento político em Campinas, do PSDB. Mas não sou filiado a partido. Se existe essa filiação foi há 20 anos, quando eu era garoto. Não tenho nada com Serra nem com Marina. Meu vínculo é com o trabalho ambiental.

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